ODS 1
Em busca de plantar um trilhão de árvores
Pesquisadores acreditam que novas florestas iriam compensar grande parte de nossas emissões de CO2 cumulativas
Foi notícia no mundo todo a iniciativa da Etiópia de plantar 350 milhões de árvores em um dia, no final de julho. Não é para menos. O gesto tem simbologia em um mundo ameaçado pela mudança do clima, necessitado de iniciativas como esta em nível global, como freio do aquecimento e para evitar catástrofes trazidas por ela. O impacto local é também significativo para um país que tinha uma cobertura florestal de 35% de seu território no começo do século passado, e hoje tem apenas 4%. O objetivo do país é o plantio de 4 bilhões de plantas nativas.
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Veja o que já enviamosO que isso realmente significa para o planeta? Pouco. Tom Crowther, ecologista da Universidade de Zurich (ETH), descobriu que existem cerca de 3 trilhões de árvores na Terra, bem melhor do que a estimativa da Nasa, de 400 bilhões. Sobra absorção de dióxido de carbono, principal causador do aquecimento.
Como a pesquisa de Crowther ainda está sendo revisada para publicação, não se pode divulgar números exatos sobre o quanto de CO2 a mais poderia ser armazenado nas árvores. Mas ele aponta para os dados do Projeto Drawdown, uma ONG que faz rankings de soluções para o clima. Segundo ela, a redução de gases HFC de geladeiras e ar condicionado pode diminuir o CO2 atmosférico em 90 bilhões de toneladas. De acordo com o cientista, o plantio de 1.2 trilhão de árvores provocaria uma redução “muito acima” deste número. Para colocar as coisas em contexto, as emissões globais de CO2 são de 37 bilhões de toneladas por ano.
Pode haver espaço para tantas árvores. Mas é viável plantá-las? A organização Plants for the Planet, que tem a iniciativa Trillion Tree, acredita que sim. Ela já plantou 15 bilhões delas, com a ajuda de diversos governos, como no caso da Índia, que entrou na estimativa com 2 bilhões. “Acho possível”, diz Sagar Aryal, seu presidente. “Não é que não tenhamos dinheiro bastante. Talvez governos sozinhos não consigam, mas, se trabalharmos com a iniciativa privada, pode ser sim”.
A equipe da ETH combinou o software de zoneamento Google Earth com uma base de dados de cerca de 80 mil florestas existentes para criar um modelo de previsão ótima de locais de plantio. No total, o plantio poderia ocupar 0.9 bilhão de hectares de floresta nova e contínua. Uma vez maduras, as novas árvores seriam capazes de armazenar cerca de dois terços do carbono que emitimos desde o início da revolução industrial.
Outros pesquisadores notaram que o estudo pode sobrestimar a eficiência das árvores na retenção de carbono, ou subestimar quanto os humanos emitiram no correr do tempo. Mas todos parecem concordar que as novas florestas iriam compensar grande parte de nossas emissões de CO2 cumulativas – ainda um feito impressionante, à medida que a meta de manter o aquecimento deste século abaixo de 1.5 grau se torna mais difícil de atingir.
A tecnologia pode acelerar o plantio com o uso de drones, que fariam a tarefa do céu. Isto envolve enviar sementes para uma área escolhida. A Droneseed, com máquinas de 20 quilos de peso, planta 800 sementes por hora. Outra startup, a Biocarbon Engineering, utilizou diversas técnicas para plantar 38 espécies de árvores em três continentes. Os drones são especialmente úteis em áreas de difícil acesso.
O uso de drones é um primeiro passo de um longo caminho. Empresas estão utilizando inteligência artificial e imageamento por satélite em muitas técnicas de aumentar a proteção e o entendimento de áreas florestadas.
A 20tree.ai, de Portugal, usa a inteligência artificial para monitorar o estado de florestas inteiras com uma fração do custo do monitoramento manual. A abordagem pode levar à identificação de ameaças como pestes e um melhor conhecimento das áreas já florestadas. Ainda, é possível protegê-las prevendo onde o desflorestamento tem mais possibilidade de acontecer.
Mesmo com estas tecnologias, muitas das áreas identificadas pelo trabalho de ETH não estão imediatamente disponíveis para o plantio. Algumas estão reservadas para pasto, outras são propriedade privada, e ainda outras se localizam em regiões suscetíveis de instabilidade política.
De qualquer forma, nada dará certo se as comunidades vivendo em zonas de reflorestamento não se envolverem nos esforços, e possam ter a recompensa de transformar suas regiões.
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Jornalista com passagens por publicações como Exame, Gazeta Mercantil, Folha de S. Paulo. Criador da revista Bizz e do suplemento Folha Informática. Foi pioneiro ao fazer, para o Jornal da Tarde, em 1976, uma série de reportagens sobre energia limpa. Nos últimos anos vem se dedicando aos temas ligados à sustentabilidade.