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Disputa entre Pfizer e Moderna atrasa compra de vacinas contra Covid-19
Fim de emergência de saúde fez processo perder agilidade e recurso de fabricante adia aquisição de doses; estados e municípios estão sem estoque
Diversos municípios e estados brasileiros estão sem doses da vacina contra a Covid-19, devido ao atraso na aquisição de novas doses. A demora ocorreu por conta de duas razões principais: o final do estado de emergência de saúde, o que fez com que a compra das vacinas voltasse a ser feita por trâmites mais convencionais; e um pedido de recurso da Pfizer, que perdeu a licitação eletrônica para aquisição de novos lotes. De acordo com o Ministério da Saúde, novas doses da vacina contra a covid-19 devem chegar na próxima semana – a partir de 22/04 – para serem distribuídas aos estados.
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De acordo com dados disponíveis no processo de Dispensa Eletrônica N° 90001/2024, a proposta da Pfizer foi de R$ 824.875.000 por 12,5 milhões de doses, enquanto a empresa Moderna, vencedora do processo, ofertou a mesma quantidade de vacinas por R$ 725.000.000. “O pedido de recurso trava o andamento do processo por conta dos prazos regimentais, quando há contestação, independentemente do mérito. Com isso, o cronograma está sofrendo um impacto muito grande, atrasando todo o processo de compra, envio para o país e distribuição”, afirmou fonte ligada ao Ministério da Saúde que preferiu não se identificar.
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Veja o que já enviamosA expectativa é de que o último recurso apresentado pela farmacêutica seja analisado nesta semana, a campanha de imunização contra a Covid-19, no entanto, só deve iniciar em maio. A última compra de vacinas contra o Sars-Cov-2 foi feita em 2022, durante o governo Bolsonaro.
A primeira vacina atualizada que protege contra a variante Ômicron XBB.1.5, predominante na maioria dos casos no último ano, foi aprovada em dezembro de 2023 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no caso se tratava do imunizante da Pfizer. Já a nova versão da Moderna teve o registro aprovado pela agência reguladora em março deste ano.
No Estado de São Paulo, nos últimos três meses, foram recebidas apenas 63.900 doses da vacina, entre bivalente e pediátrica. Capitais estaduais como Porto Alegre, Curitiba, Rio de Janeira e Vitória também enfrentam o mesmo problema, assim como outros municípios e estados brasileiros.
De acordo com o último boletim epidemiológico sobre a Covid-19, foram registrados 14.054 novos casos e 122 mortes no país entre 31 de março e 6 de abril, uma redução de 6,8% em relação à semana anterior. No total em 2024, são 547.108 casos e 2.864 óbitos pela doença no Brasil. Embora os números indiquem uma queda no número de casos, a falta de doses preocupa especialistas, principalmente em um contexto de crescimento dos casos de dengue e de gripe no país.
Ana Beatriz Gorini da Veiga foi uma das pessoas que buscou um posto de saúde para receber o imunizante e não conseguiu se vacinar. A professora e pesquisadora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) alerta para o risco das pessoas se descuidarem e não tomarem um dos dois imunizantes: da influenza ou da covid-19. “O coronavírus sofre constantes mutações, é importante que a gente mantenha essa vacinação por enquanto, pelo menos enquanto o vírus ainda está evoluindo bastante”, acrescenta Ana Gorini.
Cobertura vacinal de crianças segue baixa
Infectologista e professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Raquel Stucchi pondera que o cenário epidemiológico atual, com redução principalmente da mortalidade associada ao vírus, não elimina a preocupação com a falta de doses e o impacto em grupos mais vulneráveis da população à covid-19, como idosos.
“Os grupos populacionais com baixa adesão são realmente pessoas que têm maior risco de adoecimento grave”, afirma Raquel, que faz parte da Comissão de Imunização da Sociedade Brasileira de Infectologia. A especialista destaca a importância de uma campanha de conscientização para aumentar a cobertura, em especial, no caso das crianças.
Segundo dados do Ministério da Saúde, a cobertura vacinal de crianças entre 6 meses a 2 anos para covid-19 é de apenas 13,47% com duas doses, número que sobe para 22,58% no caso de crianças com 3 a 4 anos e 55,68% dos 5 aos 11 anos. De um modo geral, os valores caem de forma considerável quando se considera a aplicação de três doses.
“É importante que nós todos possamos nos dedicarmos a processos educativos da população, entendendo quais as dúvidas, quais os medos daquelas pessoas que não se vacinaram até o momento”, enfatiza Raquel Stucchi. A professora da Unicamp lembra que o grupo das crianças também é bastante afetado pelo vírus da influenza, o que reforça a importância da imunização contra as duas doenças.
Consultada sobre o pedido de recurso, a Pfizer afirmou apenas recorreu da classificação por entender ter havido inconsistência na proposta vencedora da licitação para compra de vacinas. Em nota, a farmacêutica ressaltou que aguarda o resultado do processo e o compromisso de atender a demanda pelas doses prontamente, caso a decisão seja favorável ao recurso. A Pfizer também pontuou a intenção de continuar apoiando as ações de combate à covid-19 no Brasil.
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Jornalista formado pela Universidade Federal do Pampa (Unipampa). Gaúcho de Caibaté, no interior do Rio Grande do Sul. Mestrando em Comunicação na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Escreve sobre temas ligados a questões socioambientais, educação e acessibilidade.