Pantanal teve a pior seca em 50 anos, aponta estudo

Quatis buscam água em leito seco de rio no Pantanal; estudo mostra que bioma teve pior seca em 50 anos (Foto: Ernesto Carriço/NurPhoto/AFP – 30/09/2020)

Cientistas alertam para fim do bioma “como o conhecemos” em cenário de mudança climática e desmatamento sem controle

Por Observatório do Clima | ODS 13ODS 15 • Publicada em 17 de fevereiro de 2021 - 09:17 • Atualizada em 18 de fevereiro de 2021 - 19:45

Quatis buscam água em leito seco de rio no Pantanal; estudo mostra que bioma teve pior seca em 50 anos (Foto: Ernesto Carriço/NurPhoto/AFP – 30/09/2020)

*Claudio Angelo

A seca que castigou o Pantanal entre 2019 e 2020 e armou o cenário para a pior temporada de queimadas da história do bioma foi a mais grave em 50 anos. E o mês de abril do ano passado foi o mais seco desde que as medições começaram no local, há 120 anos. A constatação é de um estudo inédito liderado pelo Cemaden (Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) e pela Unesp, que será publicado na revista Frontiers in Water.

Os pesquisadores José Antonio Marengo, Ana Paula Cunha e seus colegas fizeram um raio-X climatológico da seca, analisando índices de precipitação e nível dos rios. Descobriram que o nível do rio Paraguai foi o mais baixo desde 1971 e a região como um todo recebeu entre 50% e 60% menos chuva do que o normal. Um dos índices de precipitação analisados foi o mais baixo da história.

Se as tendências climáticas e de manejo da terra atuais persistirem, o Pantanal como o conhecemos deixará de existir

A seca anormal tornou a região pantaneira excepcionalmente sensível a queimadas possivelmente feitas por produtores rurais para abrir novas áreas de pastagem, segundo investigação da Polícia Federal. No ano passado, esses fogos saíram do controle e 30% do Pantanal ardeu em chamas. Mais de 22 mil focos de incêndio foram detectados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – um número 76% maior do que em 2005, ano até então recordista na série histórica iniciada em 1988.

Segundo Marengo, é possível atribuir a seca em parte ao aquecimento anormal do Atlântico tropical, que impediu que os chamados “rios voadores” – a umidade reciclada pela Amazônia que é exportada para o sul da América do Sul – irrigassem as bacias do Paraguai e do rio da Prata. O mesmo fenômeno está por trás da temporada de furacões de 2020 no Caribe, uma das mais ativas em registro, e da seca que fez o norte da Argentina ter uma das piores temporadas de incêndios de sua história.

Um bloqueio atmosférico – uma área de pressão do ar muito alta sobre o Pantanal, que repeliu a entrada da umidade – se formou. “Nem a umidade da Amazônia pelo norte nem as frentes frias do Sul conseguiram chegar, e essa estabilidade sobre a região foi favorecida por um Atlântico subtropical Sul mais quente que o normal”, afirmou. Marengo disse ainda que não é possível cravar a impressão digital da mudança climática nesse extremo, “mas também não posso dizer que não é”.

Uma coisa, porém, os cientistas afirmam: não fossem as mudanças intensas de uso da terra no Pantanal nas últimas décadas, a seca dificilmente teria provocado incêndios como os de 2020. “Se as tendências climáticas e de manejo da terra atuais persistirem, o Pantanal como o conhecemos deixará de existir”, apontam autores do estudo.

*Observatório do Clima

Observatório do Clima

O Observatório do Clima é uma rede que reúne entidades da sociedade civil para discutir a questão das mudanças climáticas no contexto brasileiro.

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