Nessa reta final do impeachment ou não, todos têm uma opinião sobre o momento político. Normalmente essa opinião é acompanhada de olhos saltados, lábios trêmulos e farto lançamento de perdigotos.
Para evitar a tão desagradável experiência de ver uma pessoa, que se imaginava com dignidade e compostura, contorcendo-se de ódio e fúria, o exercício do preconceito é aconselhável. Um pré-conceito saudável, ou seja identificar os sinais que poderão te salvar de um bate-boca tão interminável quanto improdutivo.
Você está na mesa de um bar. Um amigo te apresenta um casal. É a hora de ligar aquele scanner igual ao do Robocop ou do Exterminador do futuro.
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Veja o que já enviamosE com apenas uma frase e alguma dose de cinismo, você terá um dia sem nenhuma balbúrdia. Afinal, se algo se aprende com a política, é que nada deixa as pessoas mais felizes e tranquilas do que dizer exatamente o que querem ouvir.
[/g1_quote]O homem tem uns quarenta anos, usa camisa pólo com um cavalo no peito, calça jeans justa com cinto e um tênis com três furos simétricos. Tem um relógio do tamanho do Big Ben no pulso e está acompanhado de uma senhora de idade indefinível (cada parte do corpo tem uma) que é, ou melhor, está loura e que fala pouco e sorri muito, atracada num iPhone 8 megaplus. Pronto, o scanner te permite falar com segurança:
– Que absurdo estão fazendo com nosso Brasil!
O casal vai sorrir, vai fazer um ou dois comentários contra a corrupção, e a conversa prosseguirá sobre outros assuntos. Você está a salvo dos perdigotos.
Andando na rua encontra aquele amigo que não vê há muito tempo, desde os tempos da faculdade. Ele está envelhecido e com uma certa barriga. Usa uma roupa onde nada conversa entre si, várias décadas se debatendo num mesmo figurino. A camisa está aberta um botão a mais e a calça um numero de menos. Ele tem na mão um pequeno Samsung, que manuseia com visível dificuldade. No rosto uma expressão resignada de quem deixou os bons tempos para trás. Bingo!
– Que absurdo estão fazendo com a nossa Dilma!
Ele vai sorrir, falar uma ou duas coisas contra o Moro, e vocês poderão se dedicar ao que interessa, a recordação de velhas e irrelevantes histórias do passado, onde olhos saltados não têm vez.
Agora você está num reunião. Chega o diretor de arte. Ele usa uma camisa abotoada até o pescoço, bigode prussiano e uma barba de lenhador aparada pelo a pelo. O cabelo é toda uma escultura e ele cuidadosamente se coloca a favor do vento do ar condicionado para não arruiná-la. Na mão vai um Iphone 9 ultraplus, propositalmente mal disfarçado por uma capinha feita de madeira reciclada das florestas de Bornéu. É só tocar por gol:
– Que absurdo estão fazendo com a nossa democracia!
Ele sorrirá levemente, vai falar uma ou duas coisas contra o PT e vocês poderão continuar a reunião de maneira calma e produtiva, sem sinal de mãos trêmulas.
E com apenas uma frase e alguma dose de cinismo, você terá um dia sem nenhuma balbúrdia. Afinal, se algo se aprende com a política, é que nada deixa as pessoas mais felizes e tranquilas do que dizer exatamente o que querem ouvir.