ODS 1
Mulheres vivas: protestos em 90 cidades contra epidemia de feminicídio


Domingo tem registro de mais dois casos de assassinato de mulheres em São Paulo; ministras e primeira-dama participam de ato em Brasília


Manifestantes realizaram atos em pelo menos 90 cidades do Brasil neste domingo (07/12) para protestar contra o aumento dos casos de feminicídio e outras formas de violência contra as mulheres. Segundo o movimento Levante Mulheres Vivas, houve atos em 20 estados e no Distrito Federal. A mobilização nacional foi convocada após uma onda de feminicídios recentes que abalaram o país.
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O maior ato foi em São Paulo onde mais de 10 mil pessoas – mulheres, na grande maioria – se reuniram na Avenida Paulista. O protesto foi marcado por referência a dois casos registrados neste domingo: o assassinato da farmacêutica Daniele Guedes Antunes, de 38 anos, em Santo André, e a morte de Milena de Silva Lima, de 27 anos, em Diadema, ambas atacadas por ex-companheiros.
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Veja o que já enviamosA farmacêutica foi morta a facadas pelo ex-marido, Cristian Antunes, na manhã de domingo em Santo André, no ABC Paulista. Segundo a família, Daniele Guedes Antunes foi atacada dentro de casa pelo ex-marido, que não aceitava o término do relacionamento dos dois. Eles estavam casados havia 20 anos e tinham um casal de filhos – a mais nova, de 11 anos, assistiu o assassinato da mãe. Cristian Antunes foi preso em flagrante e confessou o crime.
Em apartamento de Diadema, na Região Metropolitana de São Paulo, Milena Lima, de 27 anos, foi morta pelo ex-companheiro, João Victor Fernandes, de 30, que também morreu após se ferir com a mesma faca. O casal estava separado desde setembro e tinha um filho: a polícia registrou a ocorrência como feminicídio seguido de suicídio
Outras vítimas como Allane Pedrotti e Laysa Pinheiro, assassinadas a tiros por um colega de trabalho no Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet) do Rio de Janeiro; Isabely Gomes, morta com os quatro filhos em incêndio provocado pelo marido em Recife; e Catarina Kasten, estuprada e assassinada em uma trilha em Florianópolis quando ia para a aula de natação, foram citadas em discursos ao longo da manifestação.
Também foi lembrado pelas mulheres nos discursos, o ataque a Tainara Souza Santos que teve as pernas amputadas após ser atropelada e arrastada por cerca de um quilômetro, enquanto ainda estava presa embaixo do veículo. O motorista, Douglas Alves da Silva, foi preso e acusado do crime. Tainara segue internada em estado grave na UTI de um hospital na capital paulista.
Cerca de 3,7 milhões de mulheres brasileiras viveram um ou mais episódios de violência doméstica nos últimos 12 meses, segundo o Mapa Nacional da Violência de Gênero. Em 2024, 1.459 mulheres foram vítimas de feminicídios. Em média, cerca de quatro mulheres foram assassinadas por dia em 2024 em razão do gênero. Em 2025, o Brasil já registrou mais de 1.180 feminicídios e quase 3 mil atendimentos diários pelo Ligue 180, segundo o Ministério das Mulheres.


Atos contra feminicídio pelo Brasil
A mobilização contra o feminicídio encheu a Avenida Paulista em um grande ato com a participação de milhares de mulheres e também de homens. Nas faixas e nos discursos, o Levante Mulheres Vivas, organizador do protesto, pediu o fim da violência contra as mulheres, com penas mais fortes para crimes motivados por misoginia, e o combate ao discurso de ódio. De acordo com o movimento, houve protestos semelhantes em pelo menos 90 cidades de 20 estados e no Distrito Federal
O ato trouxe para a discussão questões estruturais que reforçam e mantém a violência de gênero. Entre os temas estavam legislação, liberdade e respeito. “Todas merecem dignidade, todas merecem proteção. Tomamos a rua para dizer que nenhuma mulher será esquecida”, disse a deputada federal Erika Hilton (Psol/SP) durante o protesto.
Durante as manifestações, os participantes levavam centenas de cartazes que pediam leis severas contra o feminicídio. “Existe uma cultura de opressão às mulheres, uma cultura milenar. E tem muita mulher morrendo por causa disso, morrendo aos poucos com terrorismo psicológico, morrendo por falta de espaço na sociedade, dentro de casa, no trabalho. E a gente precisa muito falar disso”, afirmou a comerciante Lilian Lupino, 47 anos à Agência Brasil. “Os homens se sentem protegidos por falta de leis severas de punição”, frisou.
No Rio de Janeiro, a manifestação ocupou um trecho da Avenida Atlântica, na orla de Copacabana, na Zona Sul da cidade. Em entrevista à Alma Preta, a deputada estadual do Rio de Janeiro Renata Souza (PSOL) salientou a importância do ato, ressaltando a necessidade do protesto para as mulheres negras. “É super importante estarmos nas ruas hoje, porque aqui tem um grito. Um grito de desespero, mas um grito também de esperança para que essa situação mude. Não é possível que essa epidemia de feminicídio continue a vulnerabilizar, a inviabilizar a vida das mulheres. Em especial das nossas mulheres negras, porque quando a gente vê os dados estatísticos, são as mulheres negras as principais vítimas de violência doméstica e feminicídio”, disse a deputada.
Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), o estado do Rio registrou, até novembro de 2025, 79 casos de feminicídio e 242 tentativas. Na quarta-feira (03/12), Aline Nascimento foi atendida em um hospital na Zona Norte do Rio após ser esfaqueada em Irajá. Ela contou à polícia que foi agredida pelo ex-companheiro, Emerson William Marcolan Lima. A vítima tem uma medida protetiva contra Emerson, que já responde por tentativa de feminicídio por ter tentado arremessá-la de uma janela do seu apartamento, no quarto andar.
Em Florianópolis, mulheres e homens participaram de uma caminhada que começou por volta das 13h na cabeceira da Ponte Hercílio Luz e seguiu até o Terminal de Integração do Centro (Ticen). O ato também homenageou a professora Catarina Kasten, de 31 anos, estuprada e assassinada em uma trilha no dia 21 de novembro. O autor do crime, que confessou, foi preso no mesmo dia e responde por feminicídio qualificado, estupro e ocultação de cadáver.
No Recife, milhares de manifestantes participaram do ato pelo fim do feminicídio e da violência contra as mulheres. Segundo a organização do evento, cerca de 5 mil pessoas se reuniram na mobilização. Com cartazes, faixas e camisetas, coletivos e movimentos sociais cobraram a responsabilização dos agressores. Manifestantes lembraram casos recentes de feminicídio de Recife como o assassinato de Isabele Gomes de Macedo, que morreu com os quatro filhos num incêndio provocado pelo companheiro na comunidade Icauã, na Zona Oeste da capital pernambucana.


Ministras e primeira-dama participam de protesto
A manifestação contou com a presença de um ministro e seis ministras, entre elas as da pasta da Mulher, Cida Gonçalves, da Igualdade Racial, Anielle Franco, e das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, além de deputadas federais, da primeira-dama Janja Lula da Silva e diversas lideranças populares. Sob fortes pancadas de chuva, milhares de pessoas participaram do protesto no Distrito Federal (DF) para denunciar a violência contra a mulher, o feminicídio e a omissão do Estado na proteção e prevenção à violência de gênero.
A ministra da Mulher, Márcia Lopes, defendeu que as mulheres precisam ocupar 50% dos cargos políticos no Brasil. “Não vamos votar em homem que agrida, que ofenda as mulheres. Não vamos votar”.
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, disse que essa é uma luta civilizatória, que precisa da participação dos homens. “É muito importante ter os homens ao lado da gente nessa caminhada. Essa luta é de toda a sociedade. Temos que unir forças para tirar essa chaga da sociedade. Nós temos um problema histórico e cultural de subordinação das mulheres e temos que mudar isso”, afirmou.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, lembrou sua irmã Marielle Franco, vereadora carioca assassinada em 2018 no Rio de Janeiro (RJ). “Quando Marielle foi assassinada da maneira que foi, com cinco tiros na cabeça, logo depois a mãe Bernadete, poucos anos depois, com 21 tiros na cabeça, há um recado dado para essas mulheres. A gente tá aqui hoje pra dizer que vai permanecer viva, de pé, lutando, ocupando todos os espaços, eles queiram ou não. A gente vai permanecer”, afirmou.
Mesmo se recuperando de uma cirurgia, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, participou do ato em uma cadeira de rodas. Ela lembrou que a violência contra as mulheres indígenas segue invisível. “Essa violência que a gente vê hoje em redes sociais, em noticiários, nos territórios indígenas acontece igualmente e nem notícia vira. Elas continuam no anonimato e ainda nem estatística viraram”, lamentou.
Também participou do ato a ministra da Ciência e Tecnologia, Luciana Santos, que argumentou que a luta das mulheres contra a violência é secular. “Isso é para que a gente possa ter a dimensão da batalha que tem pela frente. Por isso, a luta para que tenhamos salário igual para função igual, creches, direitos para que, nas universidades, as mulheres que sigam a carreira científica possam avançar sem nenhum tipo de empecilho”, afirmou.
Em sua fala, a primeira dama Janja Lula da Silva lamentou os feminicídios e pediu medidas mais duras contra o assassinato de mulheres. Que hoje seja um dia que fique marcado na história desse movimento das mulheres pelo Brasil. A gente precisa de penas mais duras para o feminicídio. Não é possível um homem matar uma mulher e, uma semana depois, estar na rua para matar outra. Isso não pode acontecer”, disse.
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