Ambientalistas e agronegócio juntos em favor da Amazônia

Vista aérea do desmatamento da Amazônia na região de Altamira, no Pará. Foto João Laet/AFP

Campanha vai combater a grilagem de terras na região e tenta melhorar imagem do Brasil no exterior

Por Maria Fernanda Ribeiro | ODS 15 • Publicada em 7 de setembro de 2019 - 00:41 • Atualizada em 8 de outubro de 2021 - 11:44

Vista aérea do desmatamento da Amazônia na região de Altamira, no Pará. Foto João Laet/AFP

Mais de 40% do desmatamento na Amazônia acontece em áreas públicas e uma campanha em prol da Amazônia que unisse entidades ambientais, representantes do agronegócio e sociedade civil para impedir a grilagem em tais áreas poderia parecer impensável até agosto deste ano, mês em que o mundo voltou os olhos para o Brasil com os incêndios que se alastraram pela floresta. E foi devido à urgente e necessária exigência de medidas efetivas dos poderes públicos contra o roubo de áreas da União que foi lançada nessa sexta-feira, em São Paulo, a iniciativa “Seja Legal com a Amazônia”, unindo ambientalistas e produtores rurais em uma só meta: combater a ilegalidade.

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O presidente do conselho diretor da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e porta-voz da campanha, Marcello Brito, afirma que uma luz vermelha de alerta está piscando e que a imagem do Brasil, abalada no exterior, pode prejudicar todo e qualquer produto brasileiro. “Não são picuinhas políticas ou ideológicas que nos impedem de fazer o Brasil crescer de forma descente. Para mim, hoje, é um dia histórico.”

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O PIB do agronegócio na Amazônia cresceu mesmo com o desmatamento em queda e, onde o combate ao desmatamento foi mais duro, a produtividade foi melhor, pois há investimento. Isso é uma informação crucial para essa mudança de percepção de que é preciso desmatar para crescer. E a leniência com o problema agrava a situação

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Segundo Brito, o agronegócio está sendo prejudicado por quadrilhas que atuam na ilegalidade e mancham a reputação do setor. Entre os objetivos da campanha, que deve se estender durante três anos, é criar uma força-tarefa para promover a destinação para a conservação e uso sustentáveis das florestas não-destinadas, que são as terras públicas em poder da União e que não possuem nenhum uso específico e são alvo constante de grileiros.

De acordo com André Guimarães, representante da Coalizão Brasil, Clima e Floresta e diretor-executivo do Instituto de Pesquisa da Amazônia (Ipam), a estimativa é que haja 65 milhões de hectares, o correspondente a duas Alemanhas – de florestas não-destinadas na Amazônia Legal e que é necessário um estudo para que recebam o uso adequado. Somente em 2018, o desmatamento nessas áreas chegou a 23%.

Para Marcello Brito, da Abag, uma luz vermelha de alerta está piscando e que a imagem do Brasil, abalada no exterior, pode prejudicar todo e qualquer produto brasileiro. Foto Maria Fernanda Ribeiro
Para Marcello Brito, da Abag, uma luz vermelha de alerta está piscando e que a imagem do Brasil, abalada no exterior, pode prejudicar todo e qualquer produto brasileiro. Foto Maria Fernanda Ribeiro

“É preciso identificar as vocações de cada uma dessas áreas para as devidas destinações. Há que se observar questões socioculturais para conservação ou áreas protegidas. Estamos buscando soluções para um problema crônico que é a degradação da nossa floresta e não é preciso mais desmatar para crescer e sim respeitar o Código Florestal”, disse Guimarães.

De acordo com dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), somente na Amazônia há 12 milhões de hectares de áreas degradas, terras essas que poderiam ser usadas para o agronegócio sem a necessidade de ampliar o desmatamento. Segundo Paulo Barreto, pesquisador sênior do Imazon, a grilagem é um problema e a sociedade brasileira precisa se dar conta disso.

“O PIB do agronegócio na Amazônia cresceu mesmo com o desmatamento em queda e, onde o combate ao desmatamento foi mais duro, a produtividade foi melhor, pois há investimento. Isso é uma informação crucial para essa mudança de percepção de que é preciso desmatar para crescer. E a leniência com o problema agrava a situação.”

Outro objetivo da campanha, que está aberta a novas adesões, é apoiar a as forças-tarefas realizadas na Amazônia pelo Ministério Público Federal para desmantelar as milícias que atuam na grilagem de terra. Segundo o procurador do MPF no Pará, Ricardo Negrini, unir-se à campanha não é trabalhar por uma causa utópica ou ideológica, mas sim “bastante pragmática” que é valorizar um capital natural que o país tem.

“A floresta em pé produz muito mais riqueza que a floresta desmatada. O interesse do desenvolvimento predatório não gera riqueza a longo prazo, não é sustentável e não se mantém. É pensando no bem do agronegócio brasileiro que precisamos discutir sem falsas concepções a questão da grilagem na região amazônica.”

Negrini mencionou a força-tarefa Amazônia Protege, criada em agosto de 2018, formada por procuradores da República, que atua além do combate à grilagem de terras públicas, também com a mineração ilegal, ao desmatamento e à violência agrária. “A gente se choca quando vê alguém com uma mala de dinheiro, mas não temos a mesma sensação quando vemos alguém invadindo uma área pública, saqueando, degradando”, afirma Negrini.

O termo grilagem remonta ao século passado e batiza até hoje um método usado para forjar documentos de terra, que eram colocados numa gaveta com grilos para serem desgastados pelos insetos, dando aspecto antigo para que parecessem verdadeiros. Atualmente, novas estratégias para fraudar escrituras são usadas e grandes áreas de terra pública são reivindicadas por meio de documentos falsos.

A campanha

A campanha Seja Legal com a Amazônia – Agronegócio e ambientalistas juntos no combate à grilagem e ao roubo de terras públicas na Amazônia, teve uma ação de lançamento em 5 de setembro, data em que se comemora o Dia da Amazônia, no Parque Trianon, que mobilizou atores, figurantes e uma estrutura que simulou o fechamento do local. Segundo a encenação, o parque seria loteado e vendido para se transformar em um novo empreendimento imobiliário.

A ideia foi chamar a atenção para o que ocorre na Amazônia com a grilagem de terras, pois a venda fictícia do parque levaria a derrubada da vegetação remanescente da Mata Atlântica, que resiste ao crescimento da cidade desde 1892. A campanha pode ser acessada pelo site www.sejalegalcomaamazonia.org.br e há disponível um formulário a ser preenchido para pressionar Ministério da Justiça e Procuradoria Geral da República exigindo mais investimentos em operações de combate ao crime organizado na Amazônia.

Maria Fernanda Ribeiro

É jornalista, roteirista e documentarista. Morou na Amazônia entre os anos de 2016 e 2018 para conhecer e compartilhar as histórias dos povos da floresta. Agora divide a vida entre o campo, a floresta e São Paulo sempre em busca de histórias para contar.

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