Um Brasil de cara nova, mas com estrutura etária mais envelhecida

A expectativa de vida ao nascer, que estava em 71,1 anos, em 2000, chegará a 83,9 anos em 2070. Foto Thiago Ribeiro/AGIF via AFP

Dados do IBGE apontam para um país cada vez mais feminino, diverso, de renda média e com expectativa de vida próxima dos 84 anos

Por José Eustáquio Diniz Alves | ArtigoODS 10 • Publicada em 26 de agosto de 2024 - 10:30 • Atualizada em 2 de setembro de 2024 - 11:26

A expectativa de vida ao nascer, que estava em 71,1 anos, em 2000, chegará a 83,9 anos em 2070. Foto Thiago Ribeiro/AGIF via AFP

O perfil demográfico brasileiro do século XXI será completamente diferente do retrato emoldurado nos primeiros 500 anos da história do país. O Brasil era um país rural, masculino, pobre, jovem, com a população concentrada no litoral e com uma baixa diversidade familiar e social.

Desde meados do século passado, o Brasil vem mudando e já é um país predominantemente urbano, feminino, de renda média, com envelhecimento da estrutura etária, menos litorâneo e mais plural em termos de estrutura familiar, de filiação religiosa e de composição de raça/cor. Esta nova feição vai se aprofundar ao longo século XXI.

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Conhecer a nova realidade demográfica nacional é fundamental para o exercício da cidadania, para a elaboração de políticas públicas e para o planejamento dos investimentos da iniciativa privada. O censo demográfico é o principal instrumento de cobertura, descoberta e revelação dos intrincados indicadores sociodemográficos.

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Em julho do ano passado o IBGE divulgou o resultado do recenseamento brasileiro indicando que foram contabilizados 203,1 milhões de habitantes no país, considerando a data de referência de 31 de julho de 2022. Este número causou surpresa, pois as projeções populacionais do IBGE (revisão 2018) estimava uma população de cerca de 2014 milhões de pessoas na mesma data.

Mas, como mostrei no artigo “As surpresas do Censo 2022 e a distribuição geográfica da população”, publicado aqui no # Colabora (Alves, 03/07/2023), o número apresentado pelo censo 2022 do IBGE veio abaixo do esperado, indicando que houve um erro de cobertura em torno de 6 a 8 milhões de pessoas.

Felizmente o IBGE realiza de forma independente, mas concomitantemente ao censo, uma enquete de avaliação, chamada de Pesquisa de pós enumeração (PPE) que tem o objetivo de avaliar a qualidade das informações do censo demográfico e identificar as possíveis omissões na cobertura.

No dia 22 de agosto de 2024, o IBGE divulgou os resultados da PPE e as novas projeções populacionais de 2000 a 2070. A metodologia utilizada – chamada de conciliação demográfica – analisou as informações de três censos consecutivos, os de 2000, 2010 e 202, além de considerar os dados de óbitos, nascimentos e migrações. O resultado foi uma revisão da população total para 210.862.983 em 01 de julho de 2022. Um ajuste de 3,9% em relação ao resultado subestimado apresentado pelo censo demográfico 2022.

As projeções populacionais de 2000 a 2070

O gráfico abaixo apresenta o tamanho da população brasileira de 2000 a 2070, segundo as novas projeções populacionais do IBGE (revisão 2024). Nota-se que a população total do país era de 174,7 milhões de habitantes no ano 2000, subiu para 210,9 milhões em 2022, deve chegar ao pico populacional de 220,4 milhões em 2041 e deve iniciar um período de decrescimento do número de habitantes a partir de 2042, devendo chegar a 199,2 milhões de habitantes em 2070. Pela primeira vez na história, a população brasileira vai experimentar uma redução contínua e consistente, a partir da década de 2040.

O principal vetor da mudança da dinâmica demográfica é a redução da taxa de fecundidade total (TFT). O gráfico abaixo mostra que a TFT era de 2,3 filhos por mulher em 2000 e caiu para 2,07 filhos por mulher em 2002, abaixo do nível de reposição. A TFT caiu ainda mais para 1,58 filho por mulher em 2022 e deve atingir o valor mais baixo da série na década de 2040, com 1,44 filho por mulher. Por fim, deve apresentar uma leve recuperação para 1,5 filho por mulher em 2070.

Paralelamente à redução das taxas de fecundidade, houve um significativo aumento da expectativa de vida ao nascer que estava em 71,1 anos no ano 2000, chegou a 76,2 anos em 2019, caiu 72,8 anos em 2021, em decorrência da pandemia da covid-19, mas já recuperou o nível pré-pandêmico em 2024, com 76,6 anos. A estimativa é de uma expectativa de vida, para ambos os sexos, de 83,9 anos em 2070.

O efeito conjunto da redução das taxas de fecundidade e do aumento da expectativa de vida resultou na mudança da estrutura etária. Em um primeiro momento caiu a percentagem de jovens e subiu a percentagem de adultos. Em um momento posterior caíram as percentagens de jovens e adultos, aumentando a percentagem de idosos.

O gráfico abaixo mostra a percentagem destes três grupos etários entre o ano 2000 e 2070. O grupo etário 0-14 anos tinha uma percentagem de 30% no ano 2000, caiu para 20% em 2024 e deve ficar em somente 12% em 2070. O grupo 15-59 anos tinha uma percentagem de 61,4% no ano 2000, atingiu o pico de 65,2% no quinquênio 2015-19 e deve cair para 50,3% em 2070. Já a percentagem do grupo de idosos, de 60 anos e mais de idade, era de 8,7% no ano 2000, atingiu 15,6% em 2024 e vai chegar a 37,8% em 2070.

O envelhecimento populacional será a principal característica da nova face da demografia brasileira. Pela primeira vez na história haverá mais idosos de 60 anos ou mais do que jovens de 0 a 14 anos, tanto no Brasil, quanto no mundo.

Como mostrei no artigo “O tsunami prateado no Brasil”, publicado aqui no # Colabora (Alves, 05/08/2024), a transição demográfica (redução das taxas de mortalidade e de fecundidade) é uma pré-condição para o progresso social. O aumento da expectativa de vida é não só um direito individual, mas também uma condição necessária para o aumento da produtividade e da criatividade das pessoas das sucessivas gerações.

A queda da fecundidade acompanha a alteração no investimento na quantidade de filhos para o investimento na qualidade de vida das crianças.  A redução da proporção de jovens é benéfica para a sociedade que passa a contar com uma juventude mais preparada para os desafios da sociedade pós-industrial.

O envelhecimento populacional traz desafios, mas também oportunidades. Os idosos não devem ser vistos como um “peso morto” para a economia, mas sim como uma fonte de criatividade e contribuição para os setores produtivos e reprodutivos das relações sociais.

Garantir um envelhecimento populacional saudável e sustentável é um desafio multidimensional e intersetorial que requer ações integradas em várias áreas., tais como: Saúde e Bem-Estar, Inclusão Social, Ambiente Construído, Educação e Formação, Economia e Trabalho, Diversidade etária nas empresas e na sociedade, Combate ao etarismo, Tecnologia e Inovação, Garantir a resiliência financeira, Políticas Públicas e Governança.

As projeções populacionais do IBGE trazem muitas informações úteis para o planejamento econômico e social. Mas, principalmente, confirmam os novos traços da configuração demográfica brasileira, que será menos jovem, mas terá características renovadas que poderão ser aproveitadas para superar as adversidades nacionais e garantir a tão desejada prosperidade social e ambiental do país.

Referências:

ALVES, JED. As surpresas do Censo 2022 e a distribuição geográfica da população, # Colabora, 03/07/2023 https://projetocolabora.com.br/ods11/as-surpresas-do-censo-2022-e-a-distribuicao-geografica-da-populacao/

ALVES, JED. O tsunami prateado no Brasil, # Colabora, 05/08/2024

https://projetocolabora.com.br/ods11/o-tsunami-prateado-no-brasil-39-milhoes-com-mais-de-60-anos-em-2029/

IBGE. Projeções da População, 22/08/2024 https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9109-projecao-da-populacao.html?edicao=41053&t=resultados

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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