As frágeis fronteiras ambientais

O tempo passa e ninguém é capaz de dizer, com precisão, se o Reino Unido continuará ou não na União Europeia. O plebiscito do dia 23 é considerado a mais importante votação das últimas gerações

Saída do Reino Unido da União Europeia pode ser um tiro no desenvolvimento sustentável

Por Claudia Sarmento | Economia VerdeODS 14 • Publicada em 16 de junho de 2016 - 08:00 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:43

O tempo passa e ninguém é capaz de dizer, com precisão, se o Reino Unido continuará ou não na União Europeia. O plebiscito do dia 23 é considerado a mais importante votação das últimas gerações
O tempo passa e ninguém é capaz de dizer, com precisão, se o Reino Unido continuará ou não na União Europeia. O plebiscito do dia 23 é considerado a mais importante votação das últimas gerações
O tempo passa e ninguém é capaz de dizer, com precisão, se o Reino Unido continuará ou não na União Europeia. O plebiscito do dia 23 é considerado a mais importante votação das últimas gerações

No próximo dia 23 de junho os britânicos decidirão se o Reino Unido deve permanecer ou não na União Europeia (UE). O plebiscito é considerado a mais importante votação em gerações, mas a duas semanas da decisão o que se vê é uma guerra de números que confunde os eleitores e uma campanha cada vez mais marcada por uma troca de ofensas pessoais entre os dois campos do debate. A economia e a imigração são os assuntos que dominam a discussão, mas temas cruciais, como políticas ambientais, têm recebido pouca atenção.

Embora o meio ambiente não tenha sido levado em consideração nos primeiros anos de desenvolvimento da UE, isso mudou dramaticamente. Um conjunto abrangente de políticas foi estabelecido, formando o que é hoje um dos órgãos mais influentes do direito ambiental no mundo.

Enquanto o primeiro-ministro David Cameron, que defende a permanência na UE e têm o respaldo de líderes mundiais, diz que os britânicos ficarão mais pobres fora do bloco europeu, o ex-prefeito de Londres, Boris Johnson, estrela da campanha pela saída da UE, tenta provar o contrário. Ele alega que manter os cofres de Bruxelas cheios custa caro demais para o Reino Unido. Além disso, o populista Johnson – que está de olho no cargo de seu ex-amigo Cameron – explora a questão da imigração para convencer os eleitores de que só será possível controlar o fluxo de imigrantes se houver um rompimento com o bloco. A extrema-direita, claro, pega carona nesse discurso. As pesquisas mostram um eleitorado dividido e um resultado, imprevisível. Mas e o meio ambiente? A preservação ganha ou perde com um Reino Unido fora da UE?

Especialistas parecem concordar que, embora a UE não seja perfeita, tem permitido importantes avanços na área ambiental, aprovando legislações para promover o desenvolvimento sustentável que valem para todos os países membros. Como lembrou o jornal “The Independent”, basta olhar as praias britânicas para entender que as metas ambientais da UE trouxeram resultados. Elas eram, majoritariamente, um mar de esgoto na década de 70, mas hoje menos de 5% são consideradas impróprias para o banho.

Um estudo do Instituto de Política Ambiental Europeu (Ieep, na sigla em inglês) afirma que a possibilidade de o Reino Unido deixar a UE – o chamado Brexit (junção das palavras Britain e exit) – traria uma série de incertezas em relação aos planos ambientais do bloco, que vem fortalecendo nos últimos anos uma série de regras e estratégias comuns de preservação. Ou seja, o Brexit não é uma boa notícia para quem entende a luta ecológica como uma questão coletiva, que vai além das fronteiras nacionais.

“Embora o meio ambiente não tenha sido levado em consideração nos primeiros anos de desenvolvimento da UE, isso mudou dramaticamente. Um conjunto abrangente de políticas foi estabelecido, formando o que é hoje um dos órgãos mais influentes do direito ambiental no mundo”, diz o relatório. “Muitas empresas têm se beneficiado com o estabelecimento dessas regras comuns e de uma abordagem mais harmonizada. Normas comuns criaram um mercado novo e considerável para uma ampla gama de produtos mais ecológicos, que vão desde eletrodomésticos linha branca mais eficientes até automóveis e bens de consumo com menos produtos químicos tóxicos”, escrevem os especialistas do Ieep.

Uma pesquisa recém-divulgada pelo Royal Institute of International Affairs, em Londres, também chega à conclusão semelhante: no campo energético e de mudanças climáticas, permanecer na UE é a melhor opção para os britânicos. O setor energético britânico é cada vez mais integrado ao de seus vizinhos e dependente das importações que vêm do continente europeu ou passam por ele. Se sair da UE, o Reino Unido terá que renegociar todos os pontos desse pacote. Além disso, um novo governo poderia facilmente alterar, por exemplo, regras de controle do aquecimento global, já que não precisaria mais seguir as decisões conjuntas de Bruxelas. “No domínio da política energética e das alterações climáticas, permanecer na UE oferece o melhor equilíbrio entre as opções estratégicas para os interesses nacionais da Grã-Bretanha: o Reino Unido continuaria a se beneficiar do mercado de energia integrado, mantendo a influência sobre sua direção e minimizando incertezas para investimentos fundamentais”, diz o estudo, assinado por dois pesquisadores do instituto, Antony Froggatt e Thomas Raines.

Outro dado recente – e assustador – divulgado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) reforça os argumentos de quem acredita que, isoladamente, o governo britânico não se esforça o quanto deveria no combate à degradação ambiental. Segundo a OMS, mais de 80% dos moradores de áreas urbanas do planeta estão expostos a níveis prejudiciais de poluição do ar, que podem causar doenças respiratórias como asma e até aumentar o risco de ataque cardíaco, câncer de pulmão e derrame. A organização estima que, somente no Reino Unido, entre 40 mil e 50 mil pessoas morrem prematuramente por ano em decorrência de males causados pela péssima qualidade do ar. Dez cidades – entre elas Londres, Glasgow e Oxord – registram níveis de poluição acima do recomendado. Se optar por conduzir sua política ambiental fora da UE, o Reino Unido poderia ver esses índices piorarem ainda mais, vêm advertindo especialistas.

Uma eventual vitória do Brexit no plebliscito não significaria que os acordos ambientais seriam ignorados, mas entre os políticos que fazem campanha pela saída há nomes conhecidos por serem contra as metas estabelecidas pela UE. Um grupo de 13 especialistas, formado por acadêmicos e autoridades da área, também divulgou um comunicado alertando sobre os riscos representados pelo Brexit. As palavras da ex-diretora da Agência Ambiental, Lady Young, dão o recado: “Qualidade ambiental, ar limpo, oceanos saudáveis e a riqueza de recursos naturais só podem ser garantidos por colaborações que atravessam as fronteiras nacionais. Padrões comuns da UE promovem novas tecnologias e negócios. O Brexit paralisaria ou até reverteria quadro décadas de progresso”.

Claudia Sarmento

Jornalista, PhD em Mídia e Comunicação pela Universidade de Westminster e professora visitante do Departamento de Humanidades Digitais do King's College de Londres.

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Um comentário em “As frágeis fronteiras ambientais

  1. Hylton Sarcinelli Luz disse:

    O sentido transnacional da UE é um elemento muito importante no mundo, como experiência que reúne diferentes pontos de vista e interesses voltados para o compromisso de encontrar saídas que atendam a diversidade. Por esta razão vem sendo construídos mecanismos de diálogo e pactuação de regras em diversas áreas, dentre as quais se destaca a questão ambiental cujos limites não podem ser concernidos ao campo das fronteiras nacionais, muito menos aos interesses exclusivamente locais. Como tal, o propósito de colaboração, ainda que de prática difícil, vem gerando avanços expressivos e representam uma esperança no desenvolvimento de uma nova lógica que o mundo atual exige.

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