Retrocessos em um ano e uma semana

Independentemente do fôlego político de Temer, gestão de presidente asfixiou programas sociais

Por Adriana Barsotti | ODS 4 • Publicada em 18 de maio de 2017 - 20:23 • Atualizada em 10 de junho de 2017 - 14:12

BRAZIL, Brasilia: Brazil’s President, Michel Temer, reject calls to quit during a brief news conference on May 18, 2017 in the Palácio do Planalto in Brasilia, Brazil. – Citizen Staff
Temer: em pronunciamento no Palácio do Planalto, o presidente disse ao povo que fica. Foto: Citizen Staff
Temer: em pronunciamento no Palácio do Planalto, o presidente disse ao povo que fica. Foto: Citizen Staff

Há exatos um ano e uma semana no cargo, não se sabe hoje qual será o fôlego do presidente Michel Temer, que nesta quinta-feira (18/5) passou a ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pela denúncia de que teria dado o aval à compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na prisão. Temer foi gravado por Joesley Batista, um dos sócios do frigorífico JBS. Independentemente de sua sobrevida política, dados comprovam que os programas sociais foram asfixiados nos últimos 372 dias.

Quando o governo completou um ano, há uma semana, a ONG Alerta Brasil divulgou um documento mapeando um direito perdido por dia. Para a entidade, “a gestão foi marcada pelo verbo perder”. A ONG destacou uma política pública por mês e como ela ela estaria sendo desmontada. A lista começa pela democracia e termina, em maio de 2017, pela reforma da Previdência. As projeções feitas por especialistas no assunto mostram que a maioria dos brasileiros, pelas novas regras propostas, morreria sem conseguir se aposentar.

À conclusão semelhante chegou Fernando Molica, aqui no Colabora. Em reportagem, ele alertou que moradores de 36 dos 96 distritos da cidade de São Paulo corriam o risco de morrer antes da obtenção da aposentadoria pelas novas regras da reforma da Previdência proposta por Temer. Em 17 distritos paulistanos, a expectativa de vida é inferior a 60 anos. Na menor delas, o tempo médio de vida é de 53,85 anos, o que resulta numa diferença de mais de 25 anos em relação ao melhor índice registrado na cidade. Não por acaso, o bairro Alto de Pinheiros, onde está a casa de Michel Temer. Ali, os moradores vivem, em média, 79,67 anos.

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Reportagem do site Intercept Brasil também alertou para a perda dos direitos conquistados. Helena Borges, a partir da contribuição dos leitores, listou dez “afrontas à Constituição”. Na ordem cronológica, encabeça a lista a perda do voto, com o impeachment da presidente Dilma Rousseff e a posse de Temer. Na sequência, o site lista perdas nas áreas de direitos humanos, educação, trabalho, saúde, moradia, cultura e lazer, transporte, previdência social e assistência social. “Temer rasgou o programa de governo que o elegera e seguiu as diretrizes apontadas justamente pela chapa que se colocava como oposição”, critica o texto.

Reforma da Previdência: aposentadoria chega antes da morte em 36 distritos de SP. Foto de FRANK MAY / picture alliance / DPA

Na educação, houve um freio na expansão do nível superior, com o corte de 40% nas verbas de investimento, como revelou reportagem de Luciana Conti. Na saúde, até mesmo o exemplar programa de prevenção à Aids foi alvejado. Pela primeira vez em 31 anos de combate à doença, o país não mandou seus principais técnicos e gestores no controle da epidemia para o Encontro de Alto Nível das Nações Unidas em HIV/Aids, como apontou Leonardo Valente. Triste também foi a constatação de Ítala Maduell: os níveis de desemprego e miséria retrocederam à década de 1990, quando teve início a campanha de Betinho contra a fome. Da nova classe média, tão festejada nos anos 2000, assistimos agora à expansão dos “novos pobres”. Igualmente desoladora é a reforma trabalhista, mas Leo Aversa conseguiu tratar do tema com bom humor.

À lista de perdas do Intercept, acrescentamos mais três itens. Está em curso no Congresso proposta do deputado Mauro Pereira, do PMDB de Temer, que representa um golpe no licenciamento ambiental. O agronegócio e grandes obras de infraestrutura podem ficar isentos de restrições para implantar novos projetos, denunciou Liana Melo em reportagem. A segurança também não mereceu a devida atenção. O Plano Nacional de Redução de Homicídios está sem verbas, o que levou ONGs a se mobilizarem por conta própria para atacar o problema, revelou Aydano André Motta. Por fim, a nação assistiu perplexa à ascensão do machismo: o governo Temer, quando tomou posse. era 100% masculino, observou Roberta Jansen. Tal composição de governo não se via no país desde a presidência do general Ernesto Geisel, em plena ditadura militar. O presidente, após as críticas, nomeou representantes do sexo feminino, mas permaneceu no ar a atmosfera da “bela, recatada e do lar”.

Adriana Barsotti

É jornalista com experiência nas redações de O Estado de S.Paulo, IstoÉ e O Globo, onde ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo com a série de reportagens “A história secreta da Guerrilha do Araguaia”. Pelo #Colabora, foi vencedora do Prêmio Vladimir Herzog, em 2019, na categoria multimídia, com a série "Sem Direitos: o rosto da exclusão social no Brasil", em um pool jornalístico com a Amazônia Real e a Ponte Jornalismo. Professora Adjunta do Instituto de Arte e Comunicação Social (Iacs), na Universidade Federal Fluminense (UFF), é autora dos livros “Jornalista em mutação: do cão de guarda ao mobilizador de audiência” e "Uma história da primeira página: do grito no papel ao silêncio no jornalismo em rede". É colaboradora no #Colabora e acredita (muito!) no futuro da profissão.

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