Cantora negra silenciada na TV: ‘Preferiu escolher a mais bonita’

Silvio Santos está sendo acusado de racismo na internet após ignorar vitória de Jennyfer Oliver em quadro do seu programa no SBT

Por Yuri Alves Fernandes | ODS 10 • Publicada em 9 de dezembro de 2019 - 19:13 • Atualizada em 9 de dezembro de 2019 - 21:39

‘Em nenhum momento quis me posicionar como vítima de nada, mas foi superconstrangedor’, afirma Jennyfer (Montagem: Fernando Alvarus)

Boa parte do mundo parou para ver a sul-africana Zozibini Tunzi ser coroada na noite do último domingo, 8, como a Miss Universo, durante cerimônia realizada em Atlanta, nos EUA. Ela, uma mulher negra de 26 anos, ressaltou a importância da vitória para o futuro das próximas gerações: “Quero que crianças olhem para mim e vejam seus rostos refletidos no meu”. Poucas horas antes, porém, o Brasil dava um passo bem grande atrás na luta contra a intolerância. Durante o Programa Silvio Santos, exibido pelo SBT, o apresentador e dono da emissora não ficou satisfeito com a vitória de Jennyfer Oliver, também uma mulher negra, em uma competição musical. Detalhe: ela teve a maioria dos votos da plateia, mas Silvio preferiu dar o maior valor em dinheiro para outra candidata, uma mulher branca. Um dia após o ocorrido, a hashtag #silviosantosracista segue entre as mais comentadas no Twitter.

Leia também: O racismo ataca no Legislativo

Em seu perfil do Instagram, Jennyfer falou pela primeira vez sobre o ocorrido na tarde desta segunda-feira, 9. Mesmo fazendo questão de dizer que não quer ser vista como vítima de racismo, não escondeu sua insatisfação. “Em nenhum momento eu quis me posicionar como vítima de nada, mas foi superconstrangedor. Eu falo como artista, eu me senti prejudicada. Eu pensei que a produção iria editar, mas não editaram”. Segundo a participante, o programa foi gravado há três semanas e ela só não se pronunciou antes porque o conteúdo ainda não tinha ido ao ar.

Jennyfer continua: “Em nenhum momento a gente foi qualificada vocalmente. Ele preferiu escolher a Juliani por questão de ser mais bonita e a que ele mais gostou”. No quadro, quatro cantoras se apresentaram com performances musicais. A decisão de escolher a melhor seria da plateia. Já na primeira rodada, Jennyfer foi silenciada e interrompida por Silvio após ele dizer que a música “Dona de Mim”, da Iza, era “muito chata”. A cantora não conseguiu terminar sua apresentação. “A própria produção escolheu as músicas. Quando foi a minha vez ele interrompeu dizendo que a música era ruim.”, fez questão de lembrar Jennyfer.

Mesmo com a impossibilidade de seguir com essa canção, a sertaneja conquistou a preferência do auditório com expressivos 84 votos. Juntas, as outras três somaram apenas 16. Porém, o apresentador ignorou completamente o resultado e mudou a regra do concurso. Entregou R$ 500 para cada competidora e o próprio escolheu quem merecia o prêmio final: o total de R$ 1 mil. “Se eu estivesse na minha casa, na minha opinião, a melhor intérprete seria você, Juliana! Você é muito bonita e canta muito bem”, disse Silvio na ocasião.

A cantora paulista encerra o comunicado afirmando que “há males que vêm para o bem”. E por falar nisso, uma verdadeira corrente do bem foi formada nas redes sociais, Jennyfer não para de ganhar seguidores e o apoio de famosos como Marília Mendonça, Carlinhos Brown e Luisa Mell.

“Eu penso assim: foi um quadro para cantoras e não de beleza”, finalizou Jennifer, que pode não ter ficado com o título ou com o valor maior do prêmio, mas dificilmente será esquecida e terá não só o rosto, como deseja a Miss Zozibini, mas também a voz ecoada por várias crianças.

Yuri Alves Fernandes

Jornalista e roteirista do #Colabora especializado em pautas sobre Diversidade. Autor da série “LGBT+60: Corpos que Resistem”, vencedora do Prêmio Longevidade Bradesco e do Prêmio Cidadania em Respeito à Diversidade LGBT+. Fez parte da equipe ganhadora do Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, com a série “Sem direitos: o rosto da exclusão social no Brasil”. É coordenador de jornalismo do Canal Reload e diretor do podcast "DáUmReload", da Amazon Music. Já passou pelas redações do EGO, Bom Dia Brasil e do Fantástico. Por meio da comunicação humanizada, busca ecoar vozes de minorias sociais, sobretudo, da comunidade LGBT+.

Newsletter do #Colabora

Um jeito diferente de ver e analisar as notícias da semana, além dos conteúdos dos colunistas e reportagens especiais. A gente vai até você. De graça, no seu e-mail.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *