Economia brasileira apresenta sinais de recuperação e de estagnação

Para garantir bem-estar e qualidade de vida, Brasil precisa aumentar produtividade, melhorar a infraestrutura e destravar o potencial de crescimento sustentável

Por José Eustáquio Diniz Alves | ArtigoODS 12 • Publicada em 27 de janeiro de 2025 - 09:25 • Atualizada em 27 de janeiro de 2025 - 21:22

Fernando Haddad, ministro da Fazenda, em entrevista coletiva, faz um balanço da economia brasileira em 2024. País deve crescer acima do esperado. Foto Sérgio Lima/AFP

A economia brasileira tem apresentado sinais contraditórios, tanto no curto, quanto no longo prazo. Os fatores estruturais do Brasil explicam os limites de crescimento de longo prazo, enquanto os fatores conjunturais ajudam a entender a volatilidade econômica e o desempenho de curto prazo. O Brasil foi um dos países que apresentaram grande crescimento econômico nos chamados 30 anos gloriosos, que vão de 1950 a 1980. Neste período, o mundo todo cresceu, mas o ritmo de crescimento da economia brasileira foi bem superior ao ritmo médio da economia internacional e a renda per capita brasileira ultrapassou a renda per capita da população mundial.

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Porém, este quadro mudou nos últimos 45 anos, pois a economia brasileira tem crescido abaixo da média global. O gráfico abaixo, com dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), mostra o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo e do Brasil, além da média móvel de 8 anos. Na média dos últimos 46 anos, o PIB mundial cresceu 3,3% ao ano e o PIB brasileiro cresceu 2,2% ao ano. Nota-se que a média móvel global de 8 anos ficou sistematicamente superior à média móvel do PIB brasileiro. No período, o PIB global cresceu acima do PIB brasileiro em 33 anos e o contrário só ocorreu em 13 anos.

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O último relatório do FMI estima que o PIB brasileiro, em 2024, tenha crescido 3,7%, acima da estimativa de 3,2% do PIB global. A última vez que isto tinha ocorrido foi em 2010. O mesmo relatório estima que a economia internacional vai crescer 3,3% em 2025 e 2026 e a economia brasileira deve crescer 2,2% ao ano. A renda per capita brasileira, em preços constantes em poder de paridade de compra, ficou abaixo do nível de 2013 até 2023 e aquele valor só foi ultrapassado em 2024. Desta forma, a renda per capita brasileira ficou estagnada durante 10 anos, de 2013 a 2023.

Considerando os períodos presidenciais, o gráfico abaixo apresenta a variação anual do PIB per capita e a média anual do crescimento per capita de cada gestão presidencial ou regime institucional entre 1956 e 2026, sendo uma atualização de um gráfico semelhante do artigo “A economia brasileira melhorou, mas está longe de vencer a armadilha da renda média” publicado aqui no # Colabora (Alves, 17/04/2024).

Considerando todo o período histórico dos 71 anos em questão, o governo Juscelino Kubitschek (1956-60) foi a gestão que apresentou o maior crescimento per capita, em especial para um período democrático, com uma média de variação de 5% ao ano. Nos governos Jânio Quadros e João Goulart (1961-1963), houve uma crise política gerada pela renúncia do presidente eleito e muita instabilidade democrática, em consequência, a média de crescimento per capita caiu para 2,3% aa, menos da metade do valor anterior.

Nos 21 anos da ditadura militar, aconteceu o período de maior performance econômica da história brasileira, com o chamado “milagre econômico” (1968-73), que apresentou crescimento médio do PIB de 11,2% aa e um crescimento da renda per capita de 8,2% aa. Porém, a primeira recessão em 50 anos, após a crise dos anos 1930, ocorreu entre 1981 e 1983, impulsionando o movimento pelas “Diretas Já”, que completou 40 anos em 2024. Na média do regime autoritário (1964-84), o crescimento da renda per capita ficou em 3,6% aa.

Logo após a redemocratização do país, o crescimento anual da renda per capita diminuiu para 2,3% aa durante o governo Sarney (1985-89), iniciando o período de baixo crescimento da renda per capita nos 40 anos da redemocratização (1985-2025). Mas o pior desempenho do século XX e XXI ocorreu na gestão de Fernando Collor e Itamar Franco (1990-94), que apresentou redução da renda per capita de -0,5% aa e foi marcado pela alta inflação e pelo impeachment do presidente Collor.

Ainda no governo Itamar, quando o ministro da Fazenda era Fernando Henrique Cardoso (FHC), foi lançado o Plano Real, que controlou a generalizada elevação dos preços dos bens e serviços. O governo FHC (1995-02) manteve a inflação brasileira em um “patamar civilizado” e garantiu a retomada da economia, mas o crescimento da renda per capita foi de apenas 0,9% aa.

Os dois primeiros governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-10), apresentaram o melhor desempenho econômico do período pós-democratização, com crescimento per capita de 2,9% ao ano. Houve retomada do crescimento, embora a uma taxa bem menor do que aquela do período JK.

Os oito anos da gestão Dilma Rousseff e Michael Temer (2011-18) foram marcados por sucessivas crises econômicas e políticas que resultaram em uma redução de -0,1% do PIB per capita. A recessão de 2014 a 2016 e todo o conturbado processo de impeachment da presidenta Dilma jogaram o país na armadilha do baixo crescimento.

O governo Jair Bolsonaro (2019-2022) começou com baixa taxa de crescimento em 2019 e uma grande recessão em 2020, em função do impacto da pandemia da covid-19. Houve uma certa recuperação nos últimos dois anos da gestão, o que resultou em um crescimento per capita de 0,8% no quadriênio.

No ano de 2023, primeiro ano do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (2023-2026), o PIB cresceu 2,9% e acelerou para 3,7% em 2024. Desta forma, as estimativas do FMI para o quadriênio, segundo o relatório WEO de janeiro de 2025, são de um crescimento médio da renda per capita de 2,3% ao ano, valor abaixo do alcançado pelos dois governos anteriores de Lula, mas acima do ritmo apresentado nos governos Dilma, Temer e Bolsonaro.

Na época em que a economia brasileira crescia mais do que a média mundial, até 1980, a renda per capita do país ultrapassou a renda per capita média global. Mas, com o baixo crescimento das últimas quatro décadas, o Brasil voltou a ter uma renda per capita abaixo da renda média mundial.

Desafios da economia brasileira

No próximo dia 15 de março de 2025 vai fazer 40 anos do fim da ditadura militar. O Brasil avançou em algumas áreas, estagnou em outras e até regrediu em alguns aspectos. Diversas dificuldades estruturais, como a baixa produtividade e a alta desigualdade social, ainda estão aqui.

Nos 40 anos entre 1985 e 2024, segundo dados do FMI, o PIB mundial cresceu 3,1% ao ano, a população mundial cresceu 1,3% aa e a renda per capita global cresceu 1,8% aa. No Brasil, os números foram de 2,2% aa do PIB, 1,1% aa da população e 1,1% aa da renda per capita. No Vietnã, os números foram de 6,4% aa do PIB, 1,4% aa da população e 5,0% aa da renda per capita. Na China, os números foram de 8,8% aa do PIB, 0,8% aa da população e 8,0% aa da renda per capita.

Portanto, o crescimento da renda per capita brasileira foi menor não só em relação à média internacional, mas ficou atrás do que ocorreu no Vietnã e nem se compara ao que aconteceu na China, que teve alto crescimento econômico, com aumento da complexidade produtiva e baixo crescimento demográfico.

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é um indicador mais revelador do progresso social do que o crescimento do PIB, pois mede os avanços na saúde, na educação e na renda dos países. A tabela abaixo mostra que o Brasil tinha um IDH acima da média mundial e bem acima do IDH do Vietnã e da China em 1990. Nas últimas décadas houve avanços inegáveis na educação, na saúde e na renda no país. Mas, nos últimos 32 anos, entre 1990 e 2022, o IDH da China cresceu 64%, o do Vietnã cresceu 48% e o IDH do mundo e do Brasil cresceu apenas 23%. Entre 2015 e 2022 o IDH brasileiro ficou estagnado.

O fato é que o Brasil apresentou melhorias sociais e econômicas nas últimas 4 décadas, mas com um desempenho geral abaixo daquele alcançado pelos países emergentes. O Brasil tem alternado momentos de recuperação e de estagnação da economia, sendo que os períodos de crescimento possuem fôlego curo, típicos do chamado “voo de galinha”. Por exemplo, entre 2014 e 2020 o PIB brasileiro caiu 5,4% e recuperou o crescimento, em média, acima de 3% aa entre 2021 e 2024. Mas as estimativas do FMI indicam crescimento abaixo de 3% em 2025 e 2026.

Evidentemente, as razões para a armadilha do baixo crescimento da economia brasileira são diversas e complexas. Mas existe um indicador que resume as diferenças entre os países com elevado ou reduzido ritmo de desenvolvimento econômico, que é a taxa de investimento (e de poupança agregada).

O gráfico abaixo mostra que as taxas de investimento do mundo ficaram em torno de 25% do PIB nos últimos 40 anos, da China atingiram impressionantes 40% do PIB, no Vietnã, depois das reformas econômicas (Doi Moi) da segunda metade da década de 1980, as taxas de investimento ficaram acima de 30%. No Brasil, a média das taxas de investimento ficou abaixo de 20% do PIB.

A literatura econômica mostra que é praticamente impossível um país manter um crescimento econômico elevado no longo prazo com taxas de investimento (e taxas de poupança) abaixo de 25% do PIB. Neste sentido, é preocupante o fato de que o Brasil tenha mantido taxas de investimento (e de poupança) abaixo de 20% do PIB, nas últimas décadas. Neste contexto, o país não consegue garantir políticas universais de pleno emprego, de educação de qualidade para todas as pessoas e nem políticas gerais de direitos humanos. Também não consegue aumentar a produtividade da economia, a competitividade internacional e nem manter avanços consistentes no desenvolvimento humano do conjunto da população.

A política macroeconômica brasileira tem mantido uma situação esquizofrênica com uma política fiscal expansionista e uma política monetária restritiva. É como pisar, ao mesmo tempo, no acelerador e no freio de um carro em movimento desorientado.

O Brasil já tem uma das maiores taxas de juros reais do mundo, mas na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), a ser realizada nos dias 28 e 29 de janeiro de 2025, a taxa Selic, que hoje é de 12,25% ao ano, deve passar para 13,25%. Na reunião do Copom de 18 e 19 de março a Selic deve passar para 14,25% ao ano.

Taxas elevadas de juros tendem a reduzir as taxas de investimento e as taxas de crescimento econômico. O Governo Federal tenta salvar o arcabouço fiscal, limitando o gasto público, enquanto o Banco Central restringe o crédito e tira oxigênio do sistema produtivo. Desta forma, a expectativa é de menores taxas de crescimento econômico em 2025 e 2026.

O quadriênio do governo Lula de 2023-2026 deverá apresentar melhores indicadores do que o quadriênio do governo Bolsonaro de 2019-2022. Com certeza será muito melhor do que o octênio dos governos Dilma e Temer de 2011-2018. Mas deverá apresentar piores indicadores do que o octênio dos primeiros governos Lula de 2003-2010.

Para romper com a “armadilha da renda média” e garantir bem-estar e boa qualidade de vida para toda a população, o Brasil precisa sincronizar suas políticas macroeconômicas, diversificar sua economia, fortalecer as inversões em ciência e tecnologia, aumentar a produtividade dos fatores de produção, garantir competitividade internacional, melhorar a infraestrutura e destravar o potencial do crescimento sustentado e sustentável.

Referência:

ALVES, JED. A economia brasileira melhorou, mas está longe de vencer a armadilha da renda média, # Colabora, 17/04/2024  https://projetocolabora.com.br/ods8/economia-brasileira-melhorou-mas-sofre-com-armadilha-da-renda-media/

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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