Congresso dos EUA terá recorde de mulheres – e 51 não são brancas

As deputadas democratas Alexandria Ocasio-Cortez, Ayanna Pressley, Ilhan Omar e Rashida Tlaib, na Câmara dos EUA: integrantes do chamado “Esquadrão”, formado por parlamentares progressistas sistematicamente atacadas por Donald Trump, foram todas reeleitas, confirmando avanço feminino (Foto: Alex Wroblewski/AFP)

Eleição mostra avanço feminino no Legislativo com recorde também de candidaturas de negras, latinas e descendentes de orientais e indígenas

Por The Conversation | ODS 16ODS 5 • Publicada em 17 de novembro de 2020 - 13:15 • Atualizada em 30 de novembro de 2020 - 12:14

As deputadas democratas Alexandria Ocasio-Cortez, Ayanna Pressley, Ilhan Omar e Rashida Tlaib, na Câmara dos EUA: integrantes do chamado “Esquadrão”, formado por parlamentares progressistas sistematicamente atacadas por Donald Trump, foram todas reeleitas, confirmando avanço feminino (Foto: Alex Wroblewski/AFP)

Sharon Austin*

As mulheres ganharão pelo menos 14 cadeiras no 117º Congresso dos Estados Unidos, estabelecendo um novo recorde de representação feminina. Em 2018, o país elegeu 127 mulheres – e 48 mulheres de cor – para a Câmara e o Senado. Após as eleições de novembro, pelo menos 141 mulheres, incluindo 51 mulheres não brancas, farão o juramento de posse no próximo dia 3 de janeiro. Oito corridas envolvendo mulheres ainda não haviam tido seus resultados anunciados até 16 de novembro, o que significa que esse número ainda pode crescer.

As mulheres serão pelo menos 27% de a Câmara e 24% do Senado. Os números do Senado não incluem a vice-presidente eleita Kamala Harris, ou Kelly Loeffler, uma republicana da Geórgia envolvida em um segundo turno que ocorrerá após a posse do Congresso. As mulheres representam 50,52% da população dos EUA. Um desempenho forte das mulheres republicanas ajudou a impulsionar essa tendência, com pelo menos 36 atuando no próximo Congresso, em comparação com as 22 atuais.

Ao longo de minha carreira de mais de 20 anos como professora de ciências políticas, estudei a representação feminina em eleições para prefeito, congressista, governador e presidencial. Aqui está meu olhar para a demografia feminina no Congresso após as eleições de 2020.

Costuma-se dizer, aqui nos Estados Unidos, que “Quando as mulheres concorrem, as mulheres ganham”; e 2020 também viu um número recorde de mulheres concorrendo nas eleições para o Congresso. No total, 643 mulheres foram candidatas às eleições primárias para o Congresso, incluindo um número recorde de mulheres asiáticas ou das ilhas do Pacífico, latinas, do Oriente Médio ou do norte da África e nativas americanas (indígenas). As mulheres negras também estabeleceram um novo recorde em 2020, com 117 inscritos nas primárias partidárias para a Câmara e 13 para o Senado dos EUA, de acordo com o Center for American Women and Politics.

Muitas das mulheres eleitas pela primeira vez para o Congresso em 2018 renovaram seus mandatos. Todas as quatro membros do chamado “Esquadrão” foram reeleitas. Essas mulheres – Ayanna Pressley, deputada negra do Massachussets, Ilhan Omar, muçulmana e nascida na Somália e reeleita por Minnessota, Alexandria Ocasio-Cortez, deputada de descendência portorriquenha de Nova York, e Rashida Tlaib, filha de imigrantes palestinas do Michigan – são congressistas democratas de cor conhecidas por suas políticas progressistas, incluindo o New Deal Verde., que sofreram muitos ataques de Donald Trump.

Também foram reconduzidas ao Congresso mulheres eleitas pela primeira vez em 2018, como a democrata Lauren Underwood de Illinois, vencedora em um distrito republicano predominantemente branco; Jahana Hayes, a primeira mulher negra a representar Connecticut; e Lucy McBath, da Geórgia, vencedora democrata em um distrito ocupado por republicanos por quase quatro décadas. Essas reeleições provam que suas vitórias na “onda rosa” de 2018 não foram um acaso e que eles têm um poder real de permanência no Congresso.

Em algumas corridas para o Congresso em 2020, as mulheres afro-americanas correram umas contra as outras – um sinal de sua forte participação. Por exemplo, Val Demings da Flórida, Frederica Wilson da Flórida e Nikema Williams da Geórgia – que sucederá o falecido ícone dos direitos civis John Lewis – venceram suas disputas para o Congresso após derrotarem outras mulheres negras.

Enfermeira e ativista do Black Lives Matter, Cori Bush comemora sua eleição para o Congresso: mulheres serão 27% da Câmara e 23% do Senado (Foto:
Enfermeira e ativista do Black Lives Matter, Cori Bush comemora sua eleição para o Congresso: mulheres serão 27% da Câmara e 23% do Senado (Foto: Michael B. Thomas/AFP)

Novatas para ficar de olho

A classe de calouras na Câmara de Representantes (deputados) dos Estados Unidos incluirá pelo menos 26 mulheres no primeiro mandato. Cori Bush, uma ativista Black Lives Matter, tornou-se a primeira congressista negra do Missouri. Ela representa um distrito que inclui as cidades de St. Louis e Ferguson, o local do assassinato policial do adolescente afro-americano Michael Brown em 2014. Ferguson também elegeu seu primeiro negro e sua primeira prefeita este ano. Bush derrotou o representante afro-americano dos EUA William Lacy Clay. Clay e seu pai representaram o distrito por mais de 50 anos.

A lista de mulheres não brancas que se juntaram à Câmara pela primeira vez inclui a ex-jornalista da Telemundo Maria Elvira Salazar, uma republicana que destituiu Donna Shalala na Flórida, e a advogada Teresa Leger Fernandez, uma democrata do Novo México. Marilyn Strickland, a ex-prefeita de Tacoma, Washington, será a primeira mulher norte-coreana eleita para o Congresso e a primeira representante negra do estado de Washington.

Nem todas as mulheres tiveram sucesso. Joyce Elliott, do Arkansas, ex-professora e veterana deputada estadual, fracassou em sua candidatura para se tornar a primeira congressista afro-americana de Arkansas. A democrata Pam Keith, da Flórida, advogada e militar e reformada, perdeu por uma larga margem para seu oponente republicano. Patricia Timmons-Goodson, primeira integrante afro-americana da Suprema Corte da Carolina do Norte – cuja indicação para cortes federais por Barack Obama foi bloqueada pelos republicanos – não conseguiu ganhar uma cadeira no Congresso.

Quem também não se elegeu foi Marquita Bradshaw, do Tennessee, uma mãe solteira e ativista ambiental que teria sido a primeira mulher negra do Tennessee no Congresso se tivesse vencido. Tamika Hamilton da Califórnia, Vivian Childs da Geórgia, Kimberly Klacik de Maryland e Lavern Gore de Ohio são todas republicanas que concorreram em distritos democratas urbanos, mas nenhuma ganhou na noite da eleição. Todas as congressistas negras eleitas – com exceção de Mia Love, de Utah, que cumpriu dois mandatos na Câmara – são democratas, sugerindo que o caminho para a vitória é especialmente íngreme para as mulheres republicanas negras.

Candace Valenzuela teria se tornado a primeira afro-latina no Congresso, mas perdeu sua corrida para o 24º distrito congressional do Texas para a republicana Beth Van Duyne, uma ex-autoridade do governo Trump. Embora tenham perdido, todas essas candidaturas sugerem que mais mulheres de cor – não brancas – continuarão a concorrer ao Congresso como democratas e republicanas e podem vencer na próxima vez.

Um Parlamento de homens brancos

Durante a maior parte de sua história, os membros de ambas as casas do Congresso dos Estados Unidos foram homens brancos. A monotonia começou a ser quebrada em 1916, quando Jeannette Rankin, de Montana, ganhou a eleição como a primeira congressista. Em 1964, Patsy Mink, do Havaí, se tornou a primeira asiático-americana eleita para o congresso. A primeira latina, Ileana Ros-Lehtinen, da Flórida, só foi eleita em 1989.

Em 1968, a falecida Shirley Chisholm se tornou a primeira mulher negra eleita para o Congresso. Quatro anos depois, mais duas mulheres negras chegaram ao Congresso, Barbara Jordan do Texas e Yvonne Brathwaite-Burke da Califórnia. Chisholm chamou as mulheres negras de “catalisadoras de mudança” na política. A deputada Maxine Waters, uma democrata da Califórnia, certa vez tuitou: “Não posso ser intimidada e não vou a lugar nenhum”.

A teoria da interseccionalidade da professora Kimberlé Crenshaw – jurista, ativista dos direitos civis e docente das universidades da Califórnia e de Columbia – sugere que as mulheres negras são discriminadas por causa da “intersecção” de suas identidades raciais, de gênero e de classe. Um resultado é que eles encontram desvantagens ao se candidatarem.

Algumas das mulheres mencionadas aqui enfrentaram desvantagens relacionadas à sua raça, gênero ou classe ao concorrer contra concorrentes históricos e bem financiados. No entanto, meu trabalho no campo das mulheres e da política também sugere que a longa tradição de liderança política feminina negra na América está ganhando impulso. Apesar das derrotas de algumas mulheres, sua representação aumentou e continuará aumentando no Congresso.

*Sharon Austin é professora de Ciência Política da Universidade da Flórida

Tradução de Oscar Valporto

The Conversation

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