ODS 1
Receba as colunas de Oscar Valporto no seu e-mail
Veja o que já enviamosUm Natal sem Fome e iluminado pelas árvores flutuantes do Rio
Campanha se mobiliza para arrecadar milhares de toneladas de alimentos nesta época que deveria unir solidariedade e celebração
No espírito natalino, este #RioéRua pegou o metrô para conhecer as gigantescas árvores flutuantes que voltaram a iluminar o dezembro do Rio de Janeiro: além da Árvore de Natal da Lagoa, erguida pela primeira vez exatamente 30 anos atrás, há outra Árvore de Natal, em 2025, nas águas da enseada de Botafogo. Quando cheguei ao primeiro destino, outra tradição natalina, muito mais significativa, havia mudado o rumo dessa prosa. Estações de metrô são alguns dos pontos de coleta, no Rio, da campanha Natal sem Fome, lançada pela Ação da Cidadania, do sociólogo Betinho (Herbert de Souza), em 1993, e que, agora em 2025, tem como tema “Ilumine o Natal de quem precisa”.
Leu essa: Programa familiar na Lagoa: árvore de Natal flutuante e iluminada
“Quem tem fome, tem pressa”. A frase de Betinho inspirou a primeira campanha Natal sem Fome, lançada meses depois da criação da Ação da Cidadania. O irmão do Henfil – que, após o golpe militar de 1964, ficou sete anos na clandestinidade e oito anos exilado – sabia que, para acabar com a fome, eram necessárias profundas mudanças estruturais e sociais neste Brasil marcado pela desigualdade, mas insistia que quem estava com fome não podia esperar essas mudanças. “Quem tem fome, tem pressa” – e, em 1993, o mapa do Ipea indicava 32 milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza, sofrendo com alguma insegurança alimentar.


Betinho morreu em 1997, mas a Ação da Cidadania e o Natal sem Fome prosseguiram, com a campanha de arrecadação de alimentos no fim do ano, batendo recordes de distribuição de cestas básicas e ampliando a mobilização, que começou aqui no Rio de Janeiro, para o Brasil inteiro, hoje com mais de três mil comitês comunitários, formados por voluntários, espalhados por todos os estados. A meta de 2025 era distribuir mais de duas mil toneladas de alimentos em todo o país – 20 anos atrás, a Ação da Cidadania festejava ter passado de 900 toneladas. Mas os dirigentes da ONG – o filho de Betinho, Daniel de Souza, é o presidente do Conselho – garantem que a meta já foi batida e que a arrecadação pode chegar a 7 mil toneladas.
Receba as colunas de Oscar Valporto no seu e-mail
Veja o que já enviamosNestes 32 anos, desde a primeira campanha, o Brasil vem reduzindo o número de pessoas enfrentando o drama da fome. Em 2014, após duas décadas de ações de distribuição de renda, iniciadas timidamente nos governos FH e aceleradas sob a presidência de Lula e Dilma, o Brasil saiu do Mapa da Fome, criado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), ficando abaixo do patamar de 2,5% da população em risco de subnutrição ou de falta de acesso à alimentação suficiente. A fome voltaria a crescer – e o Brasil voltaria ao mapa – em 2022, com a pandemia de covid-19 e sistemático desmonte das políticas sociais, promovidos por Jair Bolsonaro e sua turma.


Em 2025, o Brasil voltou a sair do Mapa da Fome. E, entre 2023 e 2024, 8,6 milhões de pessoas saíram da pobreza e 1,9 milhão deixaram a condição de miséria no Brasil, de acordo com o IBGE. Entretanto, como lembram os organizadores da campanha Natal sem Fome, dados do mesmo IBGE mostram que cerca de 24,2% dos domicílios brasileiros ainda vivem com algum grau de insegurança alimentar, o que representa mais de 60 milhões de pessoas sem acesso pleno e regular à alimentação adequada. “É importante termos saído do Mapa da Fome, mais uma vez, mas a insegurança alimentar está longe de ser erradicada”, disse Daniel Souza no lançamento da campanha.
Por isso, os cariocas e visitantes do Rio, que já estão ocupando as orlas da enseada de Botafogo e da Lagoa para ver os shows de luzes das árvores de Natal, devem se inspirar para ajudar no tema da campanha – “Ilumine o Natal de quem precisa” – e fazer sua doação: o site e as redes sociais da Ação da Cidadania mostram o caminho. Ignorem ideias como as da infeliz vereadora que aproveitou dezembro e o espírito natalino para criticar quem distribui quentinhas para quem tem fome.


A solidariedade faz parte do que entendo do espírito natalino. Mas também a celebração: o Rio de Janeiro agradece as iniciativas de montar as árvores flutuantes e iluminadas. Nas duas orlas, famílias aproveitam o programa gratuito, fazem piqueniques, consomem dos ambulantes para movimentar a economia, alimentam essa cultura rueira do Rio.
Na nossa sociedade campeã de desigualdade, é difícil imaginar um Natal totalmente sem Fome e totalmente iluminado. Mas fim de ano é sempre uma época de inspirar sonhos e renovar desejos.
Apoie o #Colabora
Queremos seguir apostando em grandes reportagens, mostrando o Brasil invisível, que se esconde atrás de suas mazelas. Contamos com você para seguir investindo em um jornalismo independente e de qualidade.












































