ODS 1
Pesquisa transforma líquido nocivo da mandioca em novos produtos
Projeto Farinheira Sustentável, desenvolvido pela Universidade Federal do Sul da Bahia, ajuda agricultores a reaproveitar resíduos
A farinha de mandioca é um dos principais produtos da economia das cidades da região Sul da Bahia. A produção tradicional sustenta diversas comunidades, e ganhou novo significado a partir de uma nova tecnologia social a Farinheira Sustentável, que transformou resíduos em novos itens que podem ser vendidos: alimento para animais, matéria-prima para inseticida e formicida, e até sabão e tijolos.
E o que era resíduo virou uma forma de reduzir os custos no sistema produtivo das comunidades. Os agricultores passaram a ver a manipueira, o líquido extraído durante a produção da farinha – venenoso e nocivo para os humanos e animais – como um aliado, e não mais como um problema ambiental.
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Veja o que já enviamosO programa foi desenvolvido pela Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), em parceria com empresas e a comunidade da cidade Alcobaça, no sul do estado. A ação faz parte do Plano de Ação Territorial (PAT) da Mandiocultura, que começou em dezembro de 2016. A coordenação de pesquisa do PAT da Mandiocultura, uma ação do Programa Prodeter do Banco do Nordeste, é da professora Lívia Lemos: a UFSB foi convidada para coordenar os estudos.
O descarte irregular da manipueira estava contaminando os corpos hídricos como rios, córregos, lagos e águas subterrâneas do município de Alcobaça, e, por isso, o Ministério Público da Bahia instaurou um inquérito civil e notificou a Secretaria de Meio Ambiente municipal para resolver a situação.
O secretário entrou em contato com o coordenador de Sustentabilidade da Fibria Celulose para que ajudasse aos agricultores familiares a promoverem a adequação dessa irregularidade ambiental. A empresa, por meio do Programa de Desenvolvimento Rural Territorial (PDRT) contratou a Polímata Soluções Agrícolas e Ambientais para ajudar a construir o conceito.
Mas não existia nenhum dado que subsidiasse a elaboração de nenhuma solução. Com essa necessidade, a UFSB entrou no circuito, junto com a engenheira Jeilly Carvalho, da Polímata, para entrevistar 65 farinheiras em cinco comunidades no município de Alcobaça para que fossem identificados os problemas, e, a partir disso, construir soluções.
“Durante a pesquisa, apenas 29% dos agricultores diziam que usavam a manipueira, mas, ao perguntar mais sobre a forma de uso, percebia-se pouco conhecimento sobre as oportunidades e as possibilidades do multiaproveitamento da manipueira”, diz a professora Lívia Lemos.
A nova tecnologia trouxe uma lista extensa de possibilidades de produtos: raspa da mandioca como alimento para animais, e a manipueira como matéria-prima para inseticida, bactericida, formicida, adubação de fundação, adubação de cobertura e adubação foliar, sabão, tijolos.
Até o momento, 187 agricultores foram capacitados, 3 farinheiras sustentáveis implantadas, sendo 2 adequações e 1 construção partindo do zero. Além do apoio a adequação ambiental de 60 farinheiras.
O impacto nas comunidades já pôde ser sentido, como explica a professora Lívia Lemos, uma das responsáveis pelo projeto. “Com todas estas oportunidades, os jovens começam a se inserir, a renda e a qualidade de vida das famílias melhora, o meio ambiente é respeitado pela destinação correta da manipueira, e o território é impactado pela mudança na profissionalização da cadeia produtiva da mandioca”, afirma.
Foram quatro meses para se chegar ao conceito, que é baseado em sete princípios: gestão de resíduos, multiaproveitamento da manipueira, bacia evapotranspiração, círculo agroflorestal, água, área suja/área limpa e matéria prima.
O novo conceito já ultrapassou as fronteiras da Bahia e também já beneficiou duas comunidades no Espírito Santo, a partir da qualificação das farinheiras locais. “Vários agricultores de outros municípios já participaram [da formação], principalmente de municípios que integram o Plano de Ação Territorial da Mandiocultura no Extremo Sul da Bahia”, destaca a professora.
Para realizar as atividades, o programa contou com o apoio da Fibria, em 2018, e da Suzano, em 2019. A formação em Farinheira Sustentável acontece na Cooperativa de Agricultores do Vale do Itaitinga (CAVI) e tem duração de dois dias, com teoria e prática. Os palestrantes são os responsáveis pelo desenvolvimento do conceito, com a participação de alunos da UFSB e os cooperados da CAVI participam como instrutores da parte prática. Até o momento são 109 farinheiras sendo adequadas, o que impacta diretamente 545 famílias.
Sete princípios da farinheira sustentável
- Gestão de Resíduos
Entender o potencial dos resíduos gerados para fazer uma correta destinação dos mesmos, ampliando a geração de renda para os agricultores.
- Multiaproveitamento da Manipueira
Com alto potencial poluidor ambiental, a manipueira tem multiaproveitamentos com grande capacidade de agregação de valor para o agricultor.
- Bacia Evapotranspiração
Sistema fechado de tratamento de águas negras, aquelas utilizadas na descarga de sanitários convencionais.
- Círculo Agroflorestal
Sistema fechado de filtragem de águas cinzas, da lavagem das instalações e da mandioca.
- Água
Para o funcionamento adequado de uma agroindústria se faz necessário ter uma água de qualidade. Assim o conceito contempla a captação de água da chuva e o tratamento da água com hipoclorito de sódio.
- Área Suja / Área Limpa
A separação entre área suja e área limpa é necessária para o bom funcionamento da unidade e para garantir condições de higiene necessárias
- Matéria Prima
No campo das matérias primas, é importante garantir não só a raiz, mas também a madeira para o suprimento de lenha. E utilizar a mandioca nas mais diversas formas de produção de alimento.
[g1_quote author_description_format=”%link%” align=”none” size=”s” style=”solid” template=”01″]19/100 A série #100diasdebalbúrdiafederal pretende mostrar, durante esse período, a importância das instituições federais e de sua produção acadêmica para o desenvolvimento do Brasil.
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Como participante ativo desse projeto pioneiro, como coordenador da Vigilância Sanitária de Alcobaça, parabenizo a professora Lívia e todos os envolvidos pelo sucesso e agradeço à jornalista pela matéria divulgando o Farinheira Sustentável e o extremo sul.