ODS 1
Apesar dos riscos à saúde, uso de antibióticos na pecuária deve crescer
Pesquisa da revista Nature mostra que o uso desses remédios no mundo subirá 8% até 2030, mas no Brasil índice deve chegar a 13%
Em um mundo ideal, os antibióticos serviriam para curar alguns tipos de doenças mais graves. Isso vale para os seres humanos e para os animais, como porcos, bois e galinhas. Simples e óbvio, certo? Nem tanto. Movidos pelo vírus da ganância, alguns produtores vêm há algum tempo usando indiscriminadamente esses remédios para curar qualquer doença. Por si só essa prática já seria ruim, mas a história pode ficar pior. Muitos desses antibióticos funcionam também como um eficiente acelerador do crescimento animal. Bingo. Se o boi engorda mais rapidamente, se entra mais dinheiro no bolso do dono da fazenda, por que não dar mais um remediozinho? Mas e os efeitos colaterais para a saúde dos animais, dos trabalhadores rurais e dos consumidores? Pois é…
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Uma pesquisa publicada na semana passada na prestigiada revista científica Nature mostrou que este cenário tende a se agravar. A projeção dos cientistas Thomas Van Boeckel e Ranya Mulchandani, do Instituto Federal Suíço de Tecnologia (ETH), indica um crescimento médio, até 2030, de 8% no uso de antibióticos na pecuária em todo o mundo. No Brasil, o crescimento seria maior, chegando a 13%. O maior aumento previsto na aplicação desses remédios, porém, aconteceria no Paquistão, que deve chegar a 44%. Van Boeckel adverte, no entanto, que os índices podem ser ainda maiores. Ele explica que a maioria dos países não divulga publicamente seus dados de uso de antibióticos agrícolas: “A maioria dos dados sobre uso de antibióticos no mundo é inutilizável”, lamenta o pesquisador.
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Veja o que já enviamosPara fazer o estudo recém-divulgado, Van Boeckel e Mulchandani trabalharam com os dados dos 42 países que divulgam oficialmente suas informações, coletaram dados individualmente de outras nações, analisaram relatórios de fazendas e cruzaram com artigos científicos que relatam o uso veterinário de antibióticos. A partir daí, extrapolaram as tendências para os 187 países restantes. De acordo com a equipe, o uso de antibióticos na África deve ser o dobro do que é reportado atualmente. Na Ásia ele seria pelo menos 50% maior.
Mas, afinal, quais são os riscos do uso excessivo de antibióticos na pecuária? O problema é que, ao longo do tempo, o uso continuado de superdoses desses medicamentos deixa de fazer efeito. Na verdade, em vez de ajudarem a neutralizar os agentes das doenças, acabam fortalecendo esses micróbios e se tornam inúteis. Com essa resistência adquirida, as enfermidades se propagam entre os animais e afetam também os seres humanos. De várias maneiras, seja no contato de bois, porcos e galinhas com os trabalhadores da produção, no transporte, no comércio e, finalmente, no consumo da carne e seus derivados.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), sete em cada dez doenças humanas descobertas nos últimos anos são de origem animal. O dado é grave, afeta a saúde global e exige esforços imediatos para reverter a situação. Há quem diga que a resistência aos antibióticos é um processo natural de adaptação dos agentes infecciosos. É verdade, mas a velocidade em que está acontecendo não é natural. Está claro que o problema reside na forma desordenada e irresponsável com que são aplicados esses remédios, especialmente quando a criação é intensiva e as doenças mais frequentes.
Em uma conferência sobre o tema, em novembro do ano passado, em Muscat, Omã, representantes de 39 países, incluindo grandes produtores como a Índia e a Rússia, se comprometeram a reduzir entre 30% e 50% o uso agrícola de antibióticos. Resta esperar para saber se a promessa será realmente cumprida. Enquanto isso, Van Boeckel, o pesquisador suíço, garante que no próximo estudo sua equipe modelará cenários mostrando o que aconteceria se todos os produtores e países agissem como a Suécia, onde a aplicação de qualquer antibiótico em qualquer animal precisa da prescrição de um veterinário. Uma medida básica e eficaz.
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Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.