Sem balbúrdia: universidades federais têm 823 pesquisas sobre covid-19

Pesquisadora desenvolve teste rápido na Universidade Federal de Uberlândia: instituições já fizeram 55 mil testes (Foto: Divulgação/UFU)

Quando série do #Colabora completa um ano, levantamento mostra importância das instituições públicas no combate à pandemia

Por Oscar Valporto | ODS 3ODS 4 • Publicada em 17 de maio de 2020 - 09:10 • Atualizada em 11 de fevereiro de 2021 - 20:57

Pesquisadora desenvolve teste rápido na Universidade Federal de Uberlândia: instituições já fizeram 55 mil testes (Foto: Divulgação/UFU)

Há um ano, o #Colabora lançava a série 100 Dias de Balbúrdia Federal, após o ministro Abraham Wajntraub acusar as universidades de serem centros de balbúrdia. Nosso objetivo era mostrar, contrariando o ministro, as pesquisas e outras iniciativas importantes produzidas nas instituições públicas. Um ano depois, a terrível pandemia da covid-19 torna ainda mais evidente a relevância das universidades federais: levantamento divulgado pela Andifes (Associações Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior) aponta que estão sendo desenvolvidas, pelo menos, 823 pesquisas sobre a pandemia. São trabalhos que vão da identificação do genoma do vírus para o desenvolvimento de medicamentos e criação de vacina contra a Covid-19 a estudos com sistemas informatizados sobre georreferenciamento para mapear o avanço da doença.

As universidades públicas, assim como o SUS, têm dado as respostas mais eficazes no combate à pandemia. Mas estão dando as respostas com os recursos que têm. Se contassem com mais recursos, poderiam oferecer mais respostas

Os dados – compilados pelo Colégio de Gestores de Comunicação da Andifes – reúnem informações, por enquanto, de 46 das 67 instituições federais de ensino superior, mas eles serão permanentemente atualizados. O levantamento mostra ainda que, além das pesquisas, as universidades têm contribuído com a sociedade, disponibilizando leitos de seus hospitais universitários, produzindo e distribuindo materiais para profissionais de saúde e hospitais, entre outras ações. São 2.228 leitos normais para tratamento da pandemia e 489 leitos de UTI dos hospitais universitários – o número total inclui leitos próprios e outros viabilizados em parcerias para a construção e a operacionalização de hospitais de campanha. Em relação aos produtos, foram 96 ações de produção de álcool e produtos sanitizantes (992.828 litros de álcool gel e 912 mil litros de álcool líquido até o momento). As instituições também realizaram 104 ações de produção de EPIs, que resultaram na produção de 162.964 protetores faciais, 85.514 máscaras de pano, 20.200 unidades diversas, seis mil aventais e dois mil capuzes, além de mais de 55 mil testes para diagnósticos de covid-19.

Muitos destes testes vêm sendo realizados em parceria com governos estaduais e prefeituras: estão em andamento, nestas 46 universidades pesquisadas, 79 parcerias com governos estaduais e 198 com administrações municipais. Até o momento, as universidades também promoveram 697 campanhas educativas e 341 ações solidárias.“As universidades públicas, assim como o SUS, têm dado as respostas mais eficazes no combate à pandemia. Mas estão dando as respostas com os recursos que têm. Se contassem com mais recursos, poderiam oferecer mais respostas. É isso o que esses números mostram”, afirmou o presidente da Andifes e reitor da Universidade Federal da Bahia, João Carlos Salles Pires, ao apresentar os dados do levantamento.

Produção de álcool gel no laboratório da Universidade Federal de Sergipe: 992.828 litros de álcool gel e 912 mil litros de álcool líquidos fabricados nas instituições federais (Foto: Divulgação/UFS)
Produção de álcool gel no laboratório da Universidade Federal de Sergipe: 992.828 litros de álcool gel e 912 mil litros de álcool líquidos fabricados nas instituições federais (Foto: Divulgação/UFS)

Sobre a evolução e o estágio das pesquisas desenvolvidas pelas instituições de ensino superior, a reitora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Lúcia Pellanda, destacou que a grande variedade de iniciativas pelo Brasil. “Há 823 pesquisas em andamento. Basicamente está sendo feita a identificação do genoma viral, o que permite depois se estabelecer uma vacina. Outros grupos estão trabalhando em sistemas informatizados para detecção de casos. Há muitas iniciativas buscando maneiras de se realizar testes com custos mais baixos”, explicou a reitora.

Clique para acompanhar a cobertura completa do #Colabora sobre a pandemia do coronavírus

O papel dos Hospitais Universitários no enfrentamento à Covid-19 também foi destacado no levantamento. Segundo o presidente da Andifes, o sistema das universidades federais, referência em diversas áreas, está impactado pelo colapso do SUS devido à pandemia. “Todo o sistema sofre com este impacto, não somente com relação ao novo coronavírus, mas na dedicação a outras doenças”, disse o professor Salles Pires. Reitor da Universidade Federal Fluminense (UFF), o professor Antonio Claudio da Nóbrega lembrou que os hospitais universitários, que são inseridos dentro do SUS, têm a missão de fazer atendimentos de média e alta complexidade, tendo um papel de destaque no cuidados de outras doenças. “Mesmo em meio à pandemia, é importante que se mantenha a lógica do SUS, visto que as outras doenças continuam acontecendo. Nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, a mortalidade relativa a outras doenças aumentou também porque o sistema ficou sobrecarregado com a pandemia. Então, às vezes, o número de leitos disponibilizados pelos hospitais universitários não dá a total dimensão da relevância de se manter o atendimento de média e alta complexidade de outras doenças”, lembrou.

Protótipo de respirador em teste na UFRGS: pelo menos 823 pesquisas sobre covid-19 nas universidades federais (Foto: Divulgação/UFRGS)
Protótipo de respirador em teste na UFRGS: pelo menos 823 pesquisas sobre covid-19 nas universidades federais (Foto: Divulgação/UFRGS)

Pesquisa não é balbúrdia

O levantamento feito pela Andifes serve para desmentir – mais uma vez – as declarações desastradas do ministro, habitual crítico das instituições públicas de ensino. O #Colabora publicou, sem dificuldade de achar pautas, 100 reportagens diárias consecutivas com pesquisas, projetos de extensão e trabalhos em parceria com a sociedade realizados pelas instituições federais de todo o país: de veículos elétricos e movidos à energia solar a tratamentos contra zika, chikungunya,diabetes, Parkinson, doenças respiratórias; de pesquisas sobre biodiversidade e ameaças ambientais na Amazônia e outros biomas a projetos para aplicação na indústria nacional. Nestes 100 dias, de maio a agosto de 2019, o #Colabora mobilizou mais de 40 jornalistas em todo o país para mostrar a diversidade da produção acadêmica brasileira que continuou sob ataque do governo com cortes de verbas para manutenção e de bolsas de pesquisa.

As universidades são lugares de combate ao obscurantismo

A série #100diasdebalbúrdiafederal terminou, mas o #Colabora decidiu manter seu compromisso de divulgar a produção científica e deixar sempre claro que pesquisa não é balbúrdia. De agosto até agora, foram mais 36 reportagens – com periodicidade semanal – sobre trabalhos realizados pelas universidades públicas, agora em parceria com as próprias instituições e agências de divulgação científica. No total, em um ano, o #Colabora publicou matérias sobre pesquisas e projetos de mais de 40 universidades, de 23 estados brasileiros e do Distrito Federal.

Leia todas as reportagens da série #100diasdebalbúrdiafederal

Protesto de estudantes universitários contra os cortes nas verbas da educação e as declarações do ministro Abraham Weintraub: pesquisa não é balbúrdia (Foto: Cris Faga/NurPhoto)
Protesto de estudantes universitários contra os cortes nas verbas da educação e as declarações do ministro Abraham Weintraub: pesquisa não é balbúrdia (Foto: Cris Faga/NurPhoto)

Desde março, temos destacado as iniciativas das instituições públicas no combate à pandemia da covid-19: mostramos iniciativas da Universidade Federal Fluminense e da Universidade Federal de Santa Catarina para a produção de equipamentos de proteção individual e materiais para hospitais; pesquisas com o mapeamento das profissões mais afetadas, sobre avanço da doença sem isolamento social, com as condições que facilitaram o contágio; trabalhos educativos como da Universidade Federal da Grande Dourados que criou uma cartilha em guarani para indígenas da região e da Universidade Federal do Mato Grosso que fez um livro infantil para ensinar sobre o coronavírus.

O levantamento da Andifes mostra a magnitude do trabalho desenvolvido pelas instituições federais – são mais de 823 pesquisas em andamento porque algumas universidades ainda não responderam à pesquisa. Há também centenas de trabalhos científicos sendo produzidos por universidades públicas estaduais como a USP, a Unicamp, a UERJ, a UERGS, as universidades estaduais de Londrina (PR), Feira de Santana (BA), de Montes Claros (MG) – entre tantas outras. “As universidades são lugares de combate ao obscurantismo”, afirmou o presidente da Andifes, João Carlos Salles Pires, ao apresentar os dados das instituições federais. E, mais do que nunca, o Brasil precisa da ciência para enfrentar a pandemia e obscurantismo.

A série #100diasdebalbúrdiafederal terminou, mas o #Colabora vai continuar publicando reportagens para deixar sempre bem claro que pesquisa não é balbúrdia.

 

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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