Proteger a biodiversidade valeu a pena – economicamente – para a Costa Rica

Reserva Biológica do Bosque Nublado de Monteverde, um dos pontos turísticos mais visitados da Costa Rica: proteger a biodiversidade e torná-lo rendeu frutos financeiros ao país (Foto: Turismo da Costa Rica / Divulgação)

País da América Central obtém quase 10% de seu produto interno bruto das atividades turísticas relacionadas com a natureza

Por The Conversation | ODS 12 • Publicada em 27 de maio de 2022 - 09:05 • Atualizada em 29 de outubro de 2022 - 12:17

Reserva Biológica do Bosque Nublado de Monteverde, um dos pontos turísticos mais visitados da Costa Rica: proteger a biodiversidade e torná-lo rendeu frutos financeiros ao país (Foto: Turismo da Costa Rica / Divulgação)

(Alejandra Echeverri Ochoa e Jeffrey R. Smith*) – Após dois anos de bloqueios pandêmicos e fechamento de fronteiras, as viagens globais parecem estar se recuperando em grande parte do mundo em 2022. O deserto é uma grande atração turística – mas os países que protegem seus ambientes naturais e a biodiversidade ganham uma recompensa nas receitas do turismo?

Surpreendentemente, pouca pesquisa foi feita sobre essa questão. Alguns estudos iniciais na África demonstraram que pessoas de todo o mundo viajam para encontrar “os cinco grandes” – elefantes, rinocerontes, búfalos, leões e leopardos. Mas ainda não está claro se as pessoas viajarão para ver uma grande variedade de plantas e animais, ou apenas algumas espécies icônicas selecionadas.

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Como estudiosos em conservação e ecologia, nos perguntamos se a biodiversidade – especificamente, o número de espécies em um determinado lugar – influenciava para onde as pessoas escolhiam viajar para o turismo. Analisamos essa questão em um estudo publicado recentemente focado na Costa Rica, um país que se comercializa para o mundo como verde e biodiverso e obtém quase 10% de seu produto interno bruto das atividades turísticas.

Nosso estudo avaliou se a oportunidade de ver muitas espécies de animais vertebrados importava para os turistas que visitavam a Costa Rica e, em caso afirmativo, quão importante era em comparação com outros recursos, como hotéis e praias. Descobrimos que a abundância de espécies animais por si só não impulsiona o turismo; em vez disso, na Costa Rica, nossa pesquisa mostra que a biodiversidade precisa ser combinada com infraestrutura como hotéis e estradas que permitem o acesso à natureza. A Costa Rica mostrou a outros países como fazer isso e está colhendo benefícios.

Biodiversidade, satélites e mídias sociais

Para nosso estudo, usamos milhões de avistamentos de animais na Costa Rica do Global Biodiversity Information Facility, um repositório público de dados de acesso aberto sobre todos os tipos de vida na Terra. O GBIF compartilha relatórios de membros – incluindo governos, grupos conservacionistas, bibliotecas e sociedades científicas – sobre observações de plantas, animais e outras espécies vivas, com localizações geográficas. Acadêmicos e governos utilizam esses dados para informar pesquisas científicas e decisões políticas.

Combinamos essas observações da vida selvagem com mapas derivados de satélite de condições climáticas, como temperatura e chuva, e elementos de habitat, como cobertura de árvores e superfícies impermeáveis, como estradas. Usando esses dados, criamos mapas de distribuição na Costa Rica para 699 aves, mamíferos, anfíbios e répteis. Selecionamos espécies que possuíam mais de 25 pontos de dados no país.

Em seguida, usamos esses mapas para ver a importância da riqueza de espécies na condução de dois tipos de turismo. Primeiro, consideramos o turismo geral, medido por onde as pessoas vão para tirar fotos e enviá-las para o site de compartilhamento de fotos do Flickr. Em segundo lugar, analisamos as listas de verificação no eBird, uma plataforma de mídia social onde as pessoas que se identificam como observadores de pássaros podem compartilhar quais espécies veem durante as caminhadas pela natureza.

Em seguida, adicionamos outros fatores que são amplamente conhecidos por impulsionar o turismo, incluindo a localização de hotéis, estradas, limites de parques nacionais e recursos aquáticos, como lagos. Isso nos permitiu considerar quão importante a biodiversidade foi comparada com outros fatores-chave do turismo.

Nossos dados vieram do Global Roads Open Access Database da NASA, um mapa global de estradas; o banco de dados GeoNames, uma fonte global com as coordenadas de todos os hotéis e pousadas cadastrados; e o banco de dados Natural Earth, que contém um mapa dos lagos e oceanos do mundo. Usamos esses mapas para prever para onde os turistas estavam indo, mapeando onde as pessoas estavam tirando fotos para enviar para o Flickr, ou onde estavam observando pássaros e enviando suas listas para o eBird.

Quetzal. pássaro considerado sagrado pelos astecas, em parque natura na Costa Rica: espécies raras são atração turística (Foto: Turismo da Costa Rica / Divulgação)
Quetzal. pássaro considerado sagrado pelos astecas, em parque natura na Costa Rica: espécies raras são atração turística (Foto: Turismo da Costa Rica / Divulgação)

Infraestrutura de pequena escala

Descobrimos que o turismo é mais alto nas zonas da Costa Rica, onde tanto a biodiversidade quanto a infraestrutura estão presentes e acessíveis aos turistas. Uma dessas áreas é Monteverde, uma exuberante floresta na altitude que a National Geographic chama de “a joia da coroa das reservas de florestas nubladas”.

Aqui os visitantes podem encontrar o resplandecente quetzal, um pássaro verde com uma barriga vermelha e uma longa cauda verde-azulada que brilha à luz do sol. Considerado sagrado pelos astecas e maias, o quetzal é um grande atrativo para observadores de pássaros e outros turistas. Outra espécie de grande interesse turístico é o papagaio-de-peito-vermelho, um pequeno papagaio verde com testa vermelha que é encontrado apenas na Costa Rica e no norte do Panamá.

Lugares como Monteverde são os principais destinos turísticos da Costa Rica porque estão repletos de espécies endêmicas e ameaçadas que os visitantes querem ver e que só podem ser encontradas nesses locais. É importante ressaltar que essas áreas também têm pousadas ecológicas  para as pessoas passarem a noite.

Compreensivelmente, lugares com alta biodiversidade, mas sem infraestrutura, recebem menos visitantes. Por exemplo, o Parque Internacional Amistad, localizado na Costa Rica e no Panamá, possui uma grande extensão de floresta e muitas espécies. Mas muito poucas pessoas vão lá em comparação com outras áreas de alta biodiversidade. Nossos resultados indicam que isso ocorre porque não há estradas suficientes para tornar o parque acessível e ver animais selvagens e pássaros.

Por outro lado, locais com níveis de infraestrutura muito altos e poucas espécies também não são desejáveis para os turistas. Pense em hotéis de grandes cidades onde os turistas podem ficar um ou dois dias por conveniência, mas não reserve estadias mais longas por causa do acesso limitado a espécies selvagens.

Nossas descobertas sugerem que, para que países como a Costa Rica continuem a obter benefícios econômicos do turismo, eles precisam investir em infraestrutura e conservação da biodiversidade. Acreditamos que, em vez de construir grandes resorts ou estradas de várias pistas, os países deveriam adotar o modelo de infraestrutura turística da Costa Rica, que consiste principalmente em pequenas pousadas ecológicas e pousadas na natureza. A sustentabilidade é um tema central da política de turismo do país, que enfatiza o apoio às pequenas e médias empresas.

Governos de todo o mundo se reunirão no outono de 2022 para uma conferência crítica sobre a proteção das espécies selvagens do mundo na próxima década. Um dos principais objetivos deste encontro é negociar formas de o ser humano viver em harmonia com a natureza.

Uma questão-chave na agenda é avaliar e gerenciar os trade-offs entre proteger a natureza e promover o crescimento econômico. Nossos resultados indicam claramente que essas duas coisas não podem ser consideradas isoladamente. Em nossa opinião, o setor de turismo deve enfatizar a conservação de espécies, porque muitas pessoas pagarão para ver a vida selvagem e os lugares intocados.

*Alejandra Echeverri Ochoa é cientista de conservação da biodiversidade e pesquisadora de pós-doutorado na Universidade de Stanford (EUA); Jeffrey R. Smith é pesquisador de pós-doutorado em Ecologia e Biologia Evolutiva na Universidade de Princeton (EUA)

The Conversation

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