ODS 1
Verão do Apartheid: falta de transparência impede mapeamento de atuação policial
Subnotificação e ausência de diálogo da Polícia Militar estão entre os problemas que impedem a implementação de políticas públicas eficazes contra a violência nas praias
A edição 2023/2024 da Operação Verão tem como características a subnotificação e ausência de diálogos por parte da Polícia Militar do Rio. Em pedido via Lei de Acesso à Informação, o #Colabora solicitou dados públicos sobre registros de boletins de ocorrência no período de setembro de 2023 a janeiro de 2024. A reportagem esperava obter dados completos dos motivos do registro do BOs, bairros das apreensões, sexo, idade, cor e naturalidade dos cidadãos recolhidos.
Leu essa? Rio tem histórico de exclusão dos pobres e periféricos
A resposta foi a seguinte:
A solicitação foi concluída apenas parcialmente. Campos relevantes sobre as apreensões, como idade, sexo e cor, foram preenchidas no máximo parcialmente – em alguns casos, nem isso. Ficaram evidentes a subnotificação e a falta de transparência para entendimento da operação.
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Veja o que já enviamosTambém via Lei de Acesso à Informação, a Secretaria de Estado de Polícia Militar informou que “os dados, como cor e idade não são informações obrigatórias para o preenchimento ou registro de BOPM (Boletim de Ocorrência da Polícia Militar).
Além das informações não disponibilizadas, foram solicitados também detalhes das conduções feitas para a delegacia e/ou averiguação de situações suspeitas após denúncias dos cidadãos, com a razão da apreensão – outra solicitação que não foi atendida.
Embora os dados esclareçam a quantidade de ocorrências registradas em cada bairro, a falta de informações sobre os indivíduos autuados acaba por fortalecer a certeza de que a Operação Verão apreende jovens negros e periféricos sem flagrante de delito ou mandado judicial.
Por que esses dados são importantes?
A não divulgação de dados oficiais como boletins de ocorrência e inquéritos policiais dificulta o trabalho de jornalistas, observatórios e especialistas em segurança pública e da própria polícia. Abre-se uma lacuna que impede o monitoramento da atuação de agentes públicos, dificultando ainda a apuração e punição de casos eventualmente abusivos.
A jornalista Cecília Olliveira, coordenadora executiva do Instituto Fogo Cruzado, em entrevista ao Jornal do Brasil, afirma que há buracos nas poucas informações divulgadas. “Quando não há dados, gestores públicos e tomadores de decisão deixam de admitir a própria falha na prevenção da violência armada”.
Nos pedidos de LAI, as seguintes informações estavam ausentes e/ou parcialmente ausentes:
A pesquisa “Elemento Suspeito 2021”, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), estudo que examina a incidência e qualidade das abordagens policiais no Rio de Janeiro, topou com problema parecido em relação à falta de transparência e também ao diálogo com a própria polícia militar. “É comum que pedidos de entrevistas e visitas fiquem meses nas gavetas de comandos sem serem respondidos”, critica Silvia Ramos, coordenadora da pesquisa. “Acontece até mesmo em estados com governos que se dizem progressistas”.
É comum também que essa falta de dados afete outros estudos em áreas de alta relevância na atenção da segurança pública. Como relatado na reportagem “Número de feminicídios sobe quase 50% em um ano”, de Oscar Valporto que destrincha os dados de feminicídio em sete estados do país pela pesquisa da Rede de Observatórios de Segurança: “Há um enorme falta de transparência nos dados sobre segurança pública”, constata Ramos.
Até a publicação deste texto, não houve resposta da PM do Rio ou de sua assessoria.
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Jornalista formado pela Universidade Nove de Julho. Atualmente integra o time de repórteres correspondentes da Agência Mural de Jornalismo das Periferias e foi estagiário no Canal Reload. Nascido e criado nas periferias da Zona Sul de São Paulo, é apaixonado por comunicação, histórias e explorar a cidade de bicicleta.