Aquecimento do Atlântico provoca queimadas no Brasil e furacões nos EUA

Combate a queimada no Pará e destruição na Louisiana após passagem de furacão: aquecimento do Atlântica provoca seca e temporada de tempestades (Fotos: Ernesto Carriço e Joe Raedle/Getty Images/AFP)

Cientista da Nasa alerta que aumento dos focos de incêndio na Amazonas é provocado pelo desmatamento em temporada seca

Por Oscar Valporto | ODS 13ODS 15 • Publicada em 28 de agosto de 2020 - 09:00 • Atualizada em 11 de fevereiro de 2021 - 16:45

Combate a queimada no Pará e destruição na Louisiana após passagem de furacão: aquecimento do Atlântica provoca seca e temporada de tempestades (Fotos: Ernesto Carriço e Joe Raedle/Getty Images/AFP)

O aquecimento acima da média das águas do Oceano Atlântico – o mesmo fenômeno que produz a intensa temporada de furacões nos Estados Unidos – também é responsável pela seca na Região Amazônica que pode levar a um número recorde de queimadas em 2020. “Como o desmatamento já foi alto em 2019 e a maioria das queimadas da Amazônia são provocadas pelo desmatamento; e como também  2020 está mais seco do que o ano passado, podemos prever que teremos uma aumento no número de focos de incêndio na região”, afirmou Douglas Morton, pesquisador do Centro Goddard da Nasa, na série de lives Tem Clima em Casa, promovida pelo Observatório do Clima.

Na semana passada, o cientista ambiental divulgou análise baseada em informações de um novo sistema de monitoramento de queimadas na Amazônia feito pela Nasa, em colaboração internacional encabeçada pelo próprio Morton, do Centro Goddard de Voo Espacial da Nasa, e pelo pesquisador Niels Andela, professor de Ciências da Terra e do Oceano da Universidade de Cardiff. O monitoramento – criado pelos cientistas para o projeto GFED (Global Fire Emissions Database) – utiliza dados do sitema VIIRS de imagens de satélite. “É um sistema que nos permite identificar áreas em chamas e também a razão porque elas estão queimando”, explicou Morton.

A principal origem – 54% do total – dos focos de incêndio na Amazônia é o desmatamento. “Nós identificamos que uma grande quantidade de incêndios é claramente relacionada a desmatamento. Não são pequenas queimadas relacionadas à agricultura ou à limpeza de áreas para pastagens.”, afirmou o cientista da Nasa, lembrando que a moratória do fogo decretada pelo governo não impediu o aumento da atividade de queimadas na Amazônia.  O número de alertas de desmatamento aumentou 34,5% em 12 meses, de julho de 2019 até o mês passado. segundo o Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE). O jornalista Claudio Angelo, que conduziu a entrevista pelo Observatório do Clima, informou que já foram registrados, neste mês de agosto, mais de 24 mil focos de queimadas – o mesmo patamar de 2020, apesar da moratória e da operação do Exército na região.

Fumaça de queimada sobre o céu da Amazônia: Nasa aponta que 54% dos focos de incêndio são frutos de desmatamento (Foto: Carl de Souza/AFP)
Fumaça de queimada sobre o céu da Amazônia: Nasa aponta que 54% dos focos de incêndio são frutos de desmatamento (Foto: Carl de Souza/AFP)

A análise de incêndios liderada pela NASA indica que tem havido uma proliferação de fogos em pontos-chave de desmatamento nos estados do Pará, Mato Grosso e Amazonas – no sul da Amazônia, que foi a área priorizada pela pesquisa na sua primeira fase por ser a região onde a temporada de queimadas começa mais cedo. “Mais da metade das emissões de carbono da Amazônia vem dos focos de incêndio em áreas desmatadas”, frisou Douglas Morton.

Para saber se um foco de fogo tem origem no desmatamento, o sistema criado pela Nasa analisa o comportamento do foco de radiação detectado pelo satélite ao longo de vários dias e o compara com pontos encontrados ao redor para fazer uma classificação. A nova ferramenta analisa o comportamento do foco de radiação do fogo detetado pelo satélite ao longo de vários dias e faz uma comparação com pontos ao redor. Os incêndios em áreas desmatadas têm maior poder de radiação de fogo.

Incêndios florestais

O cientista Douglas Morton explicou que as queimadas na Amazônia foram identificadas, além de em áreas desmatadas, também terras para pastagens ou produção agrícola e ainda em áreas de sub-bosque, a vegetação arbustiva ou rasteira que se encontradas no interior das florestas tropicais. “O crescimento do número de focos de incêndio dentro da floresta é extremamente preocupante porque essas áreas de floresta em pé não tem adaptação -às queimadas: 50% a 75% da vegetação morre com queimada de baixa intensidade. É uma tragédia ecológica. São queimadas que podem continuar por semanas ou até meses”, destacou o pesquisador da Nasa.

Morton explicou que essas queimadas são consequência de ações de manejo e desmatamento. “A Floresta Amazônica é uma floresta úmida: não há razão para queimar. Isso acontece, em quase 100% dos casos, por ação humana. Incêndio florestal é proveniente de queima para manejo agrícola ou pecuária que fugiu de controle. Ou mesmo da queima de madeira de desmatamento também fora de controle”, apontou o cientista da Nasa. A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo e possui a maior biodiversidade registada numa área do planeta, com cerca de 5,5 milhões de quilômetros quadrados, e inclui territórios do Brasil, Peru, Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana, Suriname e Guiana Francesa

Doulgas Morton explicou ainda que as condições climáticas de 2020 são semelhantes às de 2005, quando o aumento a temperatura da superfície do Oceano Atlântico provocou seca extrema na Amazônia. O cientista explicou, entretanto, que, em 2005, as queimadas ficaram concentradas no sudoeste da Amazônia. “Em 2020, a ápice da seca está um pouco mais ao sul, mais perto do Pantanal, atingido por muitas queimadas. Mas também temos seca e fogo ao norte, no sul da Amazônia, e também na Argentina”, lembrou o pesquisador.

Destruição causada pelo furacão Laura na cidade de Lake Charles, Luisiana: pode faltar letra para batizar furacões em 2020 (Foto: Andrew Caballero-Reynolds/AFP)
Destruição causada pelo furacão Laura na cidade de Lake Charles, Luisiana: pode faltar letra para batizar furacões em 2020 (Foto: Andrew Caballero-Reynolds/AFP)

Longa temporada de furacões

O cientista Douglas Morton explicou que este aumento da temperatura da superfície do Oceano Atlântico também é responsável pela multiplicação de furacões no Atlântico Norte. “Estamos ainda em agosto e chegamos as letras L e M, com dois furacões simultâneos atingidos os estados na costa do golfo”, destacou. Os furacões são batizados em ordem alfabética, a partir do começo do ano.

Depois do furacão Marco chegar aos Estados Unidos na segunda-feira já como tempestade tropical enfraquecida, na noite de quarta-feira, o furacão Layra atingiu os estados a Louisiana e do Texas, provocando pelo menos quatro mortes e deixando 800 mil pessoas sem luz. O Centro Nacional de Meterologoia dos EUA prevê que, até o fim do ano, cheguem 24 tempestades tropicais, o dobro da média anual. Os meteorologistas esperam que 12 delas se tornem furacões e 5 desses furacões atinjam categoria 3 ou superior, com ventos acima de 170 km/h. O furacão Laura bateu nos EUA como um furacão da categoria 4.

Douglas Morton, cientista da Nasa, na live com Claudio Angelo, do Observatório do Clima: "Nós identificamos que uma grande quantidade de incêndios é claramente relacionada a desmatamento" (Reprodução: Facebook)
Douglas Morton, cientista da Nasa, na live com Claudio Angelo, do Observatório do Clima: “Nós identificamos que uma grande quantidade de incêndios é claramente relacionada a desmatamento” (Reprodução: Facebook)

Se as previsões se confirmarem, a temporada de 2020 será a segunda com maior em número de tempestades, atrás apenas da temporada de 2005, que registrou 28 tempestades nomeadas, 15 furacões e 7 furacões de categorias intensas, com 4 deles atingindo a categoria máxima de intensidade (categoria 5). O ano de 2005, de intenso calor na superfície do Oceano Atlântico, foi o ano do furacão Katrina que deixou quase dois mil mortos e um milhão de desabrigados.

Seria a segunda vez na história que toda a lista de nomes de tempestades e furacões seria consumida antes do final da temporada, sendo necessário o uso de nomes vindos do alfabeto grego para as tempestades restantes – como aconteceu na temporada de 2005. Os furacões são batizados por ordem alfabética – com revezamento entre nomes femininos e masculinos. Os meteorologistas usam 21 letras – Q, U, X, Y e Z não são utilizadas no batismo – o que, em geral, serve para batizar as tempestades durante o ano inteiro.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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