Porque precisamos de uma taxonomia verde

Debate sobre classificação de atividades econômicas de acordo com seus impactos socioambientais precisa avançar no Brasil

Por Marina Grossi | ArtigoODS 12 • Publicada em 10 de outubro de 2023 - 08:53 • Atualizada em 7 de fevereiro de 2024 - 13:19

(Ilustralção: GDF/REprodução)

O termo, de origem grega, veio emprestado da biologia: taxonomia é o ramo responsável por descrever, identificar e nomear os seres vivos de acordo com critérios estabelecidos nas sete categorias – reino, filo, classe, ordem, família, gênero e espécie. Mas recentemente a taxonomia ganhou tons de verde e passou a fazer parte também do vocabulário econômico, mais precisamente da temática ambiental, social e de governança (ESG). Assim, a expressão taxonomia verde, ou sustentável, passou a designar a classificação de atividades econômicas de acordo com seus impactos socioambientais, especialmente climáticos, de modo que os fluxos de capital sejam direcionados para aquelas com maior aderência à economia de baixo carbono.

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Essa discussão está amadurecendo no mundo todo: hoje 16 países e a União Europeia já contam com seus arcabouços de taxonomia verde – sendo que o bloco europeu é tido como detentor da legislação mais abrangente sobre o assunto até então, tendo inspirado normativas de outros países e organizações. Na América Latina, os países que saíram na frente foram a Costa Rica e a Colômbia, com taxonomias verdes orientando principalmente o setor bancário.

O Brasil também dá seus passos rumo à criação de um arcabouço próprio. A taxonomia verde é um dos temas do Plano de Transição Ecológica do governo federal, dentro do eixo de finanças sustentáveis, um dos seis eixos previstos no pacote de medidas – os demais são bioeconomia, transição energética, infraestrutura verde e saneamento, adensamento tecnológico e economia circular. O debate, encabeçado pelo Ministério da Fazenda, envolve ainda o Banco Central, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Superintendência de Seguros Privados (Susep), entre outras organizações.

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O setor empresarial está entusiasmado com o avanço da pauta e busca contribuir com a construção deste marco regulatório. Em julho, o Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) entregou ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, um documento com recomendações nos seis eixos, identificando sinergias entre as bandeiras defendidas há décadas pelo CEBDS e as medidas que devem fazer parte do plano. Reforçamos a importância da taxonomia para direcionar e mobilizar recursos públicos e privados em escala para atividades econômicas conectadas aos objetivos da transformação ecológica no Brasil.

Hoje, os ativos globais classificados como ESG devem ultrapassar US$ 53 trilhões em 2025, o que representa mais de um terço dos US$ 140,5 trilhões de ativos totais sob gestão, segundo projeções da Bloomberg. O CEBDS acredita que regras claras para a classificação das atividades têm o potencial de impulsionar o investimento em projetos sustentáveis e atrair recursos financeiros internacionais com este lastro ESG para o país.

A taxonomia verde é, assim como o mercado regulado de carbono, uma bandeira do Conselho desde 2016, quando trabalhamos na promoção de critérios sustentáveis para os investimentos com o lançamento de um guia sobre títulos verdes, com padrões e orientações para o lançamento desses papéis e as razões para promover essas ferramentas. Agora, além das sugestões encaminhadas ao Executivo, recomendamos a regulamentação da matéria e o avanço do PL 2838/2022, que estabelece normas e diretrizes para o desenvolvimento e aplicação da taxonomia ambiental e social de atividades econômicas, projetos de infraestrutura e tecnologias para fins de destinação de incentivos econômicos, fiscais e creditícios e outras providências.

E por que o Brasil precisa de uma taxonomia sustentável própria? Além dos motivos já mencionados, que incluem o potencial de atrair recursos para nossa jornada de descarbonização, uma classificação nacional é essencial para não se perpetuar a dependência da taxonomia europeia que não se aplica à nossa realidade. Em geral, a produção de energia tem maior peso no total das emissões de gases de efeito estufa dos países europeus, enquanto no Brasil é impossível negar o peso das mudanças no uso da terra, especialmente o desmatamento, e da atividade agropecuária para nossa pegada de carbono, que juntas respondem por quase 75% das nossas emissões.

O Brasil tem oportunidades muito diversas a serem aproveitadas, especialmente nas soluções climáticas atreladas à nossa rica biodiversidade, por isso é preciso gerar regras e padrões adaptados ao cenário do país, de forma alinhada com as taxonomias internacionais para facilitar a intersecção com o mercado internacional. Assim, uma taxonomia verde – e amarela – dará ao país segurança jurídica, competitividade e será uma importante ferramenta para mitigar riscos de instabilidade macroeconômica ao criar incentivos para uma transição para a economia de baixo carbono com justiça social.

Marina Grossi

Marina Grossi, economista, é presidente do CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), entidade com mais de 100 empresas associadas cujo faturamento somado equivale a quase 50% do PIB brasileiro. Foi negociadora do Brasil na Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima entre 1997 a 2001 e coordenadora do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas entre 2001 e 2003.

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