Indígenas colombianos: longo caminho para livrar Amazônia dos combustíveis fósseis

Na COP30, governo da Colômbia anunciou a intenção de fazer da Amazônia uma zona livre de petróleo; indígenas citam desafios para isso se concretizar

Por Micael Olegário | ODS 16
Publicada em 20 de novembro de 2025 - 09:49  -  Atualizada em 20 de novembro de 2025 - 15:04
Tempo de leitura: 8 min

Barcos no Rio Putumayo: transporte fluvial já foi interrompido por grupos armados, isolando comunidades indígenas e ribeirinhas (Foto: Juan Carlos Contreras / InfoAmazonia)

(Belém, Pará) – Para diferentes povos indígenas da América Latina, a crise climática representa uma ameaça ao bem-viver e à relação ancestral com a natureza. “Coloca em risco nossa vida e nosso sustento, porque precisamos da natureza para viver. Apenas 1°C em que a temperatura sobe já significa muita devastação na floresta”, alerta Pablo Hernan Jamioy Juajiboy, líder do povo Kamentsa.

Pablo compõe a delegação da Organização dos Povos Indígenas da Amazônia Colombiana (OPIAC) na COP30, em Belém. Uma das grandes bandeiras da organização é justamente a luta contra os combustíveis fósseis. “A indústria petrolífera é muito forte na Colômbia, principalmente, porque os investidores são estrangeiros – são empresas multinacionais”, afirma o indígena colombiano. 

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O depoimento faz referência ao anúncio feito pela ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Irene Vélez, de que o país será o primeiro a reconhecer a Amazônia como zona livre de petróleo. A declaração repercutiu na imprensa internacional, porém, sem que fossem mencionados os diversos desafios desse processo, principalmente, pelas economias ilícitas que dominam regiões e por reflexos profundos da exploração petroleira nos territórios.

Arte colorida do banner da COP30

Em painel no estande do governo colombiano nesta terça-feira (18/11), Pablo cobrou diretamente à ministra que seja respeitada a consulta livre e esclarecida aos mais de 100 povos indígenas da Amazônia colombiana. Como resposta, Irene disse que esse trabalho já começou e conta com duas frentes: uma técnica e outra política, sendo esta a que envolve o diálogo com os povos.

Na avaliação do representante da OPIAC, a intenção do governo colombiano é extremamente positiva e atende uma reivindicação histórica dos povos. “É uma oportunidade muito boa, mas precisamos fazer uma consulta para que isso seja juridicamente protegido”, reforçou Pablo. Ele citou, por exemplo, a preocupação com a reação da extrema-direita do país, ligada à indústria de fósseis.

Montagem colorida com duas fotos. Na esquerda, aparece Pablo Hernan Jamioy Juajiboy. Um indígena colombiano de cabelos pretos e na altura do ombro que usa uma camiseta preta e colares tradicionais. Na direita, María Pastora Juajiboy Chindo, uma indígena de cabelos pretos enrolados. Ela usa uma camisa branca, com detalhes em vermelho
Pablo, esquerda, e María Pastora, direita, denunciam danos socioambientais causados pela indústria fóssil em Putumayo (Foto: Micael Olegário)

Impactos no território

Pablo vive no departamento de Putumayo, localizado no sul da Colômbia, em uma zona de fronteira com o Peru e o Equador. Em 2024, a seca histórica que afetou a Amazônia também trouxe impactos ao território que abriga diversas comunidades indígenas que coexistem com o Rio Putumayo, curso de água que cruza os três países andinos e também o Brasil.

Dados divulgados nesta quarta-feira (19/11) pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) revelam a expansão da mineração, garimpo e exploração de petróleo e gás na Bacia Amazônica. O levantamento aponta * 113.975 processos minerários ativos e 2.527 Terras Indígenas com incidência de mineração, além de 577 blocos de petróleo e gás sobrepostos aos territórios. As minas de ouro são as mais frequentes e a situação é mais grave na Venezuela, Brasil, Peru, Guiana e Colômbia, com um quadro descrito como avanço crítico.

Um outro ponto de preocupação na região são as ameaças causadas por grupos armados que atuam no território, parte vinculada à indústria fóssil. Nesses locais, a exploração socioeconômica se espalha diante da ausência estatal, inclusive, com o aliciamento de populações indígenas e o aumento de conflitos.

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“O que vemos como alternativa é que fortalecer os governos indígenas, precisamos fortalecer suas próprias economias para que nossas futuras gerações tenham direitos básicos garantidos, mas também meios alternativos de geração de renda para suprir suas necessidades”, comenta Pablo.

María Pastora Juajiboy Chindoy também observa os reflexos da mineração e da indústria fóssil na sua comunidade, em Putumayo. “Eles despejam todo o petróleo nos Rios, então, enquanto se caminha ao longo de um deles, você que está contaminado com petróleo ou que um oleoduto explodiu e todo o vazamento afetou a biodiversidade e a nossa identidade como povos indígenas”, relata.

Para os indígenas colombianos, o modelo de “desenvolvimento” baseado na exploração do petróleo representa mais devastação para a mãe terra e violações à autonomia das comunidades. “Nós apoiamos o abandono do uso de combustíveis fósseis, mas – como povos indígenas – sempre dizemos que para enfrentar a crise climática é importante falar a partir do território, porque para nós, tudo está interligado”, destaca María Pastora.

Foto colorida de Ruth Luque, com vestido branco e laranja e segurando o microfone, ao lado da ministra Irene Vélez. Ambas são mulheres brancas de cabelos pretos
Ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Irene Vélez, e parlamentar peruana Ruth Luque; mesa discutiu desafios de preservar a Amazônia (Foto: Micael Olegário)

Crise política e climática no Peru

Também presente no painel, a parlamentar peruana Ruth Luque Ibarra também denuncia o avanço de economias ilícitas na Amazônia. “Não podemos falar de ação climática sem falar dessas economias ilegais que estão avançando, porque elas estão saqueando a Amazônia”, afirmou.

Diferente da Colômbia, em que o governo demonstra a intenção de reduzir a presença de combustíveis fósseis no bioma, o Peru passa por uma crise institucional que aumenta a vulnerabilidade da natureza e dos povos indígenas da região. Nos últimos dez anos, foram oito presidentes diferentes.

Para Ruth, trata-se de uma disputa por poder e de modelo de compreensão do que a Amazônia representa. “Diante da insegurança das democracias em geral, as respostas mais fáceis que esses discursos encontraram são os radicalismos – da pena de morte e da absolvição judicial, e do negacionismo na questão climática”, alerta a parlamentar.

Ruth menciona ainda as perseguições aos povos indígenas peruanos que – assim como no Brasil e outros países latino-americanos – são os principais responsáveis pela preservação dos territórios. “Precisamos de mais diálogo político transfronteiriço. Acho importante que os países que compartilham a Amazônia não apenas compartilhem a vontade e a luta contra as economias ilegais de frente, mas que isso também se reflita em estruturas legais robustas”, complementa.

Micael Olegário

Jornalista formado pela Universidade Federal do Pampa (Unipampa). Gaúcho de Caibaté, no interior do Rio Grande do Sul. Mestrando em Comunicação na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Escreve sobre temas ligados a questões socioambientais, educação e acessibilidade.

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