Há quatro anos, o povo indígena Guarani Kaiowa foi viralizado na rede. “#SouGuaraniKaiowa” ou “#SomosTodosGuaraniKaiowa” invadiram o Facebook e o Twitter, assim mesmo com “k” e “w” como os indígenas escrevem sua língua na região do Cone Sul. À época, a mobilização envolveu internautas do país inteiro, muitos dos quais nunca tinham ouvido falar, até então, da etnia, que ocupa a região Sul do Mato Grosso do Sul, do município de Dourados até a fronteira com o Paraguai.
O conteúdo viral se espalhou como um rastilho de pólvora e o estopim foi uma carta onde os índios, ameaçados de despejo por ordem judicial, declaravam: “Pedimos ao governo e à Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/ expulsão, mas decretar nossa morte coletiva e enterrar nós todos aqui”.
De 2012 até agora, nada mudou. Ou melhor, mudou para pior. Os Guaranis Kaiowás continuam protagonizando um dos principais conflitos de terra no país envolvendo índios.
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Veja o que já enviamosNa manhã do último domingo, a terra indígena Kurusu Ambá foi incendiada por pistoleiros durante uma tentativa de retomada da fazenda Madama, ocupada pelos Kaiowás. Barracos foram incinerados. Convocados para prestar segurança aos indígenas, Polícia Militar, Polícia Federal, Departamento de Operações da Fronteira (DOF) e Força Nacional demoraram três dias para aparecer no local.
“É um jogo de empurra-empurra”, denuncia o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto.
Em nota, a entidade protestou afirmando que “enquanto novos crimes e atentados premeditados podem estar prestes a ocorrer, as forças policiais, o Ministério da Justiça e o governo do estado do Mato Grosso do Sul assistem a tudo calados, garantindo assim aos jagunços porteira aberta para a possibilidade de novos assassinatos”.
Entre as maiores etnias, juntamente com os Tikúna e os Kaingang, os Kaiowás somam uma população de cerca de 45 mil pessoas, segundo Censo do IBGE. Apesar de numerosos, eles vivem espalhados em terras não contíguas e lutam desde 2007 pela demarcação de suas áreas – mais três, além das oito reservas já criadas.
O processo de demarcação se arrasta há quase uma década. Todos os prazos já estouraram. O relatório de identificação sobre a área indígena deveria ter sido publicado pela Funai (Fundação Nacional do Índio ) em 2010, segundo Termo de Ajustamento de Conduta estabelecido pelo Ministério Público Federal.
Vivendo numa área de influência do agronegócio – especialmente pecuária, cana-de-açúcar e soja, três das principais commodities brasileiras – os Kaiowás vêm ajudando a engrossar as estatísticas oficiais de suicídios nas terras indígenas. A maioria das vítimas é jovem, do sexo masculino e o enforcamento é o método mais adotado.
Os Kaiowás são vítimas de um governo, que, segundo o Cimi, foi o que menos homologou terras indígenas, uma média de 3,6 por ano. Nos oito anos da administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foram 79 homologações, média de 10 por ano. As gestões de Fernando Henrique Cardoso fizeram 145 homologações em oito anos, 18 por ano. Os antecessores também demarcaram mais terras do que Dilma: 9 por ano na gestão de Itamar Franco; 56 por ano no período de Fernando Collor de Melo; e 13 por ano na presidência de José Sarney.