ODS 1
Os furacões e a inequidade
Desigualdade provoca mais prejuízos materiais e humanos do que as catástrofes naturais
O termo da moda atualmente é resiliência, talvez por esta qualidade ser cada vez mais exigida da população. O termo resiliência começou a ser usado na década de 70 para explicar o comportamento de um sistema ecológico, definido basicamente por duas propriedades: resiliência e estabilidade. A primeira, determina a persistência das inter-relações dentro de um sistema e representa uma medida de habilidade desse sistema em absorver mudanças e manter sua funcionalidade. A segunda, a habilidade de um sistema em retornar a um estado de equilíbrio após sofrer um distúrbio temporário. Nesse contexto, a resiliência pode ser entendida como a capacidade de um sistema em antecipar e absorver potenciais distúrbios, desenvolver meios adaptativos para acomodar as mudanças e de estabelecer formas de resistir ou recuperar suas funcionalidades no menor tempo possível.
[g1_quote author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”solid” template=”01″]O conceito de equidade precisa ser considerado ao se avaliar os impactos das mudanças e alterações climáticas, sejam elas provocadas ou não pelo homem. A discussão sobre a responsabilidade histórica é menos relevante. O que deve importar é a capacidade de enfrentar o problema coletivo, de restaurar a equidade entre nossa população
[/g1_quote]Já em engenharia, a noção de resiliência é relativamente nova e é considerada como um conjunto de habilidades de um sistema de infraestrutura para resistir a possíveis riscos, absorver danos iniciais e recuperar a operação normal. No contexto das mudanças do clima, a resiliência significa a capacidade de os sistemas manterem suas funcionalidades no caso de eventos meteorológicos ou climáticos adversos.
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Veja o que já enviamosNesse sentido, nosso planeta apresenta uma boa resiliência, pois passado os fenômenos naturais perturbadores como furacões, terremotos, alteração de temperatura média, antropogênica ou natural, entre outros, tudo retorna ao curso anterior com pequenas consequências ou se acomoda em um novo equilíbrio, voltando assim à “ operação normal”. O que não é resiliente é a população que habita o planeta. Além disso, a resiliência humana é muito diversa com enorme variedade em função da localização geográfica e das condições socioeconômicas e culturais.
De acordo com Aristóteles, devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade. Essa abordagem nos leva à discriminação positiva, pois não se pode impor a todos os indivíduos as mesmas obrigações e os mesmos direitos. Adicionalmente nos remete ao conceito da equidade, originário também da Grécia, onde não se reconhecia o direito individual com adaptações de forma a deixar as regras mais justas. As mudanças climáticas evidenciam a enorme inequidade em que vivemos. Os locais e a populações que mais sofrem os efeitos dessas mudanças são aquelas com menor capacidade de enfrentá-las, além de serem as que pouco contribuíram para sua ocorrência.
As catástrofes naturais e as provocadas pelo homem ressaltam a diferença de resiliência entre nações e pessoas. Um furacão que atinge os EUA ainda que com enormes transtornos e danos, é percebido de uma maneira menos traumática do que se fosse no Haiti por exemplo. No caso, a resiliência da população americana é infinitamente superior à dos haitianos. Sua capacidade de se recuperar dos estragos, de restaurar a sua economia, de resgatar e tratar de seus feridos e desabrigados é muito maior.
Desta forma, o conceito de equidade precisa ser considerado ao se avaliar os impactos das mudanças e alterações climáticas, sejam elas provocadas ou não pelo homem. A discussão sobre a responsabilidade histórica é menos relevante. O que deve importar é a capacidade de enfrentar o problema coletivo, de restaurar a equidade entre nossa população. A inequidade e desigualdade provocam mais prejuízos materiais e humanos do que as catástrofes naturais.
A Terra é resiliente, nós é que não somos.
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Engenheira mecânica com doutorado em engenharia de produção. Professora da COPPE/UFRJ, presidente do Comitê Científico do Painel Brasileiro de Mudança Climática e coordenadora do Fundo Verde da UFRJ.