‘Mais de 60% dos brasileiros serão vacinados em 2021’

Técnico de Bio-Manguinhos trabalha nos testes da covid-19. A instituição vai produzir mais de 200 milhões de doses de vacina contra a doença em 2021. Foto Carl de Souza/AFP

Maurício Zuma, Diretor de Bio-Manguinhos/Fiocruz, garante que instituição está preparada para produzir mais de 210 milhões de doses

Por Agostinho Vieira | ODS 3 • Publicada em 31 de dezembro de 2020 - 10:43 • Atualizada em 12 de janeiro de 2021 - 09:41

Técnico de Bio-Manguinhos trabalha nos testes da covid-19. A instituição vai produzir mais de 200 milhões de doses de vacina contra a doença em 2021. Foto Carl de Souza/AFP

Oito em cada dez brasileiros já sabem qual será o primeiro item na lista de desejos para o ano que se inicia. Na verdade, tirando os negacionistas, os mal informados e os mal intencionados, que, infelizmente, nem são tão poucos assim, os demais sonham com a chegada de uma vacina contra a covid-19. Qualquer uma. Basta ser eficaz e segura. Não importa a cor ou a origem. E um dos principais responsáveis pela realização deste sonho é um servidor público que trabalha há 37 anos na barulhenta e poluída Avenida Brasil. Maurício Zuma Medeiros é o diretor do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos – Bio-Manguinhos, braço da Fiocruz responsável pela produção de vacinas. Será dele a tarefa de coordenar a produção de mais de 200 milhões de doses da vacina da Universidade de Oxford, criada em parceria com o laboratório britânico AstraZeneca.

“Até julho vamos produzir 100,4 milhões de vacinas a partir do Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA) que está sendo importado da AstraZeneca. E serão mais 110 milhões a partir de agosto ou setembro com o IFA produzido já em Bio-Manguinhos. Além disso, o Brasil ainda contará com as vacinas do Butantan, da Pfizer e da Covax. Logo, é possível sim imunizarmos mais de 60% da população em 2021”, garante Zuma.

A conta é mais ou menos a seguinte. O Brasil tem 210 milhões de habitantes. Cerca de 50 milhões são crianças e jovens, que não serão incluídos nessa campanha de vacinação. Sobram 160 milhões. Dois terços de 160 milhões dá cerca de 110 milhões de pessoas. Como são necessárias duas doses, precisaríamos de 220 milhões de doses de vacina. Só de Bio-Manguinhos sairão 210 milhões, mais 50 ou 60 milhões do Butantan, mais 8,5 milhões da Pfizer, mais 40 milhões da Covax (consórcio criado pela OMS do qual o Brasil faz parte). Com isso, se tudo correr bem, teremos mais de 300 milhões de doses ao longo do próximo ano. Dá para respirar com tranquilidade, certo? Errado.

Maurício Zuma com a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade, e a veterinária Noemi Rovaris, durante uma cerimônia de premiação. Foto Bernardo Portella/Fiocruz
Maurício Zuma com a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade, e a veterinária Noemi Rovaris, durante uma cerimônia de premiação. Foto Bernardo Portella/Fiocruz

Para Maurício Zuma, 2021 será ainda um ano de muita cautela e de manutenção das medidas de proteção, como uso de máscara, álcool gel e, principalmente, sem aglomerações: “É bom termos esperança na vacina, mas a realidade é que a normalidade ainda vai levar tempo. Só depois que um grande contingente estiver vacinado é que o vírus deverá ter sua transmissão reduzida ou interrompida. Ainda temos muito o que aprender sobre esse vírus, portanto teremos que manter todos os cuidados”.

Hoje, a área comandada por Maurício Zuma na Fiocruz já é responsável pela produção de 120 milhões de doses de vacina por ano, para doenças como a febre amarela, a poliomielite, o sarampo, a caxumba, a rubéola e as meningites A e C.  Dos 19 diferentes tipos de vacina que fazem parte do Plano Nacional de Imunização (PNI), dez são fabricadas em Bio-Manguinhos. Agora, com a covid-19, a capacidade de produção terá que ser multiplicada por três, pois as outras vacinas continuarão sendo necessárias.

Maurício Zuma nega que tenha havido um tropeço no processo de desenvolvimento e produção da vacina de Oxford: “Não houve tropeço, a AstraZeneca se articulou com diversas empresas ao redor do mundo, o processo é complexo e pode levar um pouco mais de tempo do que havia sido planejado. Mas nós deveremos receber as primeiras 7,5 milhões de doses de IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo ou Princípio Ativo) até meados de janeiro”.

Com a chegada do IFA, a intenção dos técnicos da Fiocruz é começar a produção em 20 de janeiro e ter vacinas disponíveis para a população em meados de fevereiro, na semana de 8 de fevereiro, ou, o mais tardar, na semana de 15 de fevereiro. Chegando ao final do mês já com 30 milhões de doses produzidas.

Técnicos da Fiocruz investigam a ação de medicamentos antivirais sobre o novo coronavírus. Foto Acervo da Fiocruz
Técnicos da Fiocruz investigam a ação de medicamentos antivirais sobre o novo coronavírus. Foto Acervo da Fiocruz

Mas, afinal, serão duas doses ou uma dose e meia? Ao longo do processo de desenvolvimento da vacina de Oxford/AstraZeneca, a eficácia comprovada girou sempre em torno de 70%. Só que, por um “equívoco na fase de testes” foi aplicada meia dose e uma dose em alguns pacientes, em lugar das duas doses convencionais. Nesse cenário, a eficácia subia, inexplicavelmente, para 90%. Zuma explica que o registro da vacina no Brasil deve ser mesmo com as duas doses completas: “Os estudos para uso de meia dose precisam ser estendidos ainda para serem usados. Neste momento, o pedido de registro será com o que os estudos podem comprovar totalmente”.

Será feito um pedido de uso emergencial da vacina para a Anvisa? “Estamos avaliando isso com a AstraZeneca. Se houver viabilidade, sim, faremos. Mas ainda precisamos ter mais certeza de que é viável, principalmente por conta de disponibilidade de vacina. Nossa vacina estará pronta em meados de fevereiro e teremos o registro definitivo, assim esperamos. Se não conseguirmos vacina pronta de fora antes disso, não valerá a pena buscarmos registro emergencial”.

O diretor de Bio-Manguinhos lamenta as campanhas de desinformação e negacionismo espalhadas pelo país, que têm feito algumas pessoas afirmarem que não vão tomar a vacina, especialmente a chinesa, que será produzida no Instituto Butantan: “Entendo que precisamos de uma campanha forte de informação. Qualquer vacina que seja aprovada pela Anvisa, a população pode confiar. Temos uma Agência de alto nível, no mesmo nível das internacionais, portanto não há motivos para se desconfiar de qualquer vacina que seja aprovada no Brasil”. Em suas mensagens de Ano Novo, Maurício Zuma acrescenta sempre as palavras saúde e esperança. Faz sentido. Que servidores públicos como ele transformem 2021 em um ano mais leve para todos nós.

Agostinho Vieira

Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.

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