Museu de novidades

A exposição “Inovanças – Criações à Brasileira” estará no Museu do Amanhã até o final de outubro. Foto Raquel Cunha

Exposição no Museu do Amanhã exibe invenções que transformam vidas em todo o país

Por Paula Autran e Reneé Rocha | Economia VerdeODS 14 • Publicada em 2 de junho de 2017 - 15:00 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:40

A exposição “Inovanças – Criações à Brasileira” estará no Museu do Amanhã até o final de outubro. Foto Raquel Cunha
A exposição “Inovanças – Criações à Brasileira” estará no Museu do Amanhã até o final de outubro. Foto Raquel Cunha
A exposição Inovanças – Criações à Brasileira estará no Museu do Amanhã até o final de outubro. Foto: Raquel Cunha

Embalagens feitas com fécula de mandioca que são 100% biodegradáveis, assim como tijolos produzidos com lixo e outros 37 projetos inovadores como esses estão longe de serem peças de museu. A menos que se trate de um museu de grandes novidades, como o do Amanhã, no Rio. Não por acaso, é lá que está em cartaz, até o dia 22 de outubro, a exposição Inovanças – Criações à Brasileira, organizada em parceria com o Ministério da Cultura e a Finep. O intuito é, sobretudo, inspirar outras invenções, do high ao low tech, com destaque para as tecnologias sociais, que transformam e beneficiam indivíduos e grupos em todas as regiões do Brasil e até no exterior. As invenções são apresentadas em vídeos, com declarações de seus criadores e, presencialmente, com a exposição de objetos.

A intensão é mostrar o “jeitinho brasileiro”, mas não no sentido do mal feito. Longe do conceito de gambiarra, todas são soluções permanentes na vida das comunidades, como a lâmpada de Moser, feita a partir de uma garrafa com água e alvejante

A ideia de trabalhar a inovação já está no DNA do museu. E a exposição foi pensada para celebrar a inventividade brasileira. Mesmo com todas as diferenças, brasileiros de todas as etnias, lugares e idades têm essa capacidade”, diz Leonardo Menezes, gerente de Conteúdo, de Exposições e do Observatório do Amanhã, além de curador da exposição, ao lado de Luiz Alberto Oliveira. A intensão, explica Leonardo, é mostrar o “jeitinho brasileiro”, mas não no sentido do mal feito.”Longe do conceito de gambiarra, todas são soluções permanentes na vida das comunidades, como a lâmpada de Moser, feita a partir de uma garrafa com água e alvejante, que já chegou a países como Indonésia e Filipinas”, explica ele, para quem a inovação pode ocorrer no encontro entre imprevisto e improviso.

Quatro consultores ajudaram a levantar uma lista de 140 projetos inovadores nos quatro cantos do Brasil. Desses, foram selecionados os 39 da exposição. Um dos hits da mostra é a já citada Lâmpada de Moser. A invenção – do mecânico mineiro Alfredo Moser – fornece iluminação equivalente à de uma lâmpada comum, com potência entre 40 e 60 Watts. “Sem gasto de energia, já que todo o trabalho é feito pelo Sol, que não cobra fatura. É uma excelente solução para residências em regiões pobres e sem acesso à energia elétrica”, descreve o release da exposição.

Longe do conceito de gambiarra, todas as soluções são permanentes na vida das comunidades. Foto Raquel Cunha
Longe do conceito de gambiarra, todas as soluções são permanentes na vida das comunidades. Foto: Raquel Cunha

Morador de Uberaba, Moser conta que, certa vez, encontrou o médium Chico Xavier (1910-2002) na rua: “Ele me disse que eu iria ter uma luz na minha vida. E que esta luz não seria só minha, mas de todos. Passou o tempo, e veio o racionamento de energia. Um dia, em 2001, reparei que a luz do sol da tarde, que batia num pequeno vidro cheio de água, provocava um reflexo que fazia claridade na parede. Resolvi testar isso na minha oficina: peguei uma garrafa PET de dois litros e enchi de água. Coloquei duas colheres de água sanitária, por causa da dengue, fechei com uma tampa que não deve ser branca porque resseca e derrete com o sol. Depois, lacrei para evitar vazamentos. Deu certo. Fiz outras, que já têm mais de 15 anos e continuam sendo usadas. A água continua clara, sem lodo”.

Além de gratuita e ecológica, a alternativa criada por Alfredo Moser pode gerar uma economia de até 30% na conta de luz e, por meio de um projeto internacional, já chegou a 15 países. Organizações que se inspiraram na lâmpada de Moser criaram a versão noturna do produto, que funciona com uma placa solar e uma luz de LED, capaz de iluminar por até 10 horas.

Já a busca por uma solução sustentável para a questão do lixo impulsionou a criação da empresa CBPak, que há 15 anos desenvolveu uma tecnologia que permite a produção de embalagens feitas com fécula de mandioca, 100% biodegradáveis e compostáveis. Pesquisas que duraram cinco anos ajudaram a criar a tecnologia capaz de produzir copos, bandejas e outros itens a partir da raiz. São embalagens descartáveis para consumo imediato, e podem ser usadas para levar alimentos quentes, frios e congelados. Cada copo de mandioca produzido sequestra 3,74g de gás carbônico contra uma emissão de mais de 16g necessários para a fabricação de um copo plástico. As embalagens sustentáveis da CBPak ganharam o Prêmio Finep de Inovação 2013 – Categoria Inovação Sustentável.

“A gente queria vender uma solução ambiental que deixasse um legado para o mundo, não só vender um copo ou uma embalagem. Por que escolhemos a fécula de mandioca? Primeiro é preciso explicar que existem dois tipos de mandioca, a doce e a brava, basicamente usada na indústria, e não como alimento. Somos o quarto país em volume de produção do tubérculo. Então, desenvolvemos uma tecnologia 100% brasileira, com matéria-prima brasileira”, conta Stelvio Mazza, presidente da empresa, que tem capacidade para produzir 800 mil peças por mês: “Quintuplicamos o volume de vendas no ano passado”. E a empresa aplica o conceito de economia circular. “A gente leva o material usado para compostagem. Com isso, ele vira adubo, volta para a economia como um subproduto”, explica Stelvio. Essa transformação para adubo orgânico leva até 90 dias.

Também do lixo vem o tijolo criado pelo administrador aposentado Luiz Fernando Badejo.”Comecei esta pesquisa com meu pai, que era químico e faleceu há uns vinte anos”, relembra ele, explicando que cerca de 70% do material utilizado na composição desses tijolos são resíduos orgânicos, como sobras de alimentos e cascas de frutas. Segundo o inventor, seis quilos de resíduos sólidos dão origem a um tijolo de um quilo, tão resistente quanto aqueles feitos de cerâmica. “O que fizemos foi desenvolver um aditivo que age como se envelopasse cada grão do lixo. Aliás, não só do lixo comum, mas até de papel moeda e lodo galvânico (um resíduo da produção de moedas), como já testamos num trabalho para a Casa da Moeda”, explica Badejo, acrescentando que o processo químico pelo qual passa o lixo também permite a confecção de outras coisas, como carga para fazer tinta e um cimento mais amigável ecologicamente e menos poluente.

A lâmpada de Moser e a mochila skate, duas das atrações da exposição. Foto Raquel Cunha
A lâmpada de Moser e a mochila skate, duas das atrações da exposição. Foto: Raquel Cunha

A técnica gera uma economia de 10% no custo por metro quadrado da construção e os tijolos impactam menos o meio ambiente, já que a fabricação de cada unidade evita a emissão de 11 kg de CO2 equivalente para a atmosfera (o CO2 equivalente é uma medida que compreende o lançamento de ao menos seis gases poluentes, como metano, o dióxido de carbono e óxido nitroso).

Há ainda um plástico “verde”, feito de cana-de-açúcar, utilizado para embalar alimentos, cosméticos e bebidas, por exemplo, que foi escolhido para ser aplicado em um projeto da Nasa. Ele será utilizado em uma impressora 3D, possibilitando que astronautas consigam fabricar ferramentas a serem manuseadas pelas equipes que orbitam nosso planeta. Outras inovações que se destacam na exposição são a máquina de produzir água (Wateair) a partir do ar do ambiente – desde que haja acesso à energia elétrica e umidade do ar superior a 10% – e a esponja que absorve óleo em mares e rios.  A “Inovanças” homenageia ainda vinte brasileiros, sendo dez considerados inovadores (como Oscar Niemeyer, Nise da Silveira e Paulo Freire) e dez improvisadores (como Dercy Gonçalves, Hermeto Paschoal e Sabotage).

Paula Autran e Reneé Rocha

Paula Autran e Reneé Rocha se completam. No trabalho e na vida. Juntos, têm umas quatro décadas de jornalismo. Ela, no texto, trabalhou no Globo por 17 anos, depois de passar por Jornal do Brasil, O Dia e Revista Veja, sempre cobrindo a cidade do Rio. Ele, nas imagens (paradas ou em movimento), há 20 anos bate ponto no Globo. O melhor desta parceria nasceu no mesmo dia que o #Colabora: 3 de novembro de 2015. Chama-se Pedro, e veio fazer par com a irmã, Maria.

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