Fim da escala 6×1: movimento VAT alcança assinaturas e Congresso terá que discutir proposta

Quase 200 parlamentares já assinaram PEC da deputada Erika Hilton, elaborada a partir da mobilização do vereador eleito Rick Azevedo

Por #Colabora | ODS 8 • Publicada em 13 de novembro de 2024 - 17:56 • Atualizada em 14 de novembro de 2024 - 10:30

Líder do movimento Vida Além do Travalho, Rick Azevedo, vereador eleito, visita a Câmara Municipal do Rio: PEC, que acaba com a escala de trabalho 6×1, já tem assinaturas para tramitar no Congresso (Foto: Divulgação)

Após uma semana de agitação nas redes sociais,  a proposta de emenda à Constituição (PEC) que estabelece a jornada de trabalho de, no máximo, 36 horas semanais, acabando com a escala de 6×1 conseguiu o número de assinaturas necessárias para começar a tramitar no Congresso Nacional. Após ser eleito vereador no Rio de Janeiro, Rick Azevedo, líder do movimento Vida Além do Trabalho (VAT), conseguiu esquentar o debate sobre o fim da escala 6×1 na última semana e levar o tema a ser o mais comentado do antigo Twitter (agora X). Nesta quarta (13/09), Azevedo e a deputada federal Erika Hilton (Psol/RJ) deram entrevista coletiva na Câmara dos Deputados para anunciar que a PEC alcançou o número de 171 assinaturas necessárias para sua apresentação.

A deputada Erika Hilton revelou que o número de assinaturas está perto de 200 parlamentares – eram 194 antes do início da coletiva. “Nós ainda não protocolamos a PEC porque ainda há deputados avisando que querem assinar. A partir do protocolo, vamos ampliar o diálogo dentro do Congresso e acredito que ela poderá ser aprovada. Mas o fim da escala 6×1 é uma pauta dos trabalhadores”, disse a deputada do Psol, na entrevista no Salão Verde da Câmara, com a presença de parlamentares de vários partidos. “Nós não podemos falar em direitos humanos e prosperidade num país em que as pessoas não têm vida além do trabalho. As pessoas não podem prosperar porque estão presas numa escala desumana”, disse o vereador eleito Rick Azevedo. “E quero denunciar: tem trabalhadores no Brasil que trabalham 14, 15 dias sem folga”, acrescentou.

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O deputado federal Guilherme Boulos anunciou, durante a coletiva, que o líder do União Brasil, Elmar Nascimento, havia feito contato para informar que a maioria da bancada de seu partido ia assinar a PEC. “Temos sentido aqui no Congresso que a questão da jornada de trabalho excessiva é uma questão que faz parte da preocupação de parlamentares de quase todos os partidos. E, a partir dos debates, vamos avançar nas discussões de diferentes aspectos”, afirmou Boulos.

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E, para esta sexta (15/11), feriado da Proclamação da República, estão sendo convocadas manifestações em cinco capitais e no Distrito Federal para apoiar a proposta. “A nossa luta já tomou o Brasil. Avançamos nas ruas, nas redes e no Congresso, sem voltar atrás. Continuem cobrando o apoio dos deputados à nossa PEC. A classe trabalhadora está fazendo história”, escreveu o líder do VAT em suas redes sociais. Na Câmara, Rick Azevedo agradeceu a adesão de mais parlamentares. “Como é que esta Casa poderia achar normal que um trabalhador tivesse apenas um dia de folga para cada seis dias trabalhados?”, questionou.

Rick Azevedo com os deputados Erika Hilton e Guilherme Boulos em coletiva na Câmara: quase 200 assinaturas de parlamentares para que a PEC que acaba com a escala 6x1 possa ser protocolada (Foto; Reprodução / TV Câmara)
Rick Azevedo com os deputados Erika Hilton e Guilherme Boulos em coletiva na Câmara: quase 200 assinaturas de parlamentares para que a PEC que acaba com a escala 6×1 possa ser protocolada (Foto; Reprodução / TV Câmara)

Rick Azevedo, que completa 31 anos exatamente neste 15 de novembro, era um desconhecido balconista de farmácia até setembro de 2023 quando um vídeo na sua conta no tiktok atacando a escala 6×1 viralizou (já tem mais de dois milhões de views):  “É uma escravidão moderna. Se a gente não se revoltar, colocar a boca no mundo, meter o pé na porta, as coisas não vão mudar”, desabafou. Na onda da repercussão, nasceu o Vida Além do Trabalho (VAT), movimento pelo fim da escala 6×1 e uma vida digna. “Percebo que todo mundo está exausto. Ninguém aguenta mais a escala e a carga horária. As pessoas estão doentes e querem mudanças, mas, em situação de tanto esgotamento mental e físico, não sabiam como fazer, como falar. O movimento foi como um norte”, disse Rick Azevedo em entrevista à repórter Ana Carolina Ferreira, do #Colabora, em fevereiro.

De lá para cá, o movimento só cresceu. A petição online pedindo à Câmara dos Deputados a “revisão da escala de trabalho 6×1 e a implementação de alternativas que promovam uma jornada de trabalho mais equilibrada” chegou rapidamente a um milhão de assinaturas – chega a este 15 de novembro com quase 2,8 milhões.  Em maio, a deputada federal  Erika Hilton  começou a recolher assinaturas para apresentação de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para reduzir a jornada de trabalho e acabar com a escala 6×1. Em outubro, Rick Azevedo surpreendeu a classe política do Rio de Janeiro e o próprio Psol ao ser eleito para a Câmara Municipal com quase 30 mil votos – o candidato a vereador mais votado do partido.

Outras propostas no Congresso

Ao menos outras duas PEC tratam da redução de jornada no Congresso Nacional, mas não acabam com a jornada 6×1, que é a principal demanda do VAT. Apresentada em 2019 pelo deputado Reginaldo Lopes (PT/MG), a PEC 221/2019 propõe uma redução, em um prazo de dez anos, de 44 horas semanais por 36 horas semanais de trabalho sem redução de salário. A PEC aguarda a designação do relator na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) da Câmara. A PEC da deputada Erika Hilton deve ser apensada à proposta do deputado Reginaldo Lopes para tramitação em conjunto.

A PEC 221/2019 inclui um novo dispositivo no artigo 7º da Constituição definindo que o trabalho normal não deve ser “superior a oito horas diárias e trinta e seis semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho”. Apesar de a proposta não vetar a escala 6×1, o parlamentar tem defendido uma jornada de até 5 por 2. “Já passou da hora de o país adotar uma redução da jornada de trabalho de 44 para 36 horas e esse deve ser o centro de um governo popular. O Brasil tem que adotar um modelo de 4×3 ou 5×2, sem redução de salário”, defendeu Lopes em entrevista à Agência Brasil.

Outra proposta que reduz a jornada de trabalho em tramitação no Congresso Nacional é a PEC 148, de 2015, de autoria do senador Paulo Paim (PT/RS). A PEC define uma redução de 44 horas para 40 horas semanais no primeiro ano. Em seguida, a jornada seria reduzida uma hora por ano até chegar às 36 horas semanais. Em uma rede social, Paim comemorou que o tema tenha voltado ao debate. “É muito bom ver que novos parlamentares, como a deputada federal Erika Hilton, estão sintonizados com as demandas históricas dos trabalhadores. Uma luta antiga. Espero que a Câmara dos Deputados vote essa proposta e que o Senado também vote iniciativas com a mesma temática”, destacou o senador.

Convocação para ato contra a escala 6x1 no Rio de Janeiro: mobilização em mais cinco capitais e em Brasília (Reprodução)
Convocação para ato contra a escala 6×1 no Rio de Janeiro: mobilização em mais cinco capitais e em Brasília (Reprodução)

Críticas de parlamentares e de entidades empresariais

A proposta para o fim da escala 6×1 também já provocou críticas de parlamentares. O deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), líder do partido e candidato favorito à sucessão de Arthur Lira (PP-AL) na presidência da Câmara, afirmou nesta terça-feira (12) que a PEC pelo fim da escala 6×1 “preocupa muito” e  precisa ser discutida com cuidado. “É um tema que nós temos e vamos discutir, mas não ouvindo apenas um lado. Temos de ouvir também quem emprega”, disse Motta.

O deputado Nikolas Ferreira (PL/MG), barulhento parlamentar bolsonarista, chamou a proposta de “bizarrice” e argumentou que a PEC é uma medida populista que pode gerar inflação e aumentar os custos para empresas, especialmente em setores como supermercados e hospitais. Segundo ele, os mais pobres acabariam sendo prejudicados, com demissões e redução dos salários.

Outro bolsonarista, o deputado Zé Trovão (PL-SC), disse, na Câmara, que é preciso pensar nos impactos negativos da proposta para o Brasil, para quem produz e quem gera emprego. “É a turminha da ‘lacrolândia’! São os meninos e as meninas que querem fazer bonito para os seus eleitores e ouvintes, e isso vai destruindo o Brasil”, atacou.

O deputado Mauricio Marcon (Pode-RS), vice-líder da oposição ao Governo Lula na Câmara defendeu que cada pessoa tenha liberdade para trabalhar o quanto quiser e não ficar presa em um sistema de 1940, ao citar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). “Eu poderia apresentar uma PEC determinando que o Governo tem que colocar R$ 1 milhão na conta de cada trabalhador. Apresentar coisas que não deram certo em lugar nenhum do mundo não passa de proselitismo político”, disse.

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), entidade patronal onde atuam boa parte dos trabalhadores que trabalham na escala 6×1 também critiou a PEC. “A imposição de uma redução da jornada de trabalho sem a correspondente redução de salários implicará diretamente no aumento dos custos operacionais das empresas. Esse aumento inevitável na folha de pagamento pressionará ainda mais o setor produtivo, já onerado com diversas obrigações trabalhistas e fiscais”, afirmou, em nota, a CNC.

A proposta também recebeu críticas da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel). “É uma proposta estapafúrdia e que não reflete a realidade. As regulamentações estabelecidas pela Constituição e expressas na CLT são modernas e já trazem as ferramentas para garantir condições de trabalho dignas e justas aos colaboradores. A legislação atual permite que os trabalhadores escolham regimes de jornada adequados ao seu perfil, sem a necessidade de uma alteração constitucional que impacte a operação dos estabelecimentos em todo o Brasil, além de prejudicar os consumidores”, diz Paulo Solmucci, presidente da Abrasel.

#Colabora

Texto produzido pelos jornalistas da redação do #Colabora, um portal de notícias independente que aposta numa visão de sustentabilidade muito além do meio ambiente.

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