Diário da Covid-19: pandemia cresce mais rapidamente no Brasil do que no mundo

O casal austríaco Sigrun e Franz faz a sua cerimônia de casamento em meio à pandemia. No cartaz: “Nós ousamos”. Foto Barbara Gindl/AFP

Número de mortes no país aumentou 12 vezes entre os dias 1 e 24 de abril. Se ritmo for mantido, em maio, estaremos no segundo lugar do ranking

Por José Eustáquio Diniz Alves | ODS 3 • Publicada em 25 de abril de 2020 - 11:21 • Atualizada em 28 de abril de 2020 - 10:04

O casal austríaco Sigrun e Franz faz a sua cerimônia de casamento em meio à pandemia. No cartaz: “Nós ousamos”. Foto Barbara Gindl/AFP

As variações diárias dos casos e das mortes pela covid-19 na sexta-feira (dia 24/04) foram as segundas maiores da série, desde o início da pandemia no Brasil. O ritmo brasileiro está cerca de 2 vezes mais rápido do que ritmo médio global, embora o mundo tenha batido o recorde de casos diários com uma cifra de mais de 105 mil nesta mesma sexta-feira. Conhecer os números epidemiológicos é fundamental para orientar as políticas de saúde, visando evitar a propagação do surto e reduzir os danos da morbidade e da mortalidade. É fundamental também para salvar vidas e planejar a retomada da atividade econômica.

O panorama nacional

Os números da pandemia do coronavírus na tarde do dia 24 de abril de 2020 chegaram a 52.995 casos e a 3.670 mortes, com uma taxa de letalidade de 6,9%. A variação diária do número de pessoas infectadas foi de 3.503 casos e de 357 óbitos.

O gráfico abaixo mostra a série histórica de casos e de mortes no Brasil de 01 a 24 de abril de 2020. O número de casos aumentou 7,8 vezes (ou 9% ao dia) e o número de mortes aumentou 12 vezes (ou 12% ao dia). Se estas tendências se mantiverem pelos próximos 14 dias, teríamos 175 mil casos e 18 mil mortes em 08 de maio.

Mas, como uma alternativa para a análise, o gráfico abaixo apresenta um modelo de projeção com uma equação polinomial (de terceiro grau) que indica 110 mil casos e 8 mil mortes no dia 08 de maio. O futuro é sempre difícil de prever, mas os cenários indicados aqui mostram que a pandemia vai continuar avançando e é necessário ter uma boa notificação dos casos e das mortes para orientar a política pública de saúde. Ou seja, o Brasil ainda está subindo a curva da pandemia e ainda falta algum tempo para se atingir o topo e começar a descida da curva e a redução das variações diárias. Ter ações claras e firmes na área de saúde é essencial para evitar o pior e permitir, o mais rápido possível, a flexibilização do fim do isolamento social.

Os gráficos abaixo mostram a aplicação do modelo polinomial para a variação diária dos casos (gráfico da esquerda) e das mortes (gráfico da direita). Por conta das oscilações da série (quando os números caem nos fins de semana e feriado e aumentam nos dias úteis) a curva polinomial é a que melhor ajusta os dados e indica que o número diário de novas pessoas infectadas está na casa de 3 mil e o número de mortes na casa de 300 óbitos. A curva pontilhada mostra as projeções até dia 08 de maio, quando o número diário de casos deve ficar na casa de 5.000 e de mortes em 600 óbitos.

A impressão que se tem é que muita gente no país não percebe a gravidade da situação e que a população está indo numa direção e o Governo Federal está indo na contramão. São tantas notícias vindas do Planalto e tantas mudanças no governo que a luta para conter o coronavírus parece estar ficando em segundo plano, o que é um erro grave.

O panorama global

No dia 24 de abril, a pandemia global atingiu a marca de 2,83 milhões de casos e 197 mil mortes, com uma taxa de letalidade de 7%. Até ontem o pico do número diário de casos tinha acontecido no dia 03 de abril com um valor pouco abaixo de 100 mil, mas na sexta-feira atingiu 105 mil casos, recorde da série, e indicação de que o pico mundial ainda não foi alcançado.  O pico de mortes, até aqui, ocorreu no dia 17 de abril com valor pouco acima de 8 mil. No dia 24/04, a variação diária do número de mortes ficou em 6,2 mil, conforme pode ser visto no gráfico abaixo.

Ainda não está claro se o mundo chegou ao pico, pois enquanto o ritmo da pandemia já se reduz bastante em vários países, contudo, continua em ritmo acelerado em outros. A tabela abaixo mostra os 10 países que tinham o maior número de casos no dia 01 de abril e compara com a situação em 24 de abril, além de comparar com os demais 200 países e com o Brasil. Nota-se que os 10 países concentravam 80,2% dos casos e 88,9% das mortes do mundo no dia 01/04 e caíram para 70,9% e 82,7% no dia 24/04. Enquanto o número de casos estava crescendo a 4,2% ao dia nos 10 países do topo do ranking, crescia a 4,7% no mundo e a 6,4% nos demais 200 países e territórios. No período em que o número de mortes crescia a 5,8% ao dia nos 10 países do topo do ranking, crescia a 6,1% no mundo e a 8,1% nos demais 200 países e territórios.

Nota-se que a pandemia no Brasil cresce em ritmo mais acelerado do que a média dos 10 países, mais do que a média mundial e mais do que a média dos 200 países. Neste ritmo, até meados de maio o Brasil pode estar no segundo lugar no topo do ranking internacional, atrás apenas dos EUA.

A pandemia e o pandemônio econômico

Não faltam indicadores de enfraquecimento da economia brasileira. Diante da difusão da pandemia de covid-19 e da crise econômica, mas especialmente com o agravamento da crise política, a instabilidade aumentou muito, na sexta-feira dia 24 de abril de 2020. A saída do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, foi acompanhada por denúncias sérias que abalam a credibilidade e a viabilidade do atual governo. O pronunciamento estranho e nada convencional do mandatário máximo da República, no mesmo dia, gerou mais dúvidas do que esclarecimentos. Com tudo isto, o índice Ibovespa fechou o dia com queda de 5,45% e o dólar fechou a R$ 5,69, recorde desde o lançamento do Real.

Nestas horas vale a pena lembrar a frase do economista e ex-ministro Mário Henrique Simonsen que resume muitas questões em termos de desequilíbrios macroeconômicos e que se torna ainda mais profética nesta época de pandemia: “Inflação aleija, mas câmbio mata”.

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Os humanos são mais numerosos do que qualquer outro grande animal na história da Terra. E isso representa uma forma de desequilíbrio ecológico que não pode continuar para sempre. Em algum momento haverá uma correção natural

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A visibilidade da pandemia e a invisibilidade do Inseticídio

Enquanto a pandemia da covid-19 está no centro das preocupações mundiais, uma outra “pandemia” acontece quase de maneira invisível: o Inseticídio. Um estudo realizado por duas universidades alemãs revelou que cerca de 24% dos insetos do mundo foram perdidos ao longo dos últimos 30 anos. Realizada em 1.676 locais no mundo, a pesquisa constatou um declínio preocupante, pois os insetos são polinizadores, inimigos naturais de pragas, decompositores e são essenciais para o funcionamento de todos os ecossistemas da Terra.

As abelhas, por exemplo, são vitais para a flora e a polinização e já foram declaradas as espécies mais importantes da Terra pela Sociedade Geográfica Real. Como os principais polinizadores do mundo, elas desempenham um papel importante no ciclo de vida de muitas espécies de plantas e ajudam a manter ecossistemas saudáveis. O Distúrbio do Colapso das Colônias – o desaparecimento de populações de abelhas – é não só um ecocídio, mas pode provocar grandes crises de fome pois a população humana depende do trabalho das abelhas para garantir as safras de alimentos. O trabalho pode ser acessado no link:  <https://www.idiv.de/en/news/news_single_view/1695.html>

Frase do dia 25 de abril de 2020

“Os humanos são mais numerosos do que qualquer outro grande animal na história da Terra. E isso representa uma forma de desequilíbrio ecológico que não pode continuar para sempre. Em algum momento haverá uma correção natural”

Marc Bassets, Economista

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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Um comentário em “Diário da Covid-19: pandemia cresce mais rapidamente no Brasil do que no mundo

  1. Newton disse:

    Há um erro na citação do autor da frase do dia: o livro Spillover: Animal Infections and the Next Human Pandemic é de David Quammen e não de Marc Bassets (que, até onde eu sei, é um articulista).

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