ODS 1
Cúpula dos Povos termina com cobrança de participação e protagonismo nas soluções climáticas


Protestos e marcha marcam o maior evento paralelo à COP30: carta com críticas à extrema direita e ao modelo capitalista é entregue ao presidente da Conferência do Clima


(Belém, Pará) – O presidente Lula não participou presencialmente da cerimônia de encerramento da Cúpula dos Povos Rumo à COP30 neste domingo (16/11) em Belém, mas escreveu uma mensagem que foi lida pela ministra Marina Silva, do Meio Ambiente.
Ao afirmar que Conferência do Clima “não seria viável sem a participação de vocês – essa extraordinária concentração de pessoas que acreditam que outro mundo é possível e necessário” fechou com chave de ouro uma semana repleta de protestos, que transformou as ruas de Belém em um levante popular.
Em sua mensagem, Lula reforçou que o combate às mudanças do clima “precisa da mobilização e contribuição de toda a sociedade, e não só dos governos”. O presidente retornará a Belém, nesta quarta (19/11), quando irá se encontrar com Antonio Guterrez, secretário-geral das Nações Unidas.
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Veja o que já enviamosEssa semana começa o período mais crítica da COP, e também o mais político. É quando começam a chegar os ministros para coordenar as articulações finais sobre pontos ainda sem consenso, como, por exemplo, os indicadores da meta global de adaptação e o programa de transição justa. “Não podemos sair de Belém sem decisões sobre a transição energética, o fim do desmatamento e a mobilização de recursos”, discursou Marina, após ler a carta encaminhada por Lula.
Neste domingo (16/11), foi entregue ao presidente da COP30, André Corrêa do Lago, a Carta Política da Cúpula dos Povos, um documento que sintetiza as demandas globais por justiça climática, demarcação de territórios, transição energética justa e participação popular nas decisões da COP30.
Há muito tempo venho alertando sobre aquilo que hoje estamos vivendo. Os rios estão secando, a chuva não vem, o ar está cada vez mais difícil de respirar. Se não tivermos consciência de defender o que resta dessa Terra, haverá um caos muito grande
O documento destaca que o processo da Cúpula dos Povos reuniu mais de 70 mil pessoas: :indígenas, camponeses, quilombolas, extrativistas, marisqueiras, mulheres, comunidade LGBTQIAPN+, jovens, afrodescendentes, pessoas idosas, entre outros movimentos. “Assumimos a tarefa de construir um mundo justo e democrático, com bem viver para todas e todos. Somos a unidade na diversidade”, destaca o texto.


A carta Cúpula dos Povos alerta para a conjuntura geopolítica que agrava a emergência climática. “O avanço da extrema direita, do fascismo e das guerras ao redor do mundo exacerba a crise climática e a exploração da natureza e dos povos”, afirma o documento, criticando ainda a ação dos EUA na América Latina. “O imperialismo segue ameaçando a soberania dos povos, criminalizando movimentos sociais e legitimando intervenções que historicamente serviram aos interesses privados na região”.
A carta lista 15 propostas, entre elas, participação e protagonismo dos povos na construção de soluções climáticas, reconhecendo os saberes ancestrais; demarcação e proteção das terras e territórios indígenas e de outros povos e comunidades locais, combate ao racismo ambiental e a construção de cidades justas e periferias vivas, reparação das perdas e danos impostos aos povos por “projetos de investimento destrutivos”; fim da exploração de combustíveis fósseis; e transição justa, soberana e popular.
O presidente da COP30 garantiu que a mensagem da Cúpula dos Povos será ouvida. “Eu registrarei amanhã (segunda, 17/11), na abertura da reunião de alto nível da COP”, prometeu Corrêa do Lago, que chegou a Universidade Federal do Pará (UFPA) acompanhado da diretora executiva da conferência, Ana Toni.
Foram dois mais de dois anos de construção coletiva, com mais de 1.100 organizações signatárias e representações de todos os continentes. Durante a semana, passaram cerca de 20 mil pessoas por dia no campus da UFPA, além de 23 mil credenciados.


Das ruas à COP30
A Cúpula dos Povos é uma vitória dos movimentos sociais. Originalmente, o governo queria que fosse feita uma COP Social, a exemplo do que propôs no G20 quando criou o G20 Social. Os movimentos sociais não aceitaram, porque queriam construir um processo autônomo e não submetido a tutela governamental. Não só conseguiram fazer o governo desembarcar dessa ideia, como construíram o maior evento paralelo a COP30.
“Os movimentos sociais estão muito antenados. Vai ficar feio sair daqui sem nada nas mãos”, pontuou Mareen Santos, cientista política e representante do Grupo Carta de Belém e da FASE no Comitê Político da Cúpula dos Povos.
O cacique Raoni, símbolo mundial da defesa da floresta e dos povos originários, também esteve presente à cerimônia de encerramento da Cúpula dos Povos: “Se não defendermos o que resta da Terra, haverá um caos muito grande”, disse a liderança indígena nacional e internacional.
Ele à responsabilidade coletiva diante da crise climática. “Há muito tempo venho alertando sobre aquilo que hoje estamos vivendo. Os rios estão secando, a chuva não vem, o ar está cada vez mais difícil de respirar. Se não tivermos consciência de defender o que resta dessa Terra, haverá um caos muito grande”, disse Raoni.
O líder indígena reforçou a necessidade de diálogo com governos e pediu ações imediatas contra o desmatamento, garimpo e exploração ilegal. “Devemos dizer aos que querem destruir que não aceitaremos mais essa atitude. É nossa missão defender a vida da Terra e de todos os seres.”


Também estiveram presentes na cerimônia de encerramento da Cúpula dos Povos um conjunto de ministros. O secretário-geral da Presidência, Guilherme Boulos, anunciou que será realizada consulta pública prévia e informada aos povos do Rio Tapajós sempre que algum projeto de infraestrutura for se instalar na região.
O anúncio foi muito bem-vindo, até porque ele é uma demanda antiga dos territórios atingidos pelos grandes empreendimentos. A decisão do governo, no entanto, nada mais é do que uma obrigação, dado que o governo é signatário da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a consulta está revista no artigo 169. Boulos também anunciou que será criada uma mesa de diálogo para analisar questões levantadas pelos indígenas e comunidades tradicionais durante a COP30.
Duas vitórias resultaram da pressão dos movimentos sociais, especialmente após o bloqueio feito pelo povo Munduruku na último sexta (14/11) na entrada da COP. A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, que também esteve presente, comentou que 900 indígenas estão credenciados na Zona Azul e ressaltou que é a maior participação indígena da história das COPs. Por isso, disse: “Nós não queremos só paridade, queremos ser a maior voz nos espaços de decisão”, destacou.
A ministra Marina Silva também aproveitou o espaço para celebrar a democracia, reforçando que que “não há nada grandioso que se possa fazer sem a participação da sociedade”. A ministra destacou ainda que o Brasil assume, na COP30, o compromisso de liderar transformações que só serão possíveis com responsabilidade compartilhada entre governos, empresas e comunidades, especialmente as que historicamente têm sido afetadas pela crise climática. “O bom da democracia é que ela existe para que possamos dizer sim ou não. Mas tem coisas para as quais não tem como dizer não. Não tem como dizer não à ciência, à própria democracia e à verdade”, discursou.
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Liana Melo
Formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Especializada em Economia e Meio Ambiente, trabalhou nos jornais “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia” e na revista “IstoÉ”. Ganhou o 5º Prêmio Imprensa Embratel com a série de reportagens “Máfia dos fiscais”, publicada pela “IstoÉ”. Tem MBA em Responsabilidade Social e Terceiro Setor pela Faculdade de Economia da UFRJ. Foi editora do “Blog Verde”, sobre notícias ambientais no jornal “O Globo”, e da revista “Amanhã”, no mesmo jornal – uma publicação semanal sobre sustentabilidade. Atualmente é repórter e editora do Projeto #Colabora.











































