Estudo aponta fragilidade da qualidade da água nos rios da Mata Atlântica

Em 95% dos pontos monitorados no bioma, a água está longe da qualidade necessitada pela sociedade, aponta fundação

Por Oscar Valporto | ODS 14ODS 6 • Publicada em 20 de março de 2020 - 19:05 • Atualizada em 20 de março de 2020 - 20:56

Rio do bioma Mata Atlântica em São Paulo: estudo constatou apenas 12 de 240 pontos (5%), com qualidade boa da água (Foto: SOS Mata Atlântica)

Análise da Fundação SOS Mata Atlântica sobre a qualidade da água dos rios do bioma alerta para a situação frágil das suas bacias hidrográficas.  Dos 240 pontos analisados, 189 (78,8%) apresentaram índice de qualidade de água regular nos 12 meses do estudo. Em 38 pontos (15,8%), a qualidade é ruim e, em um único ponto (0,4%), péssima. Em apenas 12 pontos (5%), foi constatada qualidade boa na média do ciclo de doze meses. Nenhum dos rios e corpos d’água tem qualidade ótima. A Fundação SOS Mata Atlântica destaca que “95% dos pontos monitorados apresentam qualidade da água longe do que a sociedade quer e necessita”. 

O estudo faz parte da celebração do  Dia Mundial da Água (22/03) e foi conduzido pelos integrantes do Projeto Observando os Rios. Durante 12 meses, de março de 2019 a fevereiro de 2020, grupos de voluntários coletaram e analisaram a qualidade da água de 181 trechos de corpos d’água, distribuídos em 240 pontos de coleta, em 95 municípios dos 17 estados e do Distrito Federal, que o bioma Mata Atlântica abrange. Na comparação com análise feita no período anterior (entre 2018 e 2019), houve uma queda de três pontos percentuais (de 17,5% para 14,5%) no índice ruim – de 35 para 29 pontos; os pontos em situação regular passaram de 76,5% para 79,5%.

Os números, de acordo com a Fundação SOS Mata Atlântica, mantém um sinal amarelo, de alerta pela situação da água nos rios. “A condição de qualidade da água regular obtida em 78,8% dos rios monitorados nas bacias hidrográficas da Mata Atlântica é um alerta para a urgente necessidade de ações e investimentos voltados à segurança hídrica e socioambiental no Brasil.  Os dados e indicadores levantados reafirmam que estamos muito distantes das metas estabelecidas nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, que preconizam a universalização do saneamento básico no país, a ampliação dos espaços de participação social e a adoção de soluções baseadas na natureza, com a conservação e recuperação de matas nativas e ecossistemas”, afirma o estudo em sua conclusão.

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A qualidade de água péssima e ruim em 16,3% dos pontos monitorados evidencia que 39 trechos de rios estão indisponíveis – com água imprópria para usos – por conta da poluição e da precária condição ambiental das suas bacias hidrográficas, gerando problemas de saúde pública e agravando cenários de escassez e insegurança hídrica

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O estudo destaca que esse alto índice de água regular não é motivo para comemoração. “A qualidade regular da água demanda atenção especial dos gestores públicos e da sociedade, pois esse indicador demonstra que a condição é frágil e está no limite dos padrões definidos na legislação para usos menos restritivos, como recreação, navegação, irrigação e abastecimento público mediante tratamento avançado”, alerta o documento.

A análise do estudo Observando os Rios 2020 revela que há situações piores. “A qualidade de água péssima e ruim em 16,3% dos pontos monitorados evidencia que 39 trechos de rios estão indisponíveis – com água imprópria para usos – por conta da poluição e da precária condição ambiental das suas bacias hidrográficas. Essa precária condição ambiental gera problemas de saúde pública e agrava cenários de escassez e insegurança hídrica”.

A água boa foi registrada em apenas 11 pontos de coleta monitorados: um em Alagoas, um na Bahia, três no Espírito Santo, três em Goiás, um em Mato Grosso e dois em São Paulo. O Distrito Federal e 11 estados – inclusive Rio de Janeiro, Minas Gerais e Pernambuco, todos com trechos ruins – não tiveram registro de pontos com qualidade de água boa.  “É evidente o risco da precária condição dos grandes rios e mananciais urbanos agravar com os retrocessos que vêm sendo impostos para a área ambiental e para a participação social no país. Para que os indicadores aqui reunidos possam ser traduzidos em metas progressivas de qualidade da água nos milhares de rios e mananciais das nossas bacias hidrográficas, é necessário fortalecer as políticas públicas de meio ambiente e água”, frisa o estudo.

Voluntários trabalharam no monitoramento dos rios: 3.500 mobilizadas para retratar qualidade da águas nas bacias da Mata Atlântica (Foto: SOS Mata Atlântica)
Voluntários trabalharam no monitoramento dos rios: 3.500 mobilizadas para retratar qualidade da águas nas bacias da Mata Atlântica (Foto: SOS Mata Atlântica)

O documento do SOS Mata Atlântica indica ainda que as variações climáticas afetam de forma mais intensa os corpos d’água de áreas urbanas em bacias adensadas, sem unidades de conservação e áreas protegidas, e os trechos de rios desprovidos de matas ciliares e serviços de saneamento. “Em 10 pontos de coleta localizados em sub-bacias ou trechos de rios com essas características, os indicadores aferidos apontam piora no índice de qualidade da água e comprometimento da qualidade da água. Em 18 pontos de coleta, onde há participação efetiva das comunidades locais em atividades de conservação e áreas verdes, a qualidade da água melhorou”, indica a análise.

A Mata Atlântica abrangia originalmente uma área equivalente a 1.315.460 quilômetros quadrados ao longo de 17 estados do Brasil.  Apesar de sua vital importância, restam apenas 8,5% de remanescentes florestais acima de 100 hectares de sua área original. Somados todos os fragmentos de floresta nativa acima de três hectares, o Brasil conta atualmente com apenas 12,4% da Mata Atlântica. Ainda assim, o bioma é responsável  “pela manutenção do ciclo hidrológico, do clima e de uma enorme diversidade de espécies, além de ser provedora de serviços e recursos ecossistêmicos essenciais ao equilíbrio da vida de mais de 70% dos brasileiros”, conforme aponta o estudo da SOS Mata Atlântica.

Os indicadores de qualidade da água reunidos no estudo foram obtidos com o trabalho voluntário de 3.500 pessoas integrantes de 199 grupos de monitoramento do projeto Observando os Rios. Esses grupos são formados por alunos e professores de escolas de níveis fundamental, médio e técnico, universidades, integrantes de comunidades tradicionais e indígenas, e representantes de ONGs, movimentos sociais, grupos informais e comunitários, escoteiros, órgãos públicos e privados. ” A construção do retrato da qualidade da água dos rios monitorados por este projeto nas bacias hidrográficas da Mata Atlântica é uma contribuição voluntária da sociedade para governança e gestão integrada da água no Brasil”, destaca o estudo em sua conclusão.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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