Vozes das ruas: vítima de tentativas de estupro e homofobia luta por respeito ao lado da namorada

Milena foi abusada sexualmente pelo irmão aos 9. Nas ruas, conseguiu se defender e, hoje, vive uma história de amor e luta com Carol em um ambiente violento e machista

Por Luiza Trindade | ODS 1ODS 10 • Publicada em 27 de julho de 2021 - 11:31 • Atualizada em 3 de agosto de 2021 - 10:11

Milena: “A gente está na rua porque a gente necessita, porque a gente precisa, porque não tem onde ficar” | Reprodução/Vozes das Ruas

Milena: “A gente está na rua porque a gente necessita, porque a gente precisa, porque não tem onde ficar” | Reprodução/Vozes das Ruas

Milena foi abusada sexualmente pelo irmão aos 9. Nas ruas, conseguiu se defender e, hoje, vive uma história de amor e luta com Carol em um ambiente violento e machista

Por Luiza Trindade | ODS 1ODS 10 • Publicada em 27 de julho de 2021 - 11:31 • Atualizada em 3 de agosto de 2021 - 10:11

Milena tinha 21 anos quando a entrevista foi realizada, anteriormente à pandemia de coronavírus. Sem família, na rua desde pequena, com um filho de 1 ano e vivendo um amor com outra mulher em um ambiente violento e completamente machista. Milena faz parte do grupo de sete mil pessoas que vivem em situação de rua no Rio de Janeiro, segundo censo realizado pela Prefeitura em 2020. E do total de 220 mil brasileiros sem moradia a nível nacional. Uma população que cresceu 140% entre 2012 e março de 2020, de acordo com o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

Assista ao episódio da série Vozes da Rua:

Juntamente com outras três histórias, Milena faz parte da nova série documental do #Colabora, Vozes das Ruas. A produção traz depoimentos gravados durante as rondas da ONG Projeto Ruas, que presta apoio e assistência a pessoas sem moradia no Rio de Janeiro.

Mais: Todas as histórias da série Vozes das Ruas

Durante uma dessas rondas do Ruas, Milena conta que teve a vida marcada pela violência desde cedo. Fugiu para rua como tentativa de sobreviver do que acontecia na sua própria casa. Conflitos familiares representam 44,6% entre os motivos que levam a população à rua no Rio de Janeiro. Ela passou anos assistindo o pai agredir repetidamente sua mãe. Aos 9, foi estuprada pelo próprio irmão. Ninguém acreditou nela. Sem saber o que fazer, fugiu.

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Quando eu conheci ela, eu estava namorando um homem, mas ele me batia. Ele chegou a botar uma faca no meu pescoço, só que a Carol entrou na minha frente e me defendeu. Acabamos ficando juntas. Ela é minha heroína, minha princesa, minha rainha, meu tudo.

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“Nós, que dormimos na rua, sofremos muito preconceito. Os outros olham torto, fazem cara de nojo, acham que estamos na rua porque somos ladrões. Mas não é assim. Ninguém está na rua porque quer, a gente está na rua porque necessita, porque não temos onde ficar. Se me dessem uma casa, eu estaria dentro de uma casa, entendeu?”, compartilha. 

Na rua desde muito nova, Milena relata que nunca foi fácil, principalmente por ser mulher e estar atualmente numa relação com outra. Nos seus primeiros anos dormindo na rua, sofreu três tentativas de estupro enquanto estava dormindo. Até a sua história de amor com Carol começou marcada por medo e dor.

“Quando eu conheci ela, eu estava namorando um homem, mas ele me batia, me agredia. Eu fui falar que eu não queria estar mais com ele, ele me agrediu de novo, chegou a botar uma faca no meu pescoço. Só que a Carol entrou na minha frente e me defendeu, ela me salvou. Acabamos ficando juntas. Ela é minha heroína, minha princesa, minha rainha, meu tudo”.

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Quanto está com a namorada, é vítima constantemente de ofensas homofóbicas. Ela afirma que precisou aprender sozinha a se defender. “Eu sou livre, tenho 21 anos, sou maior de idade, e sou lésbica. Ninguém pode tirar isso de mim. Para tirar só me matando”.

Apesar de toda a dor que carrega em suas histórias, ela olha com esperança para o futuro. Milena quer voltar a estudar, conseguir um trabalho e ter um espaço para chamar de casa.  Além disso, busca se manter firme sem deixar a felicidade de ser quem é de lado: “Por mais que eu sofra muito preconceito, eu não ligo para opinião dos outros. Porque se eu ligar para a opinião de alguém, eu não vou ser feliz. Sou muito feliz porque eu estou sendo do jeito que eu sou. E a opinião dos outros não me importa, o que importa é a minha felicidade.”

Mais: Estupros, humilhações e agressões – a vida das mulheres em situação de rua em São Paulo

Ao lançar esta série, fomos atrás de novas informações sobre Milena, mas até o momento não conseguimos contato.

Luiza Trindade

Luiza Trindade é jornalista e cineasta. Seu documentário de estreia é o "Adelante - A luta das venezuelanas refugiadas no Brasil", uma co-produção com a editoria Celina, do jornal O Globo. Ainda abordando esse tema realizou um curta-documental de uma oficina artística com o apoio da PARES Cáritas e do Acnur. Os registros ficaram expostos no Sesc Madureira por um mês em 2019. Luiza trabalhou como assistente de direção no filme "Lulli", da Netflix, e também dirigiu e roteirizou o videoclipe "Granada", da cantora Bia B.

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