Justiça manda soltar brigadistas de Alter do Chão

Mais cedo advogados entraram com pedido de Habeas Corpus com base na fragilidade do inquérito policial

Por Marizilda Cruppe | ODS 15 • Publicada em 28 de novembro de 2019 - 18:25 • Atualizada em 29 de novembro de 2019 - 13:47

Os quadro brigadistas deixam a Penitenciária Agrícola Silvio Hall de Moura, em Santarém. Foto Marizilda Cruppe
Os quadro brigadistas João, Daniel, Marcelo e Gustavo deixam a Penitenciária Agrícola Silvio Hall de Moura, em Santarém. Foto Marizilda Cruppe
Os quadro brigadistas João, Daniel, Marcelo e Gustavo deixam a Penitenciária Agrícola Silvio Hall de Moura, em Santarém. Foto Marizilda Cruppe

(Santarém, PA) – O juiz titular da 1ª Vara Criminal de Santarém, Alexandre Rizzi, determinou na tarde desta quinta-feira (28) a liberação dos quatro brigadistas que foram presos preventivamente em uma investigação sobre incêndios na Área de Proteção Ambiental (APA) Alter do Chão, em Santarém. Aos gritos de “Amazônia Viva” e “Viva o Aquífero Alter do Chão” eles foram recebidos na saída da Penitenciária Agrícola Sílvio Hall de Mouro por amigos e familiares. Mais cedo, os advogados de defesa dos acusados entraram com um pedido de Habeas Corpus com base na fragilidade do inquérito policial e das provas, e, também, no perfil dos brigadistas que são réus primários, têm endereço fixo, emprego e renda comprovados. O fato de eles terem bons antecedentes e estarem colaborando voluntariamente com as investigações policiais também ajudou na argumentação. Daniel, João, Marcelo e Gustavo alegam ter álibis que comprovariam que eles não estavam APA Alter do Chão quando o fogo começou, conforme o #Colabora noticiou ontem.

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No início da tarde, em sua conta no Twitter, o governador do Pará, Helder Barbalho, anunciou a troca no comando das investigações, que agora serão conduzidas pelo Diretor da Delegacia Especializada em Meio Ambiente, Waldir Freire. Barbalho disse que a preocupação com a preservação da floresta não poderia atrapalhar o amplo direito de defesa dos acusados.

Os brigadistas estão presos a pedido dos delegados Fábio Amaral Barbosa (Delegacia de Conflitos Agrários) e Silvio Birro Duarty Neto (Núcleo de Apoio à Investigação – NAI). Eles são acusados no inquérito policial – ainda não concluído – de terem infringido o artigo 40 da Lei 9.605/98 que prevê pena de 1 a 5 anos de reclusão por “causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de que trata o art. 27 do Decreto nº 99.274 de 06 de junho de 1990, independentemente de sua localização”, e o artigo 288 do Código Penal que prevê pena de 1 a 3 anos por “associação criminosa”.

Ontem, o Ministério Público Federal pediu acesso ao inquérito da polícia civil do Pará. Os procuradores estranharam as prisões dos representantes das ONGs e disseram que, desde 2015, investigações federais “apontam para o assédio de grileiros, ocupação desordenada e para a especulação imobiliária como causas da degradação ambiental em Alter do Chão”.

De acordo com o site The Intercept Brasil, as investigações realizadas pela Polícia Federal desde o final de agosto para descobrir os responsáveis pelo “Dia do Fogo” na Amazônia não indicavam a participação de nenhuma organização não-governamental entre os suspeitos. Nem a Brigada de Incêndio de Alter do Chão nem a ONG Saúde e Alegria são investigadas ou consideradas suspeitas pela PF.

O Juiz de Direito Titular da 1ª Vara Criminal, Alexandre Rizzi, tomou a decisão após analisar informações de diligências da polícia. Foto Marizilda Cruppe

Michell Durans, advogado de dois dos brigadistas, considera desproporcional a prisão preventiva em comparação com as penas dos crimes pelos quais são acusados. Durans espera que com os Habeas Corpus “possam cessar o constrangimento ilegal e assim restabelecer a liberdade dos brigadistas, que a bem da verdade são quem verdadeiramente têm protegido a natureza e a comunidade de Alter do Chão das queimadas.”

José Ronaldo Dias Campos, advogado de outros dois brigadistas e da organização Projeto Saúde e Alegria diz que a prisão preventiva se baseou “única e exclusivamente em conversas telefônicas interceptadas e transcritas pela autoridade policial que colocou no inquérito trechos descontextualizados e com uma interpretação de caráter pessoal. Ainda que as conversas tenham ocorrido dessa maneira não há nenhum trecho sequer que prove minimamente que os brigadistas tenham sido os responsáveis pelo incêndio.”

O incêndio aconteceu em um momento em que Alter do Chão passava por uma fase especial, com um movimento crescente de turistas. Foto Emi Okada Pereira

Os advogados também argumentaram no pedido de Habeas Corpus que as transcrições dos áudios não foram feitas por um profissional capacitado, pois há erros grosseiros como confundir roça com rota. Um dos brigadistas fala “Quando vocês chegarem vai ter bastante fogo, se preparem. Nas rotas, nas rotas inclusive”. “No áudio ouve-se claramente roça e foi transcrito como rota” destaca o Dr Dias Campos.

Por mais de uma vez os delegados responsáveis pelo inquérito policial citaram em entrevistas a existência de um vídeo que mostraria o momento em que os brigadistas teriam iniciado o incêndio. Este vídeo, no entanto, além de não ter sido divulgado para a imprensa não é mencionado no inquérito policial que tem cerca de 200 páginas.

Marizilda Cruppe

​Marizilda Cruppe tentou ser engenheira, piloto de avião e se encontrou mesmo no fotojornalismo. Trabalhou no Jornal O Globo um bom tempo até se tornar fotógrafa independente. Gosta de contar histórias sobre direitos humanos, gênero, desigualdade social, saúde e meio-ambiente. Fotografa para organizações humanitárias e ambientais. Em 2016 deu a partida na criação da YVY Mulheres da Imagem, uma iniciativa que envolve mulheres de todas as regiões do Brasil. Era nômade desde 2015 e agora faz quarentena no oeste do Pará e respeita o distanciamento social.

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