Uma costa rica em bons exemplos

A praia de Ostional, um dos refúgios nacionais de vida selvagem na Costa Rica. O país tem o melhor desempenho ambiental da América Latina. Foto Iuri Cortez

Adversário do Brasil na Copa é um dos países mais sustentáveis e democráticos do mundo

Por Agostinho Vieira | ODS 14 • Publicada em 21 de junho de 2018 - 08:52 • Atualizada em 23 de junho de 2018 - 15:20

A praia de Ostional, um dos refúgios nacionais de vida selvagem na Costa Rica. O país tem o melhor desempenho ambiental da América Latina. Foto Iuri Cortez
A praia de Ostional, um dos refúgios nacionalis de vida selvagem na Costa Rica. O país tem o melhor desempenho ambiental da América Latina. Foto Iuri Cortez
A praia de Ostional, um dos refúgios nacionais de vida selvagem na Costa Rica. O país tem o melhor desempenho ambiental da América Latina. Foto Iuri Cortez

O que a pequena Costa Rica, com uma área do tamanho do Rio Grande do Norte e uma população menor que a da cidade do Rio de Janeiro, pode ter em comum com um país continental como o Brasil? A paixão pelo futebol certamente é um dos exemplos, mas não é o único. Outra semelhança é histórica. Dois países colonizados por europeus, que se tornaram independentes no início do século XIX: a Costa Rica em 1821 e o Brasil em 1822. Ambos passaram anos vivendo da exportação do café, do açúcar e da exploração do trabalho escravo. Só que lá, a abolição veio 50 anos mais cedo. Assim como o voto direto, que existe desde 1913. Aqui, como todos sabem, essa conquista custou um pouco mais caro e veio muito mais tarde.

A próxima meta da Costa Rica é se transformar, até 2021, na primeira nação carbono zero do mundo. O projeto inclui novos investimentos em transporte público, eletrificação dos automóveis, produção de gás natural, técnicas agroflorestais e redução do uso de fertilizantes na agricultura

A biodiversidade é outro tema que nos aproxima. O Brasil, em seus 8,5 milhões de quilômetros quadrados, abriga 20% das espécies do planeta. Já a Costa Rica, com apenas 51 mil km2, concentra 5% da fauna e da flora mundial. O que fez com que as universidades de Yale e de Columbia, nos EUA, dessem ao país o título de Melhor Desempenho Ambiental da América Latina e terceiro melhor do mundo.

E essa relação com o meio ambiente é uma das muitas lições que podemos aprender com  o nosso adversário na Copa do Mundo.  Até 1970, cerca de 80% das florestas costa-riquenhas haviam sido destruídas pelo agronegócio, especialmente pela criação de gado – qualquer semelhança com outra nação ao sul do continente será mera coincidência.  Desde então, os sucessivos governos decidiram investir em preservação. Entenderam que manter a floresta em pé seria muito mais lucrativo para o país e para o seu povo do que derrubá-la. A principal medida foi o estabelecimento do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Produtores rurais e comunidades tradicionais passaram a receber dinheiro para restabelecer e preservar a vegetação nativa. Hoje, quase 50 anos depois, mais da metade do território nacional é coberto por florestas e 25% abriga parques nacionais e áreas protegidas.

Turistas no Parque Manuel Antonio. O turismo ecológico é uma das principais fontes de divisas do país. Foto Bertrand Gardel/ Hemis/FR
Turistas no Parque Manuel Antonio. O turismo ecológico é uma das principais fontes de divisas do país. Foto Bertrand Gardel/ Hemis/FR

Um dado curioso é a fonte dos recursos que financiam estes pagamentos. O dinheiro vem dos impostos cobrados da produção de energia, especialmente dos combustíveis fósseis. É a economia marrom financiando uma das nações mais verdes do planeta. Atualmente, além de receber recursos de países desenvolvidos como compensação pelo carbono absorvido por suas florestas, a Costa Rica virou sinônimo de sustentabilidade. O turismo ecológico e de aventura é a sua principal fonte de divisas, além da crescente indústria de alta tecnologia. Empresas como a Intel e a Amazon são dois exemplos dessa nova economia.

A próxima meta da Costa Rica é se transformar, até 2021, na primeira nação carbono zero do mundo. É verdade que as emissões do país já são muito baixas e que o objetivo não é tão desafiador quanto parece, mas o caminho está traçado e ele inclui novos investimentos em transporte público, eletrificação dos automóveis, produção de gás natural, técnicas agroflorestais e redução do uso de fertilizantes na agricultura.

Mas tudo isso só foi possível por conta de um detalhe importante: a estabilidade política. A Costa Rica é considerada uma das 22 democracias mais antigas e consolidadas do mundo. Aliás, o presidente recém-eleito, Carlos Alvarado, do Partido Ação Cidadã, formou um gabinete com maioria feminina e tem como vice-presidente a economista Epsy Campbell Barr, que é a primeira mulher negra a ocupar o cargo na América Latina. Desde 1948 o país abriu mão do seu exército e a segurança é feita por uma Guarda Nacional. Coincidência ou não, o fato é que a Costa Rica é uma das poucas nações da América Latina que passou incólume pelo século XX, sem enfrentar nenhum golpe militar ou guerra civil.

O dinheiro economizado com o fim das forças armadas foi investido em educação e saúde. Com resultados claros e óbvios: 96% da população alfabetizada, expectativa de vida de 79 anos, IDH de país desenvolvido, 96% das mulheres com acesso a métodos contraceptivos, primeiro lugar da América Latina em Liberdade Imprensa, terceiro menos corrupto do continente e primeiro em índice de satisfação da população. Talvez a gente não tenha quase nada a aprender com eles em termos de futebol, mas seria bom olhar com atenção para o resto. Tem muita coisa boa sendo feita por lá. Como diz o slogan oficial da Costa Rica: Pura Vida.

Agostinho Vieira

Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.

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