No rastilho das fakenews

Ferrari dourada, que não é do filho do Lula, estacionada numa das ruas de Riade, na Arábia Saudita. Foto CrowdSpark

No baile da boataria virtual está cada vez mais difícil ficar parado

Por Leo Aversa | ODS 4 • Publicada em 22 de março de 2018 - 18:13 • Atualizada em 22 de março de 2018 - 22:14

Ferrari dourada, que não é do filho do Lula, estacionada numa das ruas de Riade, na Arábia Saudita. Foto CrowdSpark
Ferrari dourada, que não é do filho do Lula, estacionada numa das ruas de Riade, na Arábia Saudita. Foto CrowdSpark
Ferrari dourada, que não é do filho do Lula, estacionada numa das ruas de Riade, na Arábia Saudita. Foto CrowdSpark

O primeiro WhatsApp eu recebi de um amigo de longa data. Foi uma surpresa: o amigo teve três refeições por dia na infância, estudou numa escola de boa qualidade e não tem nenhuma sequela mental, ao menos aparente.

Era aquele texto infeliz comparando o assassinato da Marielle Franco com o de uma médica, que aconteceu na véspera, dizendo que, como a médica não era negra, pobre, feminista, do MST, CUT ou PSOL, de alguma cota ou do Bolsa familia, não lhe haviam dado o mesmo destaque da vereadora executada.

O meu primeiro instinto foi chamar o meu amigo de imbecil. Mas ai eu pensei que apenas identificá-lo como um idiota não seria o mais correto. Eu precisava mostrar ao imbecil o porquê da sua condição de imbecil, então resolvi escrever um texto explicando a representatividade da Marielle, a importância do simbólico, a mensagem inserida no ato etc. Mas ficou didático demais. E do excessivamente didático para o sarcástico é pouca coisa e talvez a imbecilidade do meu amigo fosse apenas um surto.  Quem sabe se ao receber a minha mensagem ele já tivesse voltado ao normal e eu passasse a ter um amigo a menos?

Melhor ligar.

Quando telefonei ele contou que nem tinha lido direito mas me repassou porque viu uma foto minha na passeata de protesto pelo assassinato da Marielle. O que o tornava duplamente imbecil, por repassar um texto infeliz e por não ler com atenção o que estava repassando. Como estava ao telefone com um amigo de longa data tive a oportunidade de discorrer longamente sobre a sua estupidez antes de dar por encerrado o episódio marcando um chope para a semana seguinte.

Menos mal.

O segundo veio terceirizado: de um amiga que recebeu de um conhecido, já me avisando que era fakenews. Não se amplia a voz dos idiotas, mas ela não resistiu. Era aquele meme que dizia que a Marielle engravidou aos dezesseis anos, que era ex-mulher do Marcinho VP, que foi eleita pelo Comando Vermelho etc. Um currículo de dar inveja ao Lex Luthor ou ao Temer. Minha amiga me repassou como alerta, já que o conhecido dela havia repassado como sendo algo real. E o pior, esse conhecido nem se trata de uma pessoa especialmente reacionária ou maquiavélica, apenas mais um daqueles paspalhos para quem até os telejornais vespertinos se tornaram muito complicados. Com isso, passam a ter como única fonte de informação memes e fakenews via WhatsApp. São eles, junto aos bots que formam o corpo de baile da boataria virtual.

A minha amiga se deu ao trabalho. Explicou ao parvo que aquilo era falso, mal intencionado e não tinha nenhuma conexão com a realidade. Resumindo: obra de criminosos. Como era de se esperar o parvo ficou estupefato com a surpreendente – para ele –  revelação e prometeu não mais repassar noticias sem antes checar em algum lugar sério se são verdadeiras ou não. O que não quer dizer muita coisa em se tratando de um ignorante, mas já é um começo.

Pelo menos na teoria.

Esta semana, no chope com meu amigo, ele comentou que Pablo Vittar ia cantar o hino nacional na Copa. Já a minha amiga recebeu uma foto de uma Ferrari dourada pelo WhatsApp. É do filho do Lula, garantiu aquele conhecido, que acrescentou: fiz o que você mandou, chequei no Facebook.

Leo Aversa

Leo Aversa fotografa profissionalmente desde 1988, tendo ganho alguns prêmios e perdido vários outros. É formado em jornalismo pela ECO/UFRJ mas não faz ideia de onde guardou o diploma. Sua especialidade em fotografia é o retrato, onde pode exercer seu particular talento como domador de leões e encantador de serpentes, mas também gosta de fotografar viagens, especialmente lugares exóticos e perigosos como Somália, Coreia do Norte e Beto Carrero World. É tricolor, hipocondríaco e pai do Martín.

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2 comentários “No rastilho das fakenews

  1. João Victor disse:

    É triste o que as fakenews estão causando. E pior ainda são coisas reais e que algumas pessoas alegam serem fakenews pra se livrar do problema. Como o Bolsonaro faz.

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