Seca extrema liga alerta para fogo no Pantanal

Falta de chuva no bioma e baixo nível dos rios fazem governos estaduais acelerarem medidas para evitar repetição de tragédia ambiental de 2020

Por Oscar Valporto | ODS 13ODS 14ODS 15 • Publicada em 18 de maio de 2021 - 08:49 • Atualizada em 19 de maio de 2021 - 14:47

Rodovia Transpantaneira cortando a paisagem seca e calcinada do Pantanal em 2020: previsão de nova seca extrema em 2021 (Foto: Ernesto Carriço / NurPhoto / AFP – 07/10/2020)

No ano do fogo de 2020, a seca no Pantanal foi a pior em 50 anos, com um índice de precipitação quase 40% abaixo da média histórica. A temporada seca já começou em 2021 e as previsões indicam que a estiagem ficará em padrão semelhante ao do ano passado, quando houve recorde de queimadas no bioma, atingindo 30% de sua área.  “O prognóstico é de nova temporada de seca severa no Pantanal, logo há um risco real para o Pantanal”, alertou a metereologista Balbina Soriano, pesquisadora da Embrapa Pantanal, em reunião do Comitê do Fogo (Comitê Interinstitucional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais) de Mato Grosso do Sul para o lançamento da campanha Pantanal#100cinzas para buscar mobilizar proprietários rurais, turistas, pescadores e ribeirinhos para cuidados na temporada de queimadas.

A campanha faz parte das iniciativas dos governos estaduais – tanto do Mato Grosso do Sul como do vizinho Mato Grosso – para evitar que a tragédia ambiental de 2020 se repita. Com a falta de ação federal e a indigência orçamentária do Ibama e do ICMbio, os estados buscam assumir a liderança da prevenção aos incêndios. Mato Grosso do Sul decretou estado de emergência ambiental em todo seu território, em razão das condições climáticas desfavoráveis. “Já estamos há 35 dias sem chuva no Pantanal e é possível verificar o aparecimento de focos de incêndio”, destacou o secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar, Jaime Verruck, no lançamento da campanha.

Válido por 180 dias, o decreto permite ampliar os poderes das forças de segurança, para que possam agir na prevenção e no combate aos incêndios florestais e a contratação de pessoal e aquisição de bens em caráter emergencial. “Intensificamos nossa integração no Comitê do Fogo para ampliar o trabalho preventivo e impedir a repetição dos incêndios de 2020”, explicou o coronel Fábio Catarinelli, presidente do comitê que reúne órgãos estaduais, o Ibama, entidades ligadas à agricultura, a Embrapa, o Ministério Público e ONGs como o SOS Pantanal e WWF Brasil.

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Painel da campanha #Pantanal100cinzas do governo de Mato Grosso: decreto de emergência ambiental e ação de conscientização (Foto: Reprodução)
Painel da campanha #Pantanal100cinzas do governo de Mato Grosso: decreto de emergência ambiental e ação de conscientização (Foto: Reprodução)

Antes mesmo do decreto, o governo estadual já tinha contratado horas-voo de aeronaves para combate ao fogo e antecipou a incorporação e treinamento de brigadistas. Também foi instituído o PEMIF (Plano Estadual de Manejo Integrado do Fogo), que envolve secretarias e entidades para a gestão do uso do fogo, para limpeza de áreas rurais, inclusive em terras indígenas. O SOS Pantanal também organizou 28 brigadas pantaneiros para prevenção e combate a incêndios florestais – 14 no Mato Grosso do Sul e 14 no Mato Grosso.

O decreto de emergência ambiental destaca a gravidade da estiagem: “as temperaturas estão cada vez mais altas, os ventos superiores a 30 km/h, umidade relativa do ar baixa”.  A meteorologista Balbina Soriano acrescentou que a tendência de precipitação aponta para a repetição da seca de 2020. “Nós tivemos um pouco mais de chuva em janeiro, mas, a partir de fevereiro, choveu sempre abaixo da média e, em abril, praticamente não houve precipitação. Do ponto de vista climático, o risco de uma nova temporada de incêndios no Pantanal é real”, disse a pesquisadora, lembrando que o índice de precipitação abaixo da média vem desde 2019.

A meteorologista destacou ainda que a Embrapa desenvolveu um sistema de alerta de risco para incêndio no Pantanal (Saripan) baseado em dados climáticos, como quantidade de chuva, velocidade do vento e umidade relativa do ar, que está à disposição do Corpo de Bombeiros, do Ibama, do Batalhão de Policia Militar Ambiental e outros órgãos. “Medição tem sido prejudicada pela falta de manutenção em algumas estações do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet)”, lamentou Balbina Soriano.

O baixo nível do Rio Paraguai e seus afluentes – que já ocorreu em 2020 – também alerta para a seca extrema no Pantanal. Dados divulgados pelo Serviço Geológico do Brasil (SGB-CPRM) mostram que o rio registrou a cota de 1,79m em Ladário, no Pantanal sul-matogrossense, e na vizinha Corumbá, onde normalmente, nesta época do ano, atinge 3,42 metros. De acordo com o SGB-CPRM, é provável que o nível do rio em Ladário aproxime-se do zero da régua, como ocorreu no ano passado, o que deve levar a Marinha a suspender da navegação.

Focos de incêndio no Pantanal de Mato Grosso em 2020: contratação de horas de voo para combate às queimadas (Foto: Mayke Toscano / SemaMT – 18/09/2020)

Mato Grosso: mais chuva, rio igualmente baixo

Uma das maiores extensões úmidas contínuas do planeta, o Pantanal tem 138 mil quilômetros quadrados. Apesar da maior parte do bioma (65% da área brasileira) estar em território de Mato Grosso do Sul, em 2020, a área destruída pelo fogo foi um pouco maior em Mato Grosso. Este ano, a precipitação em Mato Grosso foi maior do que no estado vizinho, mas os rios estão igualmente baixos. Os municípios de Cáceres (MT) e Cuiabá (MT) apresentaram recordes mínimos de precipitação em praticamente todos os dias do ano até agora.

Essa escassez hídrica tem mais um efeito ambiental pois afeta o abastecimento das usinas hidrelétricas no Centro-Oeste e força a ligação das térmicas. De acordo com o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), a estação chuvosa na região do Pantanal encerrou precocemente no final de março. Os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) apontam que a precipitação dos últimos três meses na bacia do alto Paraguai foi abaixo da climatologia para a região.

O governo do Mato Grosso informou, em nota, que está investindo R$ 43,3 milhões exclusivamente para atender aos incêndios florestais de 2021 – inclusive com a compra de um helicóptero para atuar, principalmente, na prevenção. Também estão sendo contratados 100 brigadistas civis temporários estaduais, para atuarem prioritariamente na preservação das Unidades de Conservação estaduais e federais. O governo também espera reforço de 100 brigadistas contratados com recursos federais.

Apesar da seca extrema no Pantanal desde abril, os brigadistas federais só devem começar a atuar em julho, de acordo com previsão do próprio PrevFogo, porque somente em 12 de maio foi publicada portaria no Diário Oficial da União em 12 de maio. A portaria autoriza o Prevfogo a contratar brigadas federais temporárias: as estruturas variam de 15 a 30 brigadistas por unidade.

Serão instaladas brigadas em 10 municípios de Mato Grosso, dois deles no Pantanal – Cáceres e Tangará da Serra. Outros sete são na Amazônia Legal: Brasnorte, São Felix do Araguaia, Querência, Paranatinga, Bom Jesus do Araguaia e Feliz Natal, município recordista em desmatamento no país no mês de março. Camarana, no cerrado, completa a lista. O Mato Grosso do Sul receberá cinco brigadas federais, todos voltadas para o Pantanal: Corumbá (uma brigada), Porto Murtinho (2 brigadas), Aquidauana (2 brigadas). A portaria também autoriza a contratação temporária de agentes de manejo do fogo.

No Mato Grosso, o governo instalou em março o Comitê Estratégico para o Combate do Desmatamento Ilegal, Exploração Florestal Ilegal e Aos Incêndios Florestais (CEDIF-MT). Nos últimos oito meses, o estado tem mantido uma média de redução de desmatamento de 30% na Amazônia, onde estão concentradas as ações de fiscalização guiadas por imagens da Plataforma de Monitoramento com Imagens de Satélite Planet.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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