Doença infeciosa mais letal do planeta, tuberculose mata 4 mil por dia

Dia Mundial de Combate à Tuberculose: número de casos no Brasil, que chegou a 63 mil em 2015, passou de 69 mil em 2017 para 76 mil em 2018 (Foto: Agecom Bahia)

No Dia Mundial da Tuberculose, OMS lembra que 10 milhões contraem a doença todos os anos e novo coronavírus agrava estado de saúde

Por Oscar Valporto | ODS 3 • Publicada em 24 de março de 2020 - 10:03 • Atualizada em 27 de março de 2020 - 10:20

Dia Mundial de Combate à Tuberculose: número de casos no Brasil, que chegou a 63 mil em 2015, passou de 69 mil em 2017 para 76 mil em 2018 (Foto: Agecom Bahia)

Na sua entrevista coletiva diária sobre a pandemia de coronavírus na segunda-feira, 23/03, o diretor-geral da Organização Mundial de Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, tirou alguns minutos para lembrar que a terça, 24/03, é o Dia Mundial de Combate à Tuberculose, doença que mata mais de 4 mil pessoas por dia e, em 2018, tirou a vida de 1,5 milhão em todo o planeta. A pandemia torna a tuberculose ainda mais ameaçadora. “Os pacientes de tuberculose constituem um grupo de risco, uma vez que sua doença de base pode ser agravada, e assim eles podem contribuir para o aumento da letalidade e da mortalidade do novo coronavírus”, disse a pneumologista Margareth Dalcolmo, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz).

Em entrevista à Agencia Fiocruz, a médica lembrou que o Brasil registra mais de 70 mil novos casos de tuberculose por ano, e cerca de 4,5 mil mortes anuais.  “Neste momento, a situação da tuberculose se agrava devido à pandemia de Covid-19 por ser uma doença eminentemente respiratória, que exige diagnóstico precoce e cuidados de grande especificidade”, afirmou a pneumologista Margareth Dalcolmo. A Fiocruz iluminou de vermelho sua sede.

O mesmo alerta foi feito em comunicado divulgado na manhã do Dia Mundial da Tuberculose, que continua sendo doença infecciosa mais letal do mundo: em 2018, 10 milhões de pessoas adoeceram com tuberculose em todo o mundo e 1,5 milhão de pessoas perderam a vida. “A covid-19 está destacando quanto são vulneráveis as pessoas com doenças pulmonares e sistemas imunológicos debilitados”, disse o Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS. “O mundo se comprometeu a acabar com a tuberculose até 2030; melhorar a prevenção é essencial para que isso aconteça. Milhões de pessoas precisam ser capazes de tomar tratamento preventivo da TB para interromper o aparecimento da doença, evitar o sofrimento e salvar vidas “.

O diretor-geral da OML destacou a importância de continuar os esforços para combater problemas de saúde antigos e conhecidos, incluindo a tuberculose, durante epidemias como a covid-19. Ao mesmo tempo, programas já existentes para combater a tuberculose e outras doenças infecciosas importantes podem ser aproveitados para tornar a resposta ao coronavírus mais eficaz e rápida. Tedros Adhanom Ghebreyesus destacou que houve avanços no combate à tuberculose mas ainda insuficientes.

A situação brasileira tem um agravante o número de casos vem crescendo desde 2015, quando foram notificados 63.189 novos casos de tuberculose no país. O número significou uma redução de 12,5% em 10 anos; numa década, a incidência de casos de tuberculose no Brasil havia tido uma queda de 20,2%, passando de 38,7 casos/100 mil habitantes em 2006 para 30,9 casos/100 mil habitantes em 2015  Mas o número de casos passou a subir a partir de 2016: chegou a 69 mil em 2017 e saltou para 76 mil em 2018, último dado divulgado pelo Ministério da Saúde, em novembro de 2019.

Já existe evidência científica brasileira de que o suporte de programas sociais e melhor oferta de saúde – por exemplo, o Programa de Saúde da Família- diminuem o risco de adquirir tuberculose e aumentam as chances de um tratamento de sucesso

De acordo com os especialistas, a tuberculose é uma doença que segue marcadores de desigualdade e vulnerabilidade o que explicaria o aumento do número de casos da doença no Brasil a partir de 2016: a crise econômica contribuiu para o crescimento da epidemia, que havia recuado nos dez anos anteriores graças aos programas de controle do sistema público de saúde.  Em entrevista ao Jornal da USP, no mês passado,  epidemiologista Otávio Ranzani alertou  que a crise econômica é um dos fatores relacionados ao aumento do número de casos de tuberculose, mas não o único. “Além da crise, os cortes na saúde e educação e em programas sociais afetam esta população mais vulnerável de modo direto. E já existe evidência científica brasileira de que o suporte de programas sociais e melhor oferta de saúde – por exemplo, o Programa de Saúde da Família- diminuem o risco de adquirir tuberculose e aumentam as chances de um tratamento de sucesso”, enfatizou Raziani.

Cartaz da campanha contra tuberculose em 2015, com zagueiro Thiago Silva, curado da doença: tratamento é gratuito no SUS mas pobreza e desigualdade aumentam incidência (Foto: Secom/RO)
Cartaz da campanha contra tuberculose em 2015, com zagueiro Thiago Silva, curado da doença: tratamento é gratuito no SUS mas pobreza e desigualdade aumentam incidência (Foto: Secom/RO)

Relatório 2019 sobre a Tuberculose, divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em outubro passado, indica um aumento do número de novos casos e recidivas da doença no Brasil. No período entre 2000 e 2018, a incidência da tuberculose no Brasil teve seu valor máximo em 2004, com 54 casos para cada 100.000 habitantes. Desde então, a incidência anual vinha caindo sucessivamente: o índice mais baixo foi alcançado em 2014, com 43 casos para 100.000, mesmo índice do ano seguinte. Mas, depois, passou a subir, atingindo 45 casos por 100.000 habitantes em 2018. O Amazonas é o estado brasileiro com maior número de casos de tuberculose, seguido pelo Rio de Janeiro, onde a doença está concentrada nas favelas – principalmente Jacarezinho, Manguinhos e Rocinha. No Amazonas, nos dois primeiros meses de 2020, foram registrados 336 novos casos de tuberculose.

Avanços no mundo

O mesmo relatório da OMS aponta que, em 2018, o número de pessoas que receberam tratamento para a tuberculose bateu um recorde histórico, devido, principalmente, a uma melhor detecção e diagnóstico da doença: foram 7 milhões de doentes diagnosticados e tratados para tuberculose, contra 6,4 milhões em 2017. O documento também revelou que houve uma redução no número de mortes por tuberculose: 1,5 milhão de pessoas morreram da doença em 2018, ante 1,6 milhão em 2017. Além disso, o número de novos casos de tuberculose vem diminuindo constantemente nos últimos anos. A OMS alertou, contudo, que o índice da doença permanece alta entre populações de baixa renda e em situação de vulnerabilidade: cerca de 10 milhões de pessoas desenvolveram tuberculose em 2018.

A covid-19 está destacando o quanto são vulneráveis as pessoas com doenças pulmonares e sistemas imunológicos debilitados

O documento lembra ainda que a doença mata, diariamente, quase 4.500 pessoas em todo o planeta e permanece com o status de doença infecciosa mais mortal do mundo. Números indicam ainda que 30 mil pessoas são acometidas pela tuberculose todos os dias. Mas, de acordo com a OMS, esforços globais para combater a doença salvaram 54 milhões de vidas desde o ano 2000 e reduziram a mortalidade em 42%. A tuberculose é uma doença infectocontagiosa que afeta principalmente os pulmões, mas também pode acometer órgãos como ossos, rins e meninges (membranas que envolvem o cérebro).

A OMS alertou ainda, no documento, que o combate à tuberculose ainda é cronicamente subfinanciado e estimava que o déficit para prevenção e tratamento da doença em US$ 3,3 bilhões. O relatório apontou que cerca de 3 milhões de pessoas com a doença ainda não recebem os cuidados dos quais precisam, destacando que o mundo deve acelerar o progresso para alcançar a meta de desenvolvimento sustentável de acabar com a tuberculose até 2030. O ODS 3.3 inclui a meta de acabar com a epidemia de tuberculose até 2030. A Estratégia Global contra Tuberculose, aprovada pela Assembleia Mundial da Saúde, visa uma redução de 90% nas mortes por tuberculose e uma redução de 80% na taxa de incidência de tuberculose até 2030, em comparação com os níveis de 2015.

Campanha da OMS para o Dia Mundial da Tuberculose 2020: doença infeciosa mais letal do mundo (Foto: Reprodução)
Campanha da OMS para o Dia Mundial da Tuberculose 2020: doença infeciosa mais letal do mundo (Foto: Reprodução)

Recomendações da OMS

No comunicado do Dia Mundial da Tuberculose, a OMS listou recomendações para o combate à doença. “Estamos pedindo aos governos, comunidades afetadas, organizações da sociedade civil, prestadores de serviços de saúde, doadores, parceiros e a indústria que unam forças e intensifiquem a resposta à tuberculose – principalmente para o tratamento preventivo – e garantam que ninguém seja deixado para trás”, disse, em entrevista coletiva, Tereza Kasaeva, diretora do Programa Global de TB da OMS. “A nova orientação da OMS mostra o caminho a seguir para que milhões acessem rapidamente novas ferramentas e opções mais curtas e seguras para tratamento preventivo. A hora da ação é agora”, acrescentou.

* A OMS recomenda uma ampliação do tratamento preventivo da tuberculose entre as populações de maior risco, incluindo parentes que vivem com pacientes com TB, pessoas com HIV e outras pessoas em risco com baixa imunidade ou vivendo em ambientes lotados.

* A OMS recomenda a integração dos serviços de tratamento preventivo da tuberculose com nos esforços contínuos para encontrar casos de TB ativa. Todos os parentes que vivem com pacientes com TB e pessoas vivendo com HIV devem ser testados quanto à tuberculose ativa. Se a tuberculose ativa for descartada, ela deverá ser iniciada no tratamento preventivo da TB.

* A OMS recomenda que um teste cutâneo de tuberculina ou um teste de liberação de interferon gama (IGRA) seja usado para testar a infecção por tuberculose. Ambos os testes são úteis para encontrar pessoas com maior probabilidade de se beneficiarem do tratamento preventivo da tuberculose, mas não devem se tornar uma barreira para aumentar o acesso. O teste para infecção por tuberculose não é necessário antes do início do tratamento preventivo em pessoas vivendo com HIV e crianças menores de 5 anos que têm contatos com pacientes com TB ativa.

* A OMS recomenda novas opções mais curtas para tratamento preventivo, além dos seis meses de isoniazida diária, tratamento amplamente utilizado no mundo inteiro, inclusive no Brasil, onde é gratuito e disponível no SUS. As opções mais curtas agora recomendadas variam de um regime diário de 1 mês de rifapentina mais isoniazida a 3 meses semanalmente de rifapentina mais isoniazida, 3 meses de rifampicina diária mais isoniazida ou 4 meses de rifampicina diária isolada.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

Newsletter do #Colabora

Um jeito diferente de ver e analisar as notícias da semana, além dos conteúdos dos colunistas e reportagens especiais. A gente vai até você. De graça, no seu e-mail.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *