Diário da Covid-19: Brasil atinge 400 mil mortes em 2021

No Rio de Janeiro, idosos com mais de 70 anos recebem a dose de reforço da vacina contra a covid-19. O Brasil está prestes a alcançar 600 mil mortos pela doença (Foto: Fabio Teixeira / Anadolu Agency / AFP. Setembro/2021)

Número representa mais do que o dobro de 2020, mas tendência agora é de estabilidade

Por José Eustáquio Diniz Alves | ODS 3 • Publicada em 26 de setembro de 2021 - 08:48 • Atualizada em 5 de outubro de 2021 - 09:14

No Rio de Janeiro, idosos com mais de 70 anos recebem a dose de reforço da vacina contra a covid-19. O Brasil está prestes a alcançar 600 mil mortos pela doença (Foto: Fabio Teixeira / Anadolu Agency / AFP. Setembro/2021)

O Brasil deverá atingir 400 mil vidas perdidas para a covid-19 no período compreendido entre 01 de janeiro a 28 de setembro de 2021, representado mais do dobro dos óbitos do ano passado. Em 2020, foram registradas 194.949 vítimas fatais do novo coronavírus. No total da pandemia, o país se aproxima de 600 mil óbitos, marca que deve ser atingida na primeira quinzena de outubro. São números muito elevados, fazendo do Brasil, com 2,8 mil mortes por milhão de habitantes, o sétimo país com maior coeficiente de mortalidade do mundo.

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Segundo o Portal da Transparência do Registro Civil, o Brasil teve 1,27 milhão de óbitos no conjunto das mortes registradas em 2019 (antes da pandemia) e 1,35 milhão de óbitos em 2021, somente até o dia 24 de setembro, conforme mostra o gráfico abaixo. Provavelmente, o Brasil chegará próximo de 1,8 milhão de total de óbitos até 31/12 de 2021, o número mais alto em toda a história brasileira.

Os 3 países com maior mortalidade da covid-19 são, na ordem, Estados Unidos, Brasil e Índia. Porém, contando apenas o ano de 2021, entre todas as nações da comunidade internacional, o Brasil é o país com maior número de mortes provocadas pelo SARS-CoV-2, conforme mostra o gráfico abaixo. O Brasil registrou o montante de 399,3 mil óbitos até o dia 25 de setembro. Os EUA, que tinham sido ultrapassados pela Índia, voltaram a ocupar o segundo lugar e já se aproximam do Brasil em montante de óbitos em 2021, com 336 mil óbitos. A Índia, em terceiro lugar, acumulou 297 mil vítimas fatais nos primeiros 268 dias de 2021. Para se ter a dimensão do drama provocado pela pandemia, de 01/01/2021 a 25/09/2021, o Brasil registrou 1,04 morte por minuto; os EUA, 0,9 morte por minuto, e a Índia, 0,8 morte por minuto.

Mas nem tudo são notícias ruins, pois, atualmente, as variações diárias no Brasil são bem menores do que no pico da 2ª onda. Em meados de abril de 2021 a média móvel de infectados estava acima de 75 mil casos diários e a média de mortes estava acima de 3 mil óbitos. Porém, na segunda quinzena de setembro, as médias de casos ficaram próximas a 15 mil (cerca de um quinto) e as médias de mortes ficaram pouco acima de 500 óbitos diários (quase um sexto).

Panorama nacional de casos e mortes por covid-19

No dia 13/09, o Brasil tinha média de infectados de 15,2 mil casos e média de mortalidade de 465 óbitos. Mas, no dia 18/09, o Ministério da Saúde fez um ajuste no sistema de registro de casos, incorporando eventos anteriores que foram reclassificados. Desta maneira, a média diária de infectados saltou para 34,5 mil e a média de mortes foi para 564 óbitos diários. Mas, em seguida, a média de casos voltou a cair e a média de mortes ficou estável durante a 38ª semana epidemiológica (19-25/09).

No dia 25 de setembro, o Ministério da Saúde informou que o país chegou a 21.343.304 pessoas infectadas e 594.200 vidas perdidas, com uma taxa de letalidade de 2,8%. Foram 15.688 novos casos e 537 mortes nas últimas 24 horas.  A média móvel de casos e de mortes vem caindo nos últimos meses, embora tenha ficado acima das médias de 14 dias atrás.

O gráfico abaixo mostra as variações absolutas diárias do número de casos no território nacional entre 29/02 de 2020 e 25/09 de 2021 e a média móvel de 7 dias. Nota-se que o número de pessoas infectadas cresceu continuamente no Brasil, desde o final de fevereiro, até o primeiro pico da curva epidemiológica com média de 46,4 mil casos em 29 de julho. Após o cume, a média móvel iniciou uma trajetória de queda e, apesar de algumas oscilações, caiu para 16,6 mil casos em 06/11 de 2020. Contudo, o número de casos voltou a subir no restante do mês e atingiu o pico em março de 2021, com média móvel acima de 75 mil casos diários (o maior valor da série).

A média caiu para menos de 60 mil em maio e voltou a subir para a casa dos 70 mil casos diários em junho. Felizmente, o número de casos diminuiu e, apesar dos 150 mil infectados registrados no dia 18 de setembro, a média atual é menor do que o valor alcançado em novembro de 2020. A média móvel de casos do dia 25/09 é semelhante à de 14 dias atrás, indicando estabilidade no número de casos.

O gráfico abaixo mostra as variações absolutas diárias do número de óbitos no território nacional entre 14/03/2020 e 25/09/2021 e a média móvel de 7 dias. Nota-se que o número de vidas perdidas cresceu rapidamente desde o primeiro óbito em meados de março até o final de maio de 2020 quando ficou acima de 1 mil vítimas fatais diárias e se manteve neste patamar elevado até o pico de 1.061 óbitos no final de julho. Entre agosto e outubro a média caiu para um patamar abaixo de 400 óbitos diários, mas subiu no mês de novembro e chegou no pico de cerca de 3 mil mortes diárias em abril.

A média móvel de 7 dias caiu para abaixo de 1,8 mil óbitos no final de maio, mas voltou subir para a casa de 2 mil óbitos diários na primeira quinzena de junho. Nos últimos 3 meses a média de óbitos caiu significativamente e se aproximou dos números de novembro de 2020. Porém, nas duas últimas semanas, a média de óbitos está 16% mais alta.

Gráfico com número diário de mortes por covid-19 no Brasil

O panorama global

O mundo chegou a 232 milhões de pessoas infectadas e ultrapassou 4,7 milhões de vidas perdidas para a covid-19, com uma taxa de letalidade de 2%, no dia 25 de setembro, segundo o site Our World in Data, com dados da Universidade Johns Hopkins. As médias móveis estão em torno de 500 mil casos e 8,4 mil óbitos. Já são mais de 200 países e territórios com mais de 1 mil casos da covid-19, 35 países com mais de 1 milhão de casos e 13 países com mais de 100 mil óbitos acumulados.

Nos meses de janeiro e fevereiro de 2020 a pandemia apresentava números muito baixos e estava, fundamentalmente, restrita à Ásia. Mas no mês de março a propagação do SARS-CoV-2 atingiu fortemente a Europa e os Estados Unidos. Houve uma desaceleração na segunda metade de abril, conforme mostra o gráfico abaixo. O número de casos voltou a crescer continuamente a partir de maio, deu uma nova desacelerada no final do ano e teve um pico com média por volta de 700 mil casos em janeiro de 2021.

Em seguida, a média caiu até algo em torno de 400 mil casos em final de fevereiro e deu um novo salto para o pico de toda a série no final de abril com média acima de 800 mil casos. Nos meses de maio e junho os números cairiam, ficando abaixo de 400 mil casos diários. Mas a propagação da doença voltou a aumentar e a média chegou a 650 mil casos na segunda quinzena de agosto. Mas, felizmente, caiu em setembro, embora ainda apresente cerca de meio milhão de casos na média da última semana (19-25/09).

O gráfico abaixo mostra o número diário de óbitos no mundo e a média móvel de 7 dias. A primeira subida do número de mortes aconteceu em março de 2020 e o pico da média móvel ocorreu em meados de abril com cerca de 7 mil vidas perdidas por dia. A partir deste pico, o número diário de vítimas fatais caiu até o final de maio e voltou a crescer e a oscilar entre 4 mil e 6 mil mortes diárias. Todavia, a 2ª onda ocorrida na Europa e na América do Norte fez o mundo alcançar novos recordes de mortes no final do ano passado. Novo pico foi alcançado em janeiro de 2021 e a média móvel ultrapassou 14 mil mortes diárias.

Os números caíram em fevereiro, mas voltaram a subir com o surto da Índia, chegando a 13 mil mortes diárias no início de maio. A curva de mortalidade voltou a cair entre maio e julho, mas reverteu a tendência e a média móvel de mortes voltou para o patamar próximo de 10 mil óbitos diários no final de agosto. Em setembro os números caíram para a casa de 8 mil vidas perdidas diariamente.

Gráfico com número diário de mortes por covid-19 no mundo

Contabilizando os registros desde o início da pandemia, o Brasil é o segundo país com o maior número de vítimas fatais para o SARS-CoV-2 e o sétimo país em coeficiente de mortalidade (atrás apenas de Peru, Bósnia e Herzegovina, Macedônia do Norte, Hungria, Bulgária e República Tcheca).

Muitos países fracassaram no combate à covid-19. Mas alguns países conseguiram controlar a propagação comunitária do vírus. Por exemplo, enquanto o coeficiente de mortalidade do Brasil é de 2.800 mortes por milhão, a China tem um coeficiente de apenas 3,3 mortes por milhão de habitantes e a Nova Zelândia tem um coeficiente de somente 5,5 mortes por milhão de habitantes. Se o Brasil tivesse o mesmo coeficiente de mortalidade da China teria no total apenas 705 óbitos acumulados e com o mesmo coeficiente da Nova Zelândia teria somente 1.172 óbitos acumulados (e não 594 mil óbitos).

Não é só a morte que iguala a gente. O crime, a doença e a loucura também acabam com as diferenças que a gente inventa

Lastimavelmente, o Brasil não fez uma barreira sanitária para evitar a difusão do vírus no território nacional e nem tomou as medidas de prevenção adequadas para proteger a população da propagação da doença. O negacionismo e as políticas contra a ciência criaram um fosso entre o poder público e a sociedade civil. E o pior é que o governo brasileiro errou no início da pandemia e se recusa a aprender com os fatos. O presidente Jair Bolsonaro discursou na abertura da 76ª edição da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), no último dia 21 de setembro, fazendo a defesa de tratamentos precoces não recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e ainda criticou a imunização obrigatoria, além de ter se destacado como o único líder político do G20 a ter se recusado a tomar a vacina.

Ao mesmo tempo, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid que levantou evidências de corrupção na compra de vacinas pelo Ministério da Saúde, ainda investigou uma série de documentos e ouviu o depoimento de Pedro Benedito Batista Júnior, diretor-executivo do plano de saúde Prevent Senior, mostrando fortes indícios de que a operadora está diretamente ligada ao gabinete paralelo que dificultou a aplicação de políticas públicas efetivas de controle da doença. A Prevent Senior que também é responsável por propagar remédios ineficazes e realizar um estudo observacional sobre o tratamento precoce (cloroquina, azitromicina, ivermectina) em 636 pacientes, tem sido acusada de adulteração de prontuários e ocultação de mortes da covid-19.

Como se vê, são diversos os motivos que colocaram o Brasil no topo dos países mais atingidos pela pandemia. O negacionismo e a difusão de mensagens falsas dificultaram as ações unitárias das autoridades de saúde, dividiram a sociedade em campos antagônicos e permitiram que o vírus se espalhasse pelos quatro cantos das fronteiras nacionais. A consequência são os mais de 21 milhões de brasileiros infetados (10% da população) e as quase 400 mil mortes em 2021 e as quase 600 mil mortes desde o início da pandemia. O povo brasileiro não merecia tanto sofrimento e tanta imperícia por parte de um governo cada vez mais impopular e cada vez mais distante do bem comum e da construção de um futuro saudável para a população nacional.

Frase do dia 26 de setembro de 2021

“Não é só a morte que iguala a gente. O crime, a doença e a loucura também acabam com as diferenças que a gente inventa”

Lima Barreto (1881-1922)

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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