Maricá era uma cidade pacata, calma e tranquila, um raro balneário fora do radar fashion.
Até que um diálogo do Farol da classe média e prefeito do Rio nas horas vagas vazou :
– O senhor é uma alma de pobre. Eu, todo mundo que fala aqui no meio, eu falo o seguinte: imagina se fosse aqui no Rio esse sítio dele, não é em Petrópolis, não é em Itaipava. É como se fosse em Maricá. É uma merda de lugar.
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Veja o que já enviamosSer convidado para um evento autenticamente pobre é algo disputadíssimo nas rodas meio de esquerda meio intelectuais da Zona Sul. Tem designer que entregaria o MacPro para visitar uma cidade só de pobres do tipo certo.
[/g1_quote]Era o que a cidade precisava para virar uma atração turística de primeira grandeza. Agora é só tocar pro gol.
Hipsters, por exemplo: se tem alguém que tem orgasmos quando vê um pobre é hipster. Mas tem que ser o pobre certo, como o de Maricá. Não pode ser nem o miserável, que é invisível quando não está numa foto em preto e branco, nem o da classe C, que é a kriptonita do hype. Tem que ser aquele pobre idílico, da casinha colorida de subúrbio, do churrasco no domingo com Faustão passando na TV.
Esse sim!
Ser convidado para um evento autenticamente pobre é algo disputadíssimo nas rodas meio de esquerda meio intelectuais da Zona Sul. Tem designer que entregaria o MacPro para visitar uma cidade só de pobres do tipo certo. A possibilidade de entrar na casa, de ver o conjunto estofado de courvin ao vivo, de analisar pessoalmente os utensílios da cozinha, (será que tem coador de pano? Magiclick? Filtro de barro? ) faz o hipster babar na barba de lenhador. O que dirá de uma balneário pobre logo ali na região dos Lagos.
Maricá finalmente vai bombar!
Fotógrafos renomados farão ensaios mezzo kodachrome, mezzo tri-x, repórteres de comportamento caçarão tendências, extraindo ensinamentos filosóficos da Dona Maria, revistas de moda endeusarão a cadeira de plástico branca como ícone de estilo e, é claro, Regina Casé divará nas ruas, num Esquenta sem fim. A Rede Globo já nem vai precisar mais do Projac para gravar o nucleo pobre da novela. Todos pra Maricá!
O importante é que a cidade não ponha os pés pelas mãos deixando a pobreza sair do script que agrada aos novos turistas: nada de igrejas evangélicas, por exemplo. Afinal, se o balneário acabar na Record volta ao anonimato. O turismo hipster gosta de gente humilde frequentando igrejinha católica, com padre meio de esquerda e meio severo. E também nada de sertanejo, funk ou rap, tudo coisa de classe C. Só roda de samba em boteco vintage, tocando apenas Cartola e Zé Keti. Assim pode-se cobrar do turista cinquenta pratas por uma Schin e cem pelo bolinho de bacalhau da Dona Maria (aquela que foi entrevistada pelo repórter de comportamento). É a pobreza premium, customizada para o turista diferenciado.
O novo cartão postal da cidade será um Mega Supermercado Mundial. Tipo loja-conceito, maximizando a experiência do mercado pobre: apenas um caixa funcionando (que só aceita moedas), um apresentador anabolizado gritando ofertas no volume máximo e carrinhos que mal passam pelos corredores. Isso deixará o turista-hipster extasiado, com assunto para uma noite toda no Baixo Gávea. Na saida do Mega Mundial teremos uma lojinha igual às dos melhores museus, onde poderão ser adquiridos souvenirs, como mini garrafinhas de guaraná Dolly e camisetas do Fubá Granfino. Já o city tour será feito em bicicletas Caloi barra-forte, afinal van é coisa de classe C e hipster só entra em onibus no hemisfério norte.
Maricá será transformada no primeiro parque-temático da pobreza no Brasil, transformando o limão numa limonada.
Ou melhor, num refresco Tang.
Kkkkkkkkk muito bom, parabéns!!!
Maricá nem é muito assim não, desculpa decepcionar rs
Pra começar, toca muito sertanejo e coisas afins por aqui, sim. Isso é triste.
Tem muita gente pobre sim, muita casa de veraneio, muita bicicleta velha na rua, cavalos pastando, vacas, cachorros de rua… cenários idílicos por toda partes, E 45km de orla desbundante…. pena que não posso colocar algumas fotos aqui.
Muitos pescadores tradicionais, muito mateiro… mas tem também uma comunidade enorme de artistas plásticos renomados que moram aqui, uma dúzia de escolas experimentais, focadas em antroposofia, em filosofia waldorf. Temos um extenso programa de ecoturismo, temos mansões a beira mar também, mas aqui é um lugar onde gente rica que prefere o sossego ao exibicionismo vem descansar. Temos novos ricos também, essa praga está por toda parte, mas o maricaense não dá ibope pra esse tipo de figura não. Geralmente a gente ri da cafonice deles, nós, os pobres. Maricá é a cidade no estado que mais tem grêmios estudantis, somente Todas as escolas estaduais e municipais estão organizadas e ativas dentro do movimento estudantil nacional. Por acaso, ontem saíram 3 ônibus cheios pra manifestação na Praça XV. Temos muitos, muitos problemas de infra-estrutura sim, mas… bem, olhe a cidade do Rio né? Fala sério, pelo menos não vamos sediar uma olimpíada.
Maricá é muito mais. Seu texto é divertido, você é um cara muito divertido, somos amigos de facebook. Não vim te contradizer ou fazer uma defesa apaixonada. Vim só deixar um adendo, meu depoimento sobre a cidade que adotei pra viver, e que me adotou. Venham sim conhecer Maricá, venham de biquine e sunga, tragam um casaquinho na mochila porque isso aqui é um vale que termina no mar, e uma cerveja na beira da lagoa a noite, observando os pássaros, pode te deixar com frio. Mas se esperam encontrar um museu da suburbanice a céu aberto, vai se decepcionar. Um abraço fraterno Leo, estamos aqui aguardando sua visita. ; )
A Anna disse tudo.