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O ponto de virada tem nome e sobrenome: transição energética justa e rápida. “Esse é o nó da questão”, adverte Artaxo. Ainda que as florestas tropicais sejam peças-chave na questão das mudanças climáticas, 90% dos gases de efeito estufa vêm da queima de combustíveis fósseis. Em algumas regiões da Amazônia, a temperatura já atingiu 2,4ºC a 2,5ºC, o que tem levado à degradação florestal e a uma queda acentuada da precipitação. “A única maneira que temos de lidar com essa questão é acabando com a exploração de combustíveis fósseis, para que a floresta tenha condições de, nas próximas décadas, sobreviver de maneira sustentável”. Segundo Artaxo, o planeta está indo em direção a um aumento da temperatura da ordem de 4ºC a 4,5ºC e países como o Brasil são extremamente vulneráveis às mudanças climáticas.
O Brasil vem defendendo desde a COP28, em 2023, nos Emirados Árabes Unidos, a criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, que já ficou conhecido como TFFF. É um mecanismo de financiamento que não tem nada a ver com mercado de carbono. É um fundo para conservação dos ambientes naturais e florestas tropicais, ou seja, estratégico para o Brasil, países africanos e o sudoeste da Ásia. A Floresta Amazônica, por exemplo, contém 120 bilhões de toneladas de carbono armazenados no topo das árvores e nas folhas, o que é equivalente a 10 anos de toda a queima de combustíveis fósseis do mundo. Se a degradação florestal se intensificar nas próximas décadas, comenta Artaxo, esse carbono vai para a atmosfera. “Se isso ocorrer, os cenários do IPCC vão virar brincadeira de criança e o aumento da temperatura global será bem maior que 3ºC.”
Nova geopolítica
A nova geopolítica do clima, com foco em financiamento, inclusão e justiça social, que constou da Declaração Conjunta da 17ªCúpula do Brics, que ocorreu no Rio de Janeiro em julho último, é um ponto de “virada” que Artaxo destaca. Juntos, os 11 países membros do Brics respondem por 40% da economia global e por uma parcela significativa das emissões globais de gases de efeito estufa, dado que quatro dos seus membros (China, Índia, Rússia e Brasil) estão entre os cinco maiores emissores do mundo.
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Os países do Brics, saliente, estão se articulando para superar a saída dos Estados Unidos da ordem global construída no pós-guerra. A China em particular, continua Artaxo, já deu sinais claros de que quer ocupar essa vaga, além de redobrar a aposta na economia verde. “Mas não vamos esperar que todos os problemas do mundo se resolvam na COP30”. A praticamente certa ausência do governo americano nas negociações não é nada bom, mas poderia ser pior. “Os Estados Unidos poderiam vir para atrapalhar, já que as decisões da ONU são por consenso e aí eles poderiam vir para bloquear todas as decisões”. Como tudo indica que os EUA estejam largando o multilateralismo, isso levará, inevitavelmente, à construção de um “novo multilaterialismo” e é aí é que entra a China e Europa, comentou Artaxo.
O físico participou de mais uma rodada de conversa da série “Papos Quentes”, que vem ocorrendo no Museu do Amanhã. Os encontros começaram em julho e vão até outubro. Na quinta 21, o tema “Floretas e Clima” foi debatido por Artaxo, Txai Suruí, jovem líder indígena de Rondônia, que faz parte do Grupo Consultivo da Juventude sobre Mudanças Climáticas – convite feito pelo secretário-geral da ONU, António Guterres –; Carlos Vicente, engenheiro florestal e coordenador da Iniciativa Inter-Religiosa pelas Florestas Tropicais no Brasil; e Alice Pataxó, liderança indígena e embaixadora do WWF-Brasil. A mediação foi feita por Giovanna Nader, do podcast “O tempo virou”.