Como se sentir na Amazônia em São Paulo?

Kleber Santos com óculos 3D do Greenpeace. Foto de Divulgacao

Greenpeace lança mão de tecnologia 3D para aumentar captação de recursos

Por Florência Costa | FlorestasODS 14 • Publicada em 2 de fevereiro de 2017 - 09:00 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:53

Kleber Santos com óculos 3D do Greenpeace. Foto de Divulgacao
Kleber Santos com óculos #D do Greenpeace. Foto de Divulgacao
Com os óculos 3D, o bancário Kleber Santos é transportado para o Rio Tapajós, apesar de estar em São Paulo, a maior metrópole do país. Foto de Divulgação

O barco desliza pelo Rio Tapajós. O barulho da água acaricia o ouvido. Ao fundo, sons de macacos e de papagaios, como se eles estivessem nas proximidades. As buzinas do trânsito de São Paulo atrapalham a viagem por alguns segundos. Aos poucos, o barulho urbano vai sumindo. Você vê a Floresta Amazônica, de uma altura de 30 metros, e tem a sensação de estar assistindo tudo de um dos galhos de uma copa de árvore gigante. Chega a dar um frio na espinha. Ao fundo, uma voz suave. É a apresentadora Marina Person, a guia neste passeio virtual pela maior floresta tropical do mundo. A realidade amazônica atropela a paulistana após alguns segundos de um vídeo produzido pelo Greenpeace. O filme é exibido em óculos de realidade virtual para as pessoas nas ruas da maior metrópole do país.

Maior organização de defesa do meio ambiente do mundo, o Greenpeace utiliza, desde meados do ano passado, a tecnologia 3D para explicar melhor ao cidadão as suas causas. Os óculos de realidade virtual são um instrumento a mais no processo de conscientização e de captação de recursos financeiros da ONG.

“A Floresta Amazônia é um paraíso e até agora a gente só conhece um pedacinho da fauna e da flora. Mas hoje surge uma ameaça. O governo brasileiro está planejando construir mais de 40 hidrelétricas na área”, alerta a locutora. Em seguida, Marina afirma que o projeto ameaça este paraíso da biodiversidade e os últimos rios que correm livres na região amazônica. O vídeo, de pouco mais de um minuto, de agosto de 2016, mostra o dia-a- dia do povo Mundurucu, que vive há séculos na sua terra Sawré Muybu e resiste à destruição da floresta, com apoio do Greenpeace.

“Parece que a gente está lá na Amazônia. Ajuda a entender melhor a defesa da floresta, sem dúvida nenhuma”, disse o bancário Kléber Fernando Santos, 31 anos, que parou para ouvir as explicações dos representantes do Greenpeace em seu horário de almoço, pouco depois de sair de um restaurante na Avenida Paulista.

“Queremos mostrar a Amazônia e a beleza deste lugar para as pessoas que nunca foram lá e talvez nunca tenham a oportunidade de ir”, explica Pedro Espinoza, diretor de Captação de Recursos do Greenpeace Brasil. Os vídeos dos óculos de realidade virtual são exibidos dentro de shopping centers e em eventos específicos que reúnem muita gente em São Paulo. “O resultado em termos de captação não é tão grande quanto imaginávamos no início, mas eles ajudam a fidelizar o apoiador”, diz.

Interatividade

A ideia do Greenpeace é distribuir os óculos para os doadores e enviar periodicamente links de vídeos, até mesmo em forma de séries, para manter a conscientização das pessoas de forma mais interativa. “Vamos usar cada vez mais a tecnologia”, ressalta Espinoza .

A pessoa que entendeu a causa, mesmo que não se torne doadora, depois provavelmente vai trocar informações com a família e os amigos. “Assim, ajuda a espalhar a mensagem e a plantar uma semente”, afirma. É muito importante para a ONG explicar da maneira mais realista possível as causas que defende. Seu financiamento ocorre única e exclusivamente através de doadores comuns, pessoas físicas.

“Não aceitamos doações de empresas, de governo e de partidos, porque precisamos ter independência e credibilidade”, explica Espinoza. No Brasil, 60 mil pessoas apoiam o Greenpeace com doações mensais (uma média de R$ 40). No mundo, são mais de três milhões de apoiadores.

O trabalho de rua é árduo. Os representantes da ONG levam, em média, mais de duas horas para conseguir um doador. “Para conseguir um parceiro é preciso abordar entre 25 e 30 pessoas”, informa Espinoza. Mais de 160 representantes do Greenpeace conversam com as pessoas nas ruas de São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Curitiba, Salvador e Porto Alegre, durante seis horas por dia, convidando-as para participar da ONG. “Elas são o nosso sangue. Só conseguimos trabalhar por causa deste apoio”, ressalta o diretor de Captação de Recursos.

[g1_quote author_name=”Pedro Espinoza” author_description=”diretor de Captação de Recursos do Greenpeace Brasil” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]

Hoje, a cultura da doação está aumentando porque as pessoas começam a se dar conta de que existem organizações que precisam de ajuda para sobreviver

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Foi o Greenpeace que inventou a estratégia do diálogo direto com as pessoas nas ruas – copiada depois por várias outras ONGs. “Começou na Europa, nos anos 90”, lembra Espinoza. Estes grupos já estão presentes nas ruas das capitais brasileiras há 10 anos. “Antes disso, a América Latina não fazia levantamento de fundos, não havia cultura de doação”, observa Espinoza, lembrando que os países da região haviam saído recentemente de regimes ditatoriais e amargavam altos índices de pobreza.

“Quando os países começaram a crescer, as organizações filantrópicas pararam de receber dinheiro internacional, porque eles não eram mais prioridade. O dinheiro começou a ir para países com problemas mais graves”, conta. “Hoje a cultura da doação está aumentando porque as pessoas começam a se dar conta de que existem organizações que precisam de ajuda para sobreviver”, diz. Quanto mais ONGs saírem às ruas nas campanhas de arrecadação melhor. “As pessoas passam a compreender e a doar mais. Isso contribui com a cultura da doação e com a conscientização das pessoas, que percebem que podem ser agentes de mudanças”.

Florência Costa

Jornalista freelance especializada em cobertura internacional e política. Foi correspondente na Rússia do Jornal do Brasil e do serviço brasileiro da BBC. Em 2006 mudou-se para a Índia e foi correspondente do jornal O Globo. É autora do livro "Os indianos" (Editora Contexto) e colaboradora, no Brasil, do website The Wire, com sede na Índia (https://thewire.in/).

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2 comentários “Como se sentir na Amazônia em São Paulo?

  1. Pato disse:

    Galera do Colabora, a matéria está muito boa, mas confesso que dá um certo bode ler reportagens que contrapõem uma São Paulo sempre caracterizada como cidade cinzenta, caótica e insuportável, versus um ambiente natural idílico e perfeito. Frases como “as buzinas do trânsito de São Paulo atrapalham a viagem por alguns segundos”, que aparece no texto, e “nas ruas da (cada vez mais) cidade cinza”, que aparece na newsletter, provavelmente entram mais como detalhes para mostrar o contraste cidade horrorosa X floresta maravilhosa do que como descrição real, até porque o uso do óculos 3D se dá dentro de shoppings e eventos, como a matéria descreve. Queria sugerir que nas próximas matérias vocês observem se não estão depreciando desnecessariamente as cidades, em especial São Paulo, que só leva porrada. Tem que criticar e falar a verdade sobre os problemas da cidade, mas não fazer disso um massacre a cada oportunidade. Cidades são lugares incríveis, cheios de diversidade, oportunidades, é onde a sociedade convive com mais vigor. O campo ou a floresta tampouco são paraísos em todos os aspectos, vide a pobreza e a desigualdade gritantes que existem no meio rural. Dá para falar de uma realidade sem idealizá-la e sem enxovalhar as outras. Se fosse uma matéria sobre o uso dos óculos 3D no Centro do Rio, vocês fariam uma descrição depreciativa? “O fedor de urina e o medo de assalto atrapalham um pouco a viagem”…isso soaria forçado, porque o Rio é muito mais do que fedor de urina e medo de violência, assim como São Paulo é muito mais do que cinza e trânsito.

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