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Veja o que já enviamos“Não podemos deixar o samba virar folclore”; Tiee resgata elos comunitários do subúrbio
Compositor e cantor destaca importância de valorizar a identidade e as redes de apoio que nascem nas periferias
Se abrirmos agora os rankings das plataformas de streaming, a constatação é óbvia e os números não mentem: o pagode não é apenas um gênero musical, é a trilha sonora oficial do brasileiro. Ele lidera, massifica e movimenta uma indústria milionária. Mas, nesta semana em que celebramos o Dia Nacional do Samba, é preciso olhar para além dos algoritmos, das “trends” e dos milhões de plays.
É necessário enxergar o samba e o pagode pelo que eles realmente são na base da pirâmide social: ferramentas de tecnologia de sobrevivência, identidade e quilombo. Ninguém entende melhor essa intersecção entre o sucesso popular massivo e a responsabilidade comunitária do que Tiee.
O compositor, que durante anos é a “caneta de ouro” emprestando sua poesia para vozes consagradas antes de assumir o protagonismo dos palcos, encerra 2025 reafirmando que sua missão vai muito além do entretenimento. Neste sábado (6), na Ilha Itanhangá, Zona Sudoeste do Rio, ele realiza a última edição do ano do seu projeto autoral, o “Subúrbio”. E ele é categórico ao definir o que o público vai encontrar: “O Subúrbio é mais que um pagode. Pra mim, é uma experiência”.
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Veja o que já enviamosO projeto de Tiee materializa o que sociólogos levam anos para explicar em teses acadêmicas: a rede de solidariedade periférica. O samba cumpre um papel de amparo que o Estado muitas vezes negligencia. Para o artista, o evento é o resgate de um modo de vida, daquela vizinhança onde a porta estava sempre aberta.


Ao descrever a essência do projeto, Tiee define com precisão cirúrgica o que é viver nessa geografia do afeto: “Qual a lembrança de subúrbio que a gente tem? É de ter alguém passando mal e ter quatro carros de vizinho pra levar a pessoa pro médico. É todo mundo se metendo na vida de todo mundo. É aquela coisa de uma rede de ajuda que não foi proposta por ninguém e acaba acontecendo”.
Essa filosofia sai do discurso nostálgico e vai para a prática contundente. O evento mantém uma parceria sólida com o Instituto Papo Reto, do Conjunto de Favelas do Alemão, por meio do ingresso solidário. Segundo a organização, já foram arrecadadas mais de 22 toneladas de alimentos em apenas cinco edições. “A parceria não é só com o Instituto, a parceria é também com quem frequenta o evento, que entende a importância de estar levando um alimento pra poder doar e pra poder fazer o bem”, reforça o sambista.
Além da segurança alimentar, o projeto cuida da autoestima preta. O evento oferece serviços gratuitos como barbeiros, trancistas e massagem, entendendo o ritual de beleza do subúrbio como algo sagrado. Tiee brinca com uma verdade absoluta de quem conhece a rotina do trabalhador: “Suburbano é o cara que vai cortar o cabelo às 9 da manhã e só volta pra casa às 5 da tarde”. É sobre pertencimento e cuidado.
O ponto alto da visão de cantor, no entanto, é o seu posicionamento político-cultural. Prestes a lançar um audiovisual que celebra uma década do álbum que mudou sua vida, gravado em São Paulo, e após lançar a faixa “Meus Heróis” exaltando figuras como Zumbi e Dandara, ele deixa um aviso severo para as novas gerações.
Em tempos de efemeridade digital, Tiee solta a aspa que deveria estampar a semana do samba:
“A gente não pode deixar o samba virar folclore. É isso. A gente tem uma missão. Então, a gente tem que se preocupar com tudo, inclusive com o samba. (…) Eu também me sinto um desses soldados e tô aqui pra isso.”
Para fechar esse ano vitorioso com a benção de quem veio antes, Tiee convocou a realeza para o palco do Subúrbio neste sábado: Leci Brandão, a quem ele chama de “diva” e “rainha”, e Suel, grande amigo e referência musical.
Ao dividir o microfone com Leci, Tiee valida seu trajeto e realiza o sonho do menino que cresceu ouvindo essas referências: “Ter grandes artistas que me influenciaram no Subúrbio (…) é uma grande honraria”. O samba é vivo, é luta e, sob a guarda de soldados como Tiee, jamais será apenas folclore.
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