Priscila e Leandro não passavam despercebidos na ronda conduzida pelo Projeto Ruas, no Leblon, Zona Sul do Rio de Janeiro. Os dois estavam juntos, trocando beijos, abraços e carinhos. O amor entre eles, que não disfarçavam em deixar público, chamava atenção. Tentei puxar assunto, mas não fui notada. O clima era de afeto e nada mais parecia importar. Quando comentei que queria saber sobre a história deles, algo mudou. Leandro sorriu e comentou: “Estamos na luta até hoje, mas nossa história é bonita”.
Assista ao episódio de Vozes das Ruas:
Juntamente com outras três histórias, Priscila e Leandro fazem parte da nova série documental do #Colabora, Vozes das Ruas. A produção traz depoimentos gravados durante as rondas da ONG Projeto Ruas, que presta apoio e assistência a pessoas sem moradia no Rio de Janeiro.
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Priscila foi sexualmente violentada por seu padrasto aos 10 anos, sua mãe preferiu ficar ao lado dele e por isso ela saiu de casa. Desde então, se encontra em situação de rua. No meio do caminho, começou a se envolver com drogas, motivo que a trouxe para o Rio. Mas essa parte da história ela não gosta de lembrar. Prefere contar da vida que sonha em construir ao lado de Leandro.
[g1_quote author_name=”Priscila” author_description=”Em situação de rua” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Ele fez uma proposta, mandou eu escolher: entre ele e o crack. Eu preferi ficar com ele. Cinco meses que eu não fumo mais. História bonita!
[/g1_quote]Já Leandro, parou de ver sentido na vida quando sua mãe faleceu em 2018. Eles moravam juntos em uma casa na Ilha do Governador, também no Rio. Mas desde o ocorrido, nunca mais entrou na casa em que viviam. Largou tudo e foi para rua.
A história deles, como casal, começa com Leandro incentivando Priscila a parar de consumir drogas. Quando a entrevista foi realizada, em março de 2020, anteriormente à pandemia, Priscila estava há cinco meses sóbria. Juntos, decidiram que iriam construir uma nova vida, iriam trabalhar, alugar uma casa e finalmente começar a família que tanto sonharam. “Ele fez uma proposta, mandou eu escolher: entre ele e o crack. Eu preferi ficar com ele. Cinco meses que eu não fumo mais. História bonita!”, ela se orgulha. Pouco antes das gravações, Priscila estava grávida de gêmeas, mas perdeu as crianças.
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Veja o que já enviamosEles lutam agora para esses planos se tornarem realidade. Conseguiram alguns trabalhos informais, como tomar conta de cadeiras de praias, mas estão em busca de algo mais estável. Segundo censo da Prefeitura do Rio, 42,8% da população em situação de rua da cidade cita o emprego como principal necessidade para a saída das ruas.
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Ficar longe um do outro não é uma opção, por isso desconsideram a ida para abrigos. Perguntei qual era o maior medo deles e os dois responderam quase juntos. “De ficar longe dela. Esse é o meu maior medo”, ele disse. “Eu acho que o mesmo. Eu não fico longe dele”, ela finalizou.
Falar do amor entre duas pessoas em situação de rua é uma tentativa de mostrar a realidade como ela é, humanizada, verdadeira e cheia de possibilidades. É aproximar as narrativas que encontramos na rua com as de pessoas que passam todos os dias por elas. Tentamos conseguir novas informações sobre a história do Leandro e da Priscila para o lançamento desta série, mas até o momento não conseguimos contato.