Economia da floresta em pé pode elevar o PIB da Amazônia em 67%

Estudo feito por 76 pesquisadores prevê ainda a geração e 833 mil novos empregos no setor de bioeconomia a partir de 2050

Por Agostinho Vieira | ODS 15 • Publicada em 23 de junho de 2023 - 12:33 • Atualizada em 22 de novembro de 2023 - 18:54

Um homem colhe açaí na reserva de Ituxi, perto da aldeia de Volta do Bucho na região da Amazônia Ocidental. Economia da Floresta em Pé pode elevar o PIB da região em quase 70%. Foto Carl de Souza/AFP

Durante quase três anos, 76 pesquisadores de diferentes universidades e instituições científicas de todo o país se reuniram regularmente para desenhar o que poderia ser uma Nova Economia da Amazônia, tendo como premissas a manutenção da floresta de pé, a valorização da biodiversidade, a inovação, o respeito ao conhecimento dos povos originários e a descarbonização da economia brasileira. O resultado não chega a ser surpreendente, mas é bem curioso. Em resumo, eles concluem que dinheiro pode sim dar em árvore, e não é pouco. A estimativa chega a uma elevação do PIB da Amazônia em 67%, chegando a R$ 38,5 bilhões anuais a partir de 2050, com crescimento em todos os setores econômicos da região, incluindo a agropecuária e a mineração.

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As principais conclusões do estudo, que foi desenvolvido pelo WRI Brasil, foram apresentadas na terça-feira, 20 de junho, em um evento em Belém, no Pará, com a participação de representantes das universidades envolvidas, organizações não governamentais e autoridades. Para o professor Carlos Nobre, pesquisador da USP, membro da Royal Society, de Londres, e uma das lideranças do projeto, os modelos desenhados ao longo do trabalho “abrem uma real possibilidade para a criação de uma nova bioeconomia da Amazônia, absolutamente sustentável e com uma grande melhoria nas condições sociais da população da região”.

Os estudos feitos promoveram, de forma inédita, a compatibilização e a interação de modelos econômicos desenvolvidos por grupos de pesquisa de diferentes partes do país para compor uma análise compreensiva sobre a economia atual da Amazônia Legal e traçar diferentes cenários para 2050. Para os autores, a Nova Economia da Amazônia é um futuro possível e comprovado por uma análise científica sólida e inovadora.

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Além dos ganhos sociais e econômicos, o trabalho prevê benefícios ambientais muito relevantes, como a garantia de um desmatamento zero até 2030 e a restauração de 24 milhões de hectares de florestas. Maior produtividade da terra, menor suscetibilidade ao estresse hídrico e menos perda de fertilidade do solo.

Hoje, o modelo de desenvolvimento econômico da Amazônia Legal é completamente insustentável. A atual lógica se caracteriza pela venda de commodities agrícolas e minerais, que geram mais desmatamento e emissões de gases de efeito estufa. Além de todos os impactos, essas atividades não promovem um crescimento econômico relevante e acabam acentuando a desigualdade social existente. A informalidade do trabalho na região é alta, a qualificação profissional é baixa e os salários ficam aquém das médias nacionais. Ou seja, muita exploração e pouco ganho concreto.

O custo dessa transição para a Nova Economia da Amazônia seria de R$ 2,56 trilhões até 2050, ou 1,8% do PIB do país ao ano. Apenas 0,8% superior ao nível de investimento atual. Esse montante seria investido da seguinte maneira: R$ 659 bilhões no uso estratégico do solo, R$ 410 bilhões na mudança da matriz energética da região e R$ 1,49 trilhão em infraestrutura. Com isso, a Amazônia seria a grande catalisadora da descarbonização da economia brasileira. Conheça as principais mudanças previstas pelos pesquisadores:

Bioeconomia:

A principal mudança nessa área seria garantia de manutenção da floresta em pé e dos rios fluindo, respeitando a capacidade do bioma. O estudo mostra que, hoje, a bioeconomia já representa um PIB de R$ 12 bilhões na região. Com os investimentos adicionais, ele chegaria a R$ 38,5 bilhões em 2050, gerando 833 mil novos empregos, que substituiriam ocupação ligadas à destruição da floresta.

Agropecuária:

Esse setor deve ser livre de desmatamento e degradação florestal para garantir a sua relevância até 2050. Essa transição demandaria investimentos adicionais de R$ 442 bilhões, focados em massificação das práticas de baixa emissão de carbono e intensificação produtiva exclusivamente em áreas já degradadas, com um combate efetivo à desigualdade rural. Os serviços ambientais da floresta saudável gerariam maior produtividade da terra, menor estresse hídrico e menor perda de fertilidade do solo.

Mineração:

Os bens minerais são indispensáveis na transição energética global e na construção da infraestrutura para uma economia de baixo carbono. Entretanto, custos e benefícios da mineração devem ser internalizados e mais bem distribuídos.  A transição no setor precisa ir além das práticas de governança ambiental, social e corporativa (ESG) e ter como prioridade o bem-estar e a segurança das populações e dos recursos naturais essenciais para seus modos de vida. Isso se traduz em investimentos diretos para promoção de qualidade ambiental, bioeconomia e sistemas produtivos regenerativos compatíveis com os anseios locais.

Infraestrutura:

Com a transição para uma economia de baixo carbono, a demanda energética da região será menor, e a matriz energética passará por mudanças significativas a partir de fontes limpas. As principais soluções seriam a implementação de sistemas fotovoltaicos flutuantes sobre represas hidrelétricas já existentes e, também, sobre pastagens degradadas. Tais iniciativas serão capazes de gerar 55% da energia demandada pela região até 2050. Além disso, a queima de resíduos agrícolas, urbanos e da bioeconomia, como os coquilhos de açaí, seria capaz de gerar energia suficiente para substituir o equivalente a 359 milhões de litros de diesel, o que diminuiria as emissões de CO2 em cerca de 1,5 milhão de toneladas. O transporte hidroviário com motores híbridos (elétrico + combustão), favorecido pela extensa rede fluvial, absorveria 20% do atual transporte rodoviário de cargas.

Agostinho Vieira

Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.

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