O perigo na palma da mão

Uma criança com um celular na mão está exposta há muitos perigos. Foto: www.mien.be / Image Source

Como negar o celular a uma criança e evitar o risco de ela virar uma 'sequelada digital' se os pais vivem atracados com o telefone?

Por Leo Aversa | ODS 4 • Publicada em 17 de julho de 2017 - 18:00 • Atualizada em 18 de julho de 2017 - 00:07

Uma criança com um celular na mão está exposta há muitos perigos. Foto: www.mien.be / Image Source
O celular abre a porteira da internet e expõe a criança a muitos perigos. Foto: www.mien.be / Image Source

– Papai, me dá um celular?

– Tá doido? Você só tem 7 anos!

– Mas na minha turma vários colegas têm.

Conto esse pequeno diálogo para os pais dos colegas e todos concordam: criança com celular é uma loucura. O problema é que logo descubro que são esses mesmos pais os que dão celulares aos filhos.

E mais uma vez eu, o dinossauro da pedagogia, tenho que fazer o papel de vilão.

Por que não é só um telefone. É um telefone que abre a porteira da internet, das redes sociais e da troca de mensagens, fotos e videos. Não é só o perigo do assédio direto por todo tipo de maluco, é o perigo de uma criança, que por sorte não tem a menor noção do que é ou não adequado à idade dela, compartilhando conteúdos. E conteúdo pode ser qualquer coisa, desde um vídeo de um youtuber paspalho falando sandices a um linchamento de um suposto bandido, passando por toda aquela pornografia que Deus duvida e o Diabo rejeita.

Nada é mais forte na classe média do que o efeito manada: a possibilidade de os amiguinhos terem algo e o filho não causa pavor nos pais, que não querem submeter o pimpolho ao trauma de ficar de fora, mesmo que seja de uma estupidez

Quem é que vai ficar de guarda junto com o celular do filho? A babá? A professora? Um app? Se para um adulto já é muito difícil “desver” certas barbaridades que circulam pelas redes, o que dirá uma criança. Serão anos e mais anos de psicólogo para evitar que essa criança se transforme num sequelado digital.

Só que nada é mais forte na classe média do que o efeito manada: a possibilidade de os amiguinhos terem algo e o filho não causa pavor aos pais, que não querem submeter o pimpolho ao trauma de ficar de fora, mesmo que seja de uma estupidez. O pequeno sultão não pode ser contrariado é o mantra da burguesia nativa. Então, o que começa com o doidinho da turma e seus pais sem noção logo se espalha feito rastilho de pólvora.

No pasarán.

Mas tem um detalhe que mesmo os pais que superam essa epidemia de  irresponsabilidade esquecem: sem dar o exemplo nem um dinossauro da pedagogia sobrevive. Se o menino vê os pais atracados com o telefone o dia inteiro fica difícil exigir abstinência. A criança acorda e lá estão os pais às voltas com e-mails, mensagens variadas e posts mil. A criança vai dormir, e o frenesi digital continua. No jantar da família, o celular é sempre o convidado de honra, a postos para dar pitaco sobre os mais variados assuntos.

Nem no fim de semana o whatsapp dá sossego, avisando a cada cinco minutos que uma bobagem fundamental espera uma resposta imediata. Isso sem falar de Instagram, Facebook, Twitter e outros. Os adultos só interrompem toda essa intensa atividade para dizer que os filhos não podem participar dela. Genial, não?

Se existe bom senso suficiente para proibir um celular para uma criança, deveria sobrar um pouco para que os pais, dinossauros ou não, o utilizem de maneira razoável. Afinal, antes de se preocupar com os futuros sequelados digitais, devemos nos preocupar com os que já estão por aqui, na frente do espelho.

Leo Aversa

Leo Aversa fotografa profissionalmente desde 1988, tendo ganho alguns prêmios e perdido vários outros. É formado em jornalismo pela ECO/UFRJ mas não faz ideia de onde guardou o diploma. Sua especialidade em fotografia é o retrato, onde pode exercer seu particular talento como domador de leões e encantador de serpentes, mas também gosta de fotografar viagens, especialmente lugares exóticos e perigosos como Somália, Coreia do Norte e Beto Carrero World. É tricolor, hipocondríaco e pai do Martín.

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