ODS 1
Lições de sustentabilidade na Rocinha
Favela Verde
“Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio, pois quando isso acontece já não se é o mesmo, assim como as águas já serão outras”, ensinou o filósofo grego Heráclito de Éfeso. Do alto da favela da Rocinha, no Laboriaux, as águas que correm pelo Rio Rainha são limpas e cristalinas. Ao atravessar a comunidade, no entanto, ficam escuras e poluídas. Uma vez por semana, integrantes da ONG Favela Verde ensinam aos alunos da Escola Municipal Abelardo Chacrinha Barbosa a importância de se preservar o meio ambiente com atitudes como não jogar lixo no rio. A atuação da organização, no entanto, não fica apenas nas palavras: a turma põe a mão na massa. Ou melhor, na terra.
O projeto, chamado Quartas Ambientais, é realizado desde o ano passado no colégio, localizado na parte mais alta da favela. Cerca de 120 crianças, entre 8 e 12 anos, aprendem a cuidar de uma horta: criam minhocas, para preparar o adubo, plantam e colhem as verduras e legumes. “O projeto se divide em três eixos: manejo de resíduos orgânicos para fazer o adubo, plantio ecológico e, no final da cadeia, alimentação saudável”, conta o biólogo Caio Oliveira, coordenador pedagógico da ONG.
Da horta saem alimentos como inhame, tomate, cebola, feijão, espinafre e batata. Caio percebe mudanças significativas no comportamento dos alunos que participam do projeto Quartas Ambientais, que conta com o apoio da rede Megamatte. Assim como o rio, que ao descer a comunidade se torna outro, as crianças também se transformam. Mas, neste caso, para melhor. “Elas aprendem a identificar as plantas e a comer de maneira mais saudável. Já sabem o que é adubo, solo, nutrientes e enriquecem seu conhecimento ambiental. Além disso, passam o que aprendem para suas famílias”, diz Caio.
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Veja o que já enviamosUtilizamos técnicas sustentáveis no processo de urbanização. Fizemos banquinhos de palha, escadas de pneus, corrimãos com bambus. Materiais fáceis de encontrar na comunidade
[/g1_quote]Mas as ações da ONG não se restringem ao colégio. A Favela Verde está promovendo melhorias na Caixinha, espécie de praça no Laboriaux – região que, no passado, era uma das mais violentas da comunidade. “Utilizamos técnicas sustentáveis no processo de urbanização. Fizemos banquinhos de palha, escadas de pneus, corrimãos com bambus. Materiais fáceis de encontrar na comunidade”, explica o botânico e educador ambiental Igor Jaffar. A Caixinha ganhou também uma horta e uma pequena quadra de futebol. A reforma ainda está em andamento e a organização busca apoio de empresas e da prefeitura.
Os membros e voluntários da ONG ressaltam que tudo é feito a partir de demandas da população. “As ações são sempre colaborativas e associativas, como forma de empoderar as pessoas. Queremos envolver ainda mais a comunidade”, afirma Caio.
Outro projeto da Favela Verde é desenvolver o ecoturismo na Rocinha. Mas esqueça a cena dos jipes cheios de gringos entrando na favela como se estivessem num safári. O objetivo do projeto Caminhos do Lagarto é capacitar jovens locais para guiar turistas nas trilhas que saem da favela. Entre eles, muitos universitários estrangeiros. O trajeto que começa no Laboriaux vai até o Parque da Cidade ou Vista Chinesa, integrando a Trilha Transcarioca, que conecta o Rio de Janeiro por um percurso de aproximadamente 180 quilômetros. Por meio de uma parceria com o Sebrae, cerca de 10 pessoas já foram formadas, ajudando a gerar renda para a população da favela. “Os moradores conhecem as trilhas, é a história contada por quem a vive de dentro”, diz o voluntário Yuri Carvalho.
A Favela Verde surgiu em 2011 no morro Chapéu Mangueira, no Leme, mas foi obrigada a interromper suas atividades após algum tempo. Retornou em 2013, na Rocinha, no Laboriaux. “Começamos nossa ação por meio do projeto ‘Preserva Laboriaux’, que reunia associações de moradores e outras organizações. Havia uma demanda da população e um movimento de resistência para que as casas da área não fossem removidas”, explica Federica Polazzi, vice-diretora e fotógrafa da Favela Verde.
Em 2010, fortes chuvas derrubaram casas e deixaram duas pessoas mortas no Laboriaux. A escola Abelardo Chacrinha Barbosa foi interditada e só voltou a funcionar no local em 2013. Chegou-se a falar na remoção de quase toda a parte alta da Rocinha. O projeto Preserva Laboriaux possibilitou a limpeza do rio e da mata e, principalmente, o plantio de espécies típicas da Mata Atlântica na encosta, protegendo a comunidade de futuros deslizamentos. Batizado de Floresta Comestível, o local conta com horta e árvores frutíferas e recebe a visita dos alunos da ONG em ações pedagógicas. “O Laboriaux fica na área de amortecimento do Parque Nacional da Tijuca, que é nosso parceiro nos projetos. É na periferia do parque, região importante para minimizar a ocupação do entorno e proteger a mata”, finaliza Caio.
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Denis Kuck é jornalista desde criança, quando acompanhava o pai repórter nas sessões da CPI do PC, em Brasília. Anos depois, formou-se pela UFRJ, foi assistente do escritor Fernando Morais e trabalhou nas redações do Ciência Hoje, O Globo, Agência EFE e do irreverente Perú Molhado, de Búzios. Recentemente, no Comitê Rio 2016, foi editor/repórter do jornal distribuído dentro da Vila Olímpica, o Village Life. Atualmente, é freelancer e editor do Notícias em Português, publicação de Londres.
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