A marchinha pro fim

As águas vão rolar, garrafa cheia eu não quero ver sobrar…Foto CrowdSpark/Ellan Lustosa

É Carnaval, gente, vamos esquecer o resto: Ô abre alas que eu quero passar...

Por Leo Aversa | ArtigoODS 9 • Publicada em 9 de fevereiro de 2018 - 09:26 • Atualizada em 9 de fevereiro de 2018 - 18:03

As águas vão rolar, garrafa cheia eu não quero ver sobrar…Foto CrowdSpark/Ellan Lustosa
As águas vão rolar, garrafa cheia eu não quero ver sobrar...Foto CrowdSpark/Ellan Lustosa
As águas vão rolar, garrafa cheia eu não quero ver sobrar…Foto CrowdSpark/Ellan Lustosa

Fevereiro de 2018. O Rio de Janeiro está quebrado e entregue à violência. Industrias fechando, comércio falindo, desempregados se multiplicando e favelas aterrorizadas por tiroteios diários.

É o caos.

Nada disso é problema para João Eugênio Cavalcanti Sá, o Johnny Sá. O carnaval tá chegando e Johnny tem uma intensa programação de blocos. Tem o Suvaco, o Prata, o Céu, a festa não pode parar. Aqui é carnaval, é alegria, repete sempre enquanto toca seu tamborim imaginário perto da bateria. Hoje ele vai para o Treta Cansada, um bloco da Zona Sul que já mudou o lugar do desfile três vezes por conta da violência. A Cansada nunca desanima. No fim de semana foi decidido que o bloco ia sair do Galeto Leblon até o Jobi. Um percurso pequeno e familiar, pra não ter problema.

Na concentração, Johnny anima o amigo Beto, que está chateado porque o porteiro do prédio perdeu o filho em um assalto. Deixa disso Bob, é carnaval, não é hora de tristeza! Essas coisas acontecem, o garoto deve ter reagido, sei lá, aqui é carnaval, é alegria! Vamulá! Mamãe eu quero, mamãe eu quero…

Beto pega uma cerveja e começa a dançar. Agora o problema é a Tetê, namorada do Max, que está preocupada porque depois do bloco eles vão para Itaipava e a Linha Vermelha foi fechada por um tiroteio. Mais uma chance do Johnny transbordar a sua animação carnavalesca: Tetê, Max, deixem disso, alguém vai resolver essa parada, a polícia, sei lá. Vamos festejar, o bloco vai sair! As águas vão rolar, garrafa cheia eu não quero ver sobrar…

Vamulá, gente! Mamãe eu quero, mamãe eu quero…Foto CrowdSpark/Ellan Lustosa

O bloco sai com mais vendedores de cerveja que foliões. Com o desemprego, todos se viram como podem: vendem bebida, serpentina, confete, fantasias… Johnny comemora as novas adesões: não disse que o carnaval levanta a cidade? Olhaí essa gente trabalhando na folia! É a indústria do Carnaval! Max vê a cena e ensaia uma melancolia. Ô Max, deixa de ser agourento, larga esse baixo astral! Johnny não sossega, é carnaval, ele quer diversão, ele é carioca, ele merece. Ei, você aí, me dá um dinheiro aí, me dá um dinheiro aí..

O Treta Cansada segue com seu cortejo de isopores. Ali estão funcionários publicos com salários atrasados, ex-gerentes de empresas ligadas ao petróleo, vendedores de lojas que fecharam. E no meio deles, Johnny Sá, cantando todas as marchinhas. É tanto entusiasmo que acaba contagiando Max, Tetê e Beto. Os quatro saem pulando pela Dias Ferreira e não percebem o bonde de traficantes do Vidigal que vem entrando pela Ataulfo, fugindo da policia que está logo atrás.

Começa mais um tiroteio na cidade.

Os foliões correm para todos os lados, o pessoal do isopor tenta proteger a mercadoria. Um tiro acerta um vendedor de cerveja na perna, outro um folião no ombro. A perseguição continua pela Ataulfo em direção a Ipanema, deixando um rastro de destruição. Max, Tetê, Beto e Johnny correm para ajudar o vendedor e o folião. Vamos levar pro Miguel Couto! Johnny avisa que vai ficar, a folia precisa continuar. É carnaval, ele quer diversão, ele é carioca, ele merece. Como o Treta Cansada se dispersou e a Ataulfo foi fechada pela polícia, segue sozinho pelo meio do asfalto, cantando e tocando o seu tamborim imaginário.

Ô abre alas que eu quero passar…

Leo Aversa

Leo Aversa fotografa profissionalmente desde 1988, tendo ganho alguns prêmios e perdido vários outros. É formado em jornalismo pela ECO/UFRJ mas não faz ideia de onde guardou o diploma. Sua especialidade em fotografia é o retrato, onde pode exercer seu particular talento como domador de leões e encantador de serpentes, mas também gosta de fotografar viagens, especialmente lugares exóticos e perigosos como Somália, Coreia do Norte e Beto Carrero World. É tricolor, hipocondríaco e pai do Martín.

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