ODS 1
Carros (quase) autônomos já estão por aí e você nem notou
Antes restritos aos protótipos, sistemas inteligentes estão presentes em vários modelos e, aos poucos, vão assumindo o volante dos carros
A meta é conhecida: em nome da eficiência, da segurança e da sustentabilidade, transformar os carros em máquinas autônomas nas quais todos seremos apenas ilustres passageiros. Mas, enquanto essa conquista não se concretiza, tal qual um bom e experiente estrategista, a inteligência artificial vem assumindo o controle dos automóveis aos poucos, passo a passo, “comendo pelas beiradas”. Isso fica bem claro para quem visita os grandes eventos automotivos do chamado Primeiro Mundo – e no Salão do Automóvel de São Paulo deste ano. E se a direção plenamente autônoma ainda deve demorar um pouco para chegar ao nosso país (veja alguns dos motivos nesta matéria aqui do colabora), alguns recursos que até pouco tempo só víamos nos filmes de ficção científica já estão se tornando corriqueiros em modelos que já rodam em nossas ruas, como veremos a seguir.
Pausa para uma pequena explicação: antigamente, quando falávamos em inteligência artificial – ou IA – era comum vir à mente a imagem de um daqueles robôs* ou computadores falantes dos filmes. Hoje, a expressão remete mais comumente àqueles sistemas de informática capazes de reunir e processar zilhões de informações sobre bilhões de pessoas e que, por exemplo, nos bombardeiam com propagandas e sugestões de produtos e serviços de que supostamente necessitamos. Lembrou dos tais algoritmos? Pois é, eles fazem parte da coisa.
(*) No meu caso, a imagem de robô que surge é daquele do Will Robinson de Perdidos no Espaço que fazia sucesso na TV no começo dos anos 1970, associação que entrega minha idade.
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Veja o que já enviamosChegando de mansinho. No caso específico dos automóveis, os primeiros recursos dessa IA começaram a subir a bordo em larga escala há uns 20 anos. Na forma de processadores computadorizados, eles foram assumindo os sistemas de gerenciamento do motor com sensores, ajustando a injeção da mistura de ar e combustível e o ponto de ignição e tornando os veículos muito menos poluentes, mais confiáveis e muito mais econômicos.
Depois vieram os computadores de bordo mais complexos e seus avisos e informações em tempo real, o piloto automático eletrônico (que mantém o veículo em uma velocidade constante sem que você precise acelerar), os sensores que ligam e desligam faróis e limpadores, as centrais de multimídia com comando de voz, sistemas de controle de tração, de freios (ABS) e de estabilidade, as memórias programáveis para a posição dos bancos e espelhos, os assistentes de estacionamento… E, sem que a maioria das pessoas se dê conta, hoje a máquina já “manda sozinha” em uma série de coisas, até em modelos mais simples e baratos.
Foram tantos avanços que os técnicos resolveram criar uma escala – que vai de zero a quatro – para classificar o quanto de autonomia os diferentes modelos de automóveis oferecem. Nela, zero indica “nada” e quatro que a máquina não precisa mais de você para nada. Carros com controles de estabilidade e de tração e freios ABS, nos quais os processadores literalmente consertam os erros e abusos do motorista, por exemplo, estão no nível I.
Segundo passo: manter distância. Agora, porém, a coisa está chegando a um outro patamar. De uns dois ou três anos para cá, chegaram ao mercado – inclusive aqui no Brasil, importados – modelos que, em movimento, além da velocidade, são capazes de manter automaticamente a distância em relação ao veículo que vai à frente, freando ou acelerando quando necessário, e até agindo sobre a direção para evitar que o veículo saia da pista (veja uma lista de alguns dos modelos disponíveis no final deste texto). Esse tipo de assistência temporária coloca o modelo no nível II da tal escala de automação e costuma incluir outros recursos de segurança, como detector de risco de colisão, aviso de veículos se aproximando nos pontos cegos, que não são visíveis pelos espelhos retrovisores e alerta os motoristas que demonstrem muito cansaço ao volante.
Além disso, de forma parecida com os mordomos-assistentes dos nossos smartphones, muitos dos novos modelos são capazes de “ouvir” e responder a perguntas (agora é que ninguém mais vai ler o manual…) ou executar funções solicitadas pelos humanos a bordo, como regular o ar-condicionado, ajustar bancos e espelhos, programar o navegador e informar detalhes sobre a rota, alterar a iluminação interna, a multimídia e outras tantas coisinhas.
Comando temporário. E, se a direção plenamente autônoma ainda demora um pouco, isso não quer dizer que já não possamos ter os chamados semiautônomos de nível III no Brasil. Tanto que, neste Salão do Automóvel alguns deles já estão sendo apresentados como lançamentos – caso do Audi A8 2019, que chega às nossas lojas no começo do ano que vem.
Nele, quem estiver sentado no assento do motorista vai poder escolher se quer ou não dirigir em algumas situações – além do trânsito urbano em vias expressas, ele é capaz de se “autodirigir” em rodovias bem sinalizadas, e pode “se estacionar” sozinho sem que um humano precise sequer acionar acelerador e freio. Na verdade, nessas situações, o humano nem precisa estar a bordo. Por meio de um aplicativo no smartphone, você pode ligar e comandar remotamente o carro para que saia ou entre na vaga dentro de estacionamentos, por exemplo. Além da óbvia comodidade, um recurso assim pode aumentar o número de vagas disponíveis em garagens de shoppings, por exemplo, já que não é preciso deixar espaço entre os carros para que as portas se abram.
O futuro está mais próximo do que nunca. Em um passo adiante ao da pura automação, algumas ideias interessantes foram apresentados no Salão de Paris e prometidos para muito breve. Eis aqui três delas:
Para já: Google e Renault-Nissan formaram uma parceria que vai colocar o Android (com e sem trocadilho, por favor) nos milhões de automóveis que a empresa produz anualmente em suas fábricas, a partir de 2012. A princípio, os recursos serão mais ligados ao sistema de informação e entretenimento em multimídia, com integração aos apps e à imensa base de dados da gigante californiano. A coisa, porém, não deve parar por aí e, em se tratando de Google e de IA, os limites são difíceis de estabelecer.
Liberdade vigiada: Entre muitas visões para o futuro, a francesa Valeo mostrou um sistema que monitora e avalia permanentemente quem estiver dirigindo. Tanto o estado físico e sinais vitais (batimentos cardíacos, respiração, pressão etc.) como também as emoções dos motoristas servirão para que o computador faça diversos ajustes no carro, regulando o ar-condicionado, a posição do banco, as cores das luzes internas, a umidade do ar e até a eventual dispersão de perfumes com aromas calmantes. Em casos extremos, o “tutor eletrônico” será capaz de parar o carro.
Em rede: Outra tecnologia que está no cardápio de muitas montadoras – entre as quais a Jaguar-Land Rover, a Ford e a Volvo – é a que possibilita que os sistemas autônomos dos carros “conversem entre si” e, também, sejam integrados às redes que controlam o trânsito nas cidades. Assim, por exemplo, pela tela de multimídia do seu veículo, você poderá ver um acidente ou outro obstáculo que tenha acontecido ou esteja muitos carros a sua frente, por meio de imagens captadas por outro automóvel. E vai poder antecipar reduções bruscas de velocidade alguns e eventuais obstáculos ou buracos na pista. O sistema poderá incluir outros dados, como por exemplo a frequência de abertura e fechamento dos sinais de trânsito, de modo que, controlando a velocidade do carro, você simplesmente não precise parar mais em sinais vermelhos. A ideia é que esses recursos, claro, funcionem de forma integrada com a inteligência artificial que vai atuar em seu carro, seja como simples apoio ao motorista de carne e osso, seja como um “chofer” completo e que não cobra horas extras.
Enquanto isso, nos EUA… No início de outubro, a nipônica Honda anunciou que investirá US$ 2,75 bilhões em sua parceria com a General Motors para o desenvolvimento de veículos autônomos pelos próximos 12 anos.
[g1_quote author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”solid” template=”01″]Outra tecnologia que está no cardápio de muitas montadoras é a que possibilita que os sistemas autônomos dos carros “conversem entre si” e, também, sejam integrados às redes que controlam o trânsito nas cidades. Assim, pela tela de multimídia do seu veículo, você poderá ver um acidente que tenha acontecido ou esteja muitos carros a sua frente, por meio de imagens captadas por outro automóvel
[/g1_quote]Amanhã em Paris. Um dos eventos automotivos mais importantes e ricos do mundo, o salão parisiense costuma ter em seus estandes protótipos que vão do delírio total ao carro que você terá em sua garagem daqui a três anos. Veja aqui alguns dos carros-conceito autônomos que mais chamaram a atenção no Salão de Paris deste ano:
Delirante: Renaut EZ-Ultimo Cibcept – https://youtu.be/Wz95SkoHbfI
Lindão e com jeitão de “chego já”: Peugeot Legend – https://www.peugeot.pt/tecnologia-conectividade/concepts-cars/peugeot-e-legend-concept.html
Superesportivo com personalidade própria: Audi PB18 e-Tron – https://youtu.be/Gpb-RHB1HgM .
Esporte fino: DS X E-Tense (Citroen) – https://www.dsautomobiles.pt/inside-ds/concept-cars/ds-e-tense.html
Já em nossas ruas. A seguir, alguns dos modelos com expressivos recursos de autonomia que você já pode comprar nas lojas brasileiras.
Ford Fusion: Estaciona quase sozinho (é preciso acelerar e frear), abaixa automaticamente o farol alto ao detectar um outro carro vindo na mão contrária; mantém a distância em relação ao carro à frente e é capaz por si só de parar e voltar a andar (se o outro carro também o fizer em até três segundos), algo muito útil e seguro em engarrafamentos. Detecta pedestres à frente e freia sozinho em caso de colisão iminente.
VW Passat: Também estaciona (quase) sozinho, reduz o farol alto, controla a distância em relação ao carro à frente e evita colisões (frenagem automática), inclusive em manobras de marcha a ré; assume o controle do acelerador e dos freios ao perceber que o carro está saindo muito da trajetória, fazendo com que volte à direção certa.
BMW Série 7 Sedã: Possui um sistema de condução automática, que mantém a distância em relação ao carro da frente (cuidando de freio e acelerador); anda e para sozinho em engarrafamentos; mantém o carro dentro das faixas da pista, avisa sobre colisões traseiras e sobre pedestres à frente, mesmo à noite e em ambientes sem iluminação.
Mercedes Benz Classe E Sedan: Mantém a distância em relação ao carro da frente e controla a trajetória a até 200 km/h e freia totalmente o carro em caso de risco de colisão; um assistente adaptativo de frenagem ajuda a parar o carro em manobras críticas; uma espécie de “anjo da guarda” chamado Pre-Safe prepara o carro para acidentes iminentes, fechando janelas e o teto solar e travando os cintos de segurança para proteger passageiros.
Volvo S90: Estaciona quase sozinho, mantém a distância em relação ao carro da frente e o carro entre as faixas da pista em velocidades de até 130 km/h; freia automaticamente na iminência de uma colisão ou atropelamento.
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Henrique Koifman
É carioca e jornalista com passagem por jornais e revistas da grande imprensa. Sócio da Rebimboca Comunicação, dedicada à produção de conteúdo, é apaixonado por carros desde pequeno. Pilota o blog Rebimboca on-line, no portal do jornal O Globo e é apresentador do programa de TV Oficina Motor (canal +Globosat).