A primeira Cúpula Mundial de Ajuda Humanitária aconteceu na última semana em Istambul, na Turquia, em meio a um mar de ternos escuros, o que dava uma imagem clara do perfil dos detentores de poder no sistema humanitário global. As mulheres eram basicamente vistas observando as reuniões, e era muito raro encontrar uma participando ativamente das discussões oficiais, ou mesmo de painéis de eventos secundários.
Há muitas conversações sobre uma nova agenda que destaque a importância do envolvimento das mulheres para o futuro da humanidade. Às vezes, as mulheres são consideradas em conjunto com as crianças, uma atitude que, convenientemente, ignora o patriarcado, que causou a exclusão histórica das mulheres dos processos de tomada de decisões em todas as esferas. Outro mantra que está se tornando popular é que precisamos investir em parceiros locais para preparar as respostas humanitárias mais eficazes. A impressão que tenho é que todo mundo está falando por falar, e, infelizmente, ninguém está realmente ouvindo.
Assim, enquanto os homens vestindo ternos abarrotavam o elegante hotel Hilton em Istambul, um pequeno, mas apaixonado grupo de mulheres que trabalham em respostas de emergência se reuniram em sua própria cúpula alternativa. Com apoio do governo australiano, o primeiro Encontro de Mulheres sobre Emergências, promovido pela ActionAid, proporcionou espaço para que lideranças femininas de África, Ásia e Pacífico se organizassem e mobilizassem para desafiar o status quo. O evento reuniu organizações de mulheres e lideranças locais que responderam a emergências recentes, como o tufão Haiyan, nas Filipinas; a crise do Ebola, na Libéria; a seca no Quênia; e os ciclones tropicais no Pacífico.
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Veja o que já enviamosO que é impressionante nesta história são os numerosos obstáculos que as mulheres tiveram que superar para assumir a liderança em respostas de emergência, obstáculos que são consistentes em diversos contextos
[/g1_quote]Com a proliferação de especialistas no setor humanitário, estas mulheres merecem reconhecimento como especialistas em seus próprios direitos. São elas que estão em melhor posição para trabalhar com as comunidades afetadas, tendo o conhecimento vital sobre a cultura e os hábitos locais que podem embasar respostas humanitárias mais efetivas e sustentáveis. Elas têm uma liderança incrível em muitos campos e têm dado provas contundentes disso, utilizando meios de comunicação comunitários para documentar as experiências das mulheres em desastre, treinando líderes comunitários para evitar a propagação do Ebola, mobilizando as mulheres para identificar e responder a riscos específicos de gênero, representando as vozes das mulheres nas comissões de gestão de desastres locais, e fornecendo liderança na distribuição de ajudas, recuperação de meios de subsistência e apoio psicossocial.
Corrida de obstáculos
O que é impressionante nesta história são os numerosos obstáculos que as mulheres tiveram que superar para assumir a liderança em respostas de emergência, obstáculos que são consistentes em diversos contextos. A liderança pautada na experiência dos homens continua a limitar o espaço para o acesso das mulheres às tomadas de decisão e dá limitado – quando o faz – reconhecimento aos seus esforços. A carga de trabalho não remunerado como cuidadoras tem aumentado a cada emergência, particularmente quando há uma infraestrutura e serviços públicos precários. A falta de informação e, em alguns casos, de acesso à educação, tem desafiado a capacidade das mulheres de participar.
No entanto, o que está claro é que as mulheres são incrivelmente resistentes e se recusam a calar. O encontro das mulheres em Istambul deu voz a um forte apelo aos delegados presentes na cúpula oficial: elas querem mais do que compromissos vazios para catalisar a ação para alcançar a igualdade de gênero; elas querem compromissos traduzidos em políticas e planos, com mecanismos de responsabilização fortes e relatórios regulares sobre os progressos. As mulheres querem apoio para seus esforços de organização e mobilização, e nada menos que 50% do financiamento que será destinado a “parceiros locais”. Elas também querem reconhecimento e inclusão no sistema de coordenação de ajuda humanitária da ONU e uma estrutura separada para monitorar de forma independente a igualdade de gênero em cada resposta. E estão exigindo que os governos erradiquem a violência sexual e de gênero por meio de esforços implementados na educação básica nas escolas e, mais importante, acabando com a impunidade para a exploração e o abuso sexual de mulheres em situação de crise.
A mensagem para os homens de terno é clara: trata-se de reconhecimento, representatividade, recursos e respeito pelos direitos das mulheres.