ODS 1
#RioéRua – Os sabores das calçadas do Lido
A praça não tem mais charme, mas novos bares e antigos restaurantes garantem a tradição boêmia nesta parte de Copacabana
O bar e restaurante Lido foi inaugurado nove décadas atrás com o nome emprestado a um famoso balneário numa ilha de Veneza, que, logo depois, em 1932, passou a abrigar também o festival de cinema mais importante da Itália. Por aqui, nessa mesma época, o restaurante – enorme, caro, com espaço para orquestra e arquitetura em estilo normando – virou um dos marcos do novo bairro chique da cidade, uma Copacabana, que, nos anos 40 e 50, fazia parte dos sonhos do país. Era a vizinhança do Copacabana Palace, dos primeiros edifícios da orla, das boates.
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O Lido fechou em 1957. Mas o nome permanece: a praça, onde o restaurante reinou por três décadas, chamava-se, oficialmente, 26 de Janeiro na época da inauguração e, desde 1952, é Praça Bernardelli. Os cariocas, entretanto, só chamam de Praça do Lido, como Lido também serve para denominar toda a primeira parte de Copacabana, da Princesa Isabel ao Copacabana Palace. A fase chique também passou: multiplicaram-se, com epicentro na Avenida Prado Júnior, clubes de strip-tease, pontos de prostituição, bares com bebidas de procedência duvidosa.
Mas o fim de ano vai chegando, o réveillon de Copacabana é atração nacional e alguém pede uma referência para o amigo de fora do Rio: essa área do Lido é boa para ficar e tem lugares legais? Esta pergunta na minha direção implica, naturalmente, em rua e birita. Fica mal para carioca dizer que Copacabana não é muito a minha praia; dá saudade do sanduíche de pernil e do chope do Cervantes, um clássico da noite, na esquina da Prado Júnior com a Barata Ribeiro, desde 1955. Outros pontos – nem tão clássicos, mas também tradicionais – da gastronomia mais comportada seguem na lateral da praça: a churrascaria Carretão e árabe Amir.
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Veja o que já enviamosA resposta demanda gastar um pouco de sola de sapato – para saber se realmente sobrevive o Baixo Lido, que chegou a ser anunciado. Mas nem é preciso andar tanto: basta atravessar a Nossa Senhora de Copacabana que a Rua Ronald de Carvalho começa a ter a calçada tomada por bares de todos os tipos e tamanhos. Nem todos são os mesmos da minha última passagem por ali, o que faz, pelo menos, uns dois anos: alguns fecharam, outros abriram. O movimento permanece.
A calçada mais agitada ainda é a dos Imortais, já a referência de boteco da rua – chopes variados, cervejas industriais e artesanais, long neck e 600ml. E recomendo, fortemente, o bolinho de milho com calabresa e queijo que foi lançado em um Comida di Buteco e segue no cardápio. No mesmo trecho, entre a Nossa Senhora e a Viveiros de Castro, tem o Beef&Beer, o 4K, um japonês Hachidori, o De Sempre: não tenho referências, mas todos têm vocação para a madrugada.
No outro trecho, até a Barata Ribeiro, é bom preparar o paladar para as delícias de petiscos portugueses da Tasca do Carvalho: de punhetas de bacalhau a tremoços, passando por um raríssimo – por aqui – salpicão. É um micro-restaurante português com mesas na calçada. Ainda por ali, pode-se experimentar os sanduíches do Seu Vidal e as pizzas do Zagga.
A noite na Ronald de Carvalho acaba tarde, mas nem tanto. Para emburacar na madrugada do Baixo Lido, é preciso virar a esquina direção do velho Cervantes, que agora anda fechando cedo, lá pelas 2h. Entretanto, desde 2010, o vizinho Galeto Sat’s, comprado por Sergio Rabello, vai até o amanhecer – sob nova direção, a cozinha melhorou (atenção para a coxa desossada na cachaça) muito e não há oferta de cachaça tão variada na cidade. Para confirmar a vocação boêmia, há cinco meses, foi aberta, entre os dois, uma filial do Bar do David – que desceu do Chapéu Mangueira com sua feijoada de frutos do mar e seus petiscos bicampeões do Comida di Buteco. E, na Barata, ele fecha às 3h, garantindo um triplo movimento na calçada. Os três fecham só um pouco mais tarde que o caçula desse trecho do Lido, o Gastrobar Caju, com uma pegada nordestina.
Saio desse giro pelo Lido animado em indicar o lugar aos visitantes. A única coisa a lamentar é a antiga praça, que piorou com o tempo. Após a derrubada do restaurante, grande parte do espaço ficou para uma escola municipal; a praça encolheu e tem poucos atrativos. Cachorros e seus donos, algumas poucas crianças e uns tantos moradores de rua dividem a área com o busto dos irmãos Bernardelli, donos de uma mansão ali, um século atrás. O casarão deu lugar ao primeiro arranha-céu (12 andares) de Copacabana – o Ribeiro Moreira, conhecido como Edifício OK, construído em 1926. O prédio ainda está lá, com o cenário privilegiado da praia, à espera que a vista da praça melhore também.
#RioéRua
Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade