ODS 1
Distribuidor de bebidas no comando do ICMBio
Depois do dono de padaria que foi indicado para chefiar unidade de conservação, nova nomeação política constrange a área ambiental do governo
Responda de bate-pronto: o que tem a ver distribuição de bebidas com gestão de unidades de conservação? Aparentemente, nada. Pois para o governo Michel Temer (MDB) os assuntos são bastante correlatos. Pelo menos é o que dá a entender a nomeação de Cairo Tavares, de 31 anos, para chefiar o posto máximo que controla parques, reservas, APAs, estações ecológicas e monumentos naturais do país. A principal credencial do rapaz para ocupar a presidência do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio): ser graduado em Ciência Política no Centro Universitário do Distrito Federal (UDF). A escolha de Cairo, que também é dono de uma distribuidora de bebidas em Valparaíso de Goiás, ocorre 18 dias após Emerson Fernandes Lima gerar enorme polêmica ao assumir a chefia da Reserva Biológica do Tinguá, em Nova Iguaçu, município do Rio de Janeiro. Emerson não tinha qualquer conhecimento da área ambiental e era sócio de uma panificadora.
[g1_quote author_name=”Isaura Bredariol” author_description=”Vice-presidente da Associação de Servidores da Área Ambiental” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]“Nunca, na existência do ICMBio (fundado em 2007), se viu um descaso tão grande com a qualificação do Instituto. A nomeação de alguém sem as mínimas condições de fazer a gestão de um órgão bastante complexo representa um dano gigantesco para todo o país”, critica Isaura Bredariol, funcionária admitida no primeiro concurso do ICMBio e vice-presidente da Associação de Servidores Federais da Área Ambiental (Asibama) no Rio.
[/g1_quote]Indicação política para acomodar o Partido Republicano da Ordem Social (PROS) no governo, Cairo terá a incumbência, nos dramáticos meses que ainda faltam a Temer, de gerir 2.000 servidores, que cuidam de 80 milhões de hectares, cerca de 10% do território nacional. Pela tarefa, receberá R$ 16.215,00 mensais. Em reunião esta semana, ao ser perguntado sobre seus conhecimentos na área, o novo homem dos parques foi sucinto: “Sei o que todo brasileiro sabe”.
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Veja o que já enviamosA nomeação, que deve sair no Diário Oficial da União ainda nesta sexta-feira (25), gerou a ira de funcionários de carreira do órgão ambiental. Há promessa de uma série de manifestações e tentativas de veto à escolha. No Rio, em pelo menos dois locais: no Museu Nacional, onde servidores da Rebio Tinguá farão um encontro; e no Parque Nacional da Tijuca.
“Nunca, na existência do ICMBio (fundado em 2007), se viu um descaso tão grande com a qualificação do Instituto. A nomeação de alguém sem as mínimas condições de fazer a gestão de um órgão bastante complexo representa um dano gigantesco para todo o país”, critica Isaura Bredariol, funcionária admitida no primeiro concurso do ICMBio e vice-presidente da Associação de Servidores Federais da Área Ambiental (Asibama) no Rio.
Entre parlamentares ligados à causa ambiental, mais indignação. Coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, o deputado federal Alessandro Molon (PSB) promete lutar para barrar a nomeação.
“Se for confirmada a nomeação de alguém sem nenhum histórico na área ambiental para a presidência do ICMBio, em mais um episódio de loteamento político de áreas que exigem um conhecimento técnico, com certeza vamos reagir. Não vamos permitir que tratem o meio ambiente brasileiro com tamanho desprezo”, afirma Molon.
A escolha de um nome não-técnico gerou ainda mais irritação entre ambientalistas porque Cairo Tavares substitui o oceanógrafo Ricardo Soavinski, reconhecido pelo apuro técnico e pelo conhecimento na área. Sua atuação sempre foi voltada à pesquisa e conservação da natureza. Exonerado a pedido, Soavinski tomou posse como presidente da Sanepar, a empresa de saneamento do estado do Paraná, no início de maio.
Nomeações em parques
Alguns funcionários de carreira avaliam que o ICMBio se tornou atraente depois da aprovação da lei que permite a transformação de multas ambientais em projetos de compensação. Isso dá à diretoria do órgão o poder de negociar e aprovar projetos que superam R$ 1,2 bilhão. Entretanto, outros servidores de carreira argumentam que essa nova atribuição do ICMBio ainda demorará, pois depende da sanção da lei, de regulamentação e definição de prazos. Por isso, segundo essa leitura, a nomeação do PROS estaria mais relacionada à possibilidade de indicações de aliados políticos em parques para fins eleitorais.
Quem fizer uma pesquisa em sites de busca na internet associando o nome de Cairo Tavares e o PROS vai encontrar algumas reportagens de portais do próprio partido em que o jovem é citado como diretor técnico da Fundação PROS. No currículo do rapaz, disponível na plataforma Lattes, não é possível pescar muitas informações. O espaço destinado às produções acadêmicas está vazio.
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Jornalista formado em 2006 pela Universidade Federal Fluminense (UFF), trabalhou nos jornais O Fluminense, O Dia e O Globo, no qual ficou por oito anos cobrindo temas ligados ao meio ambiente. Editor de Conteúdo do Museu do Amanhã. Tem pós-graduação em Gestão Ambiental e cursa mestra em Engenharia Ambiental pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Apaixonado pela profissão, acredita que sempre haverá gente interessada em ouvir boas histórias.
Um dos maiores absurdos que vi este ano… deplorável.