Diário da Covid-19: Colômbia ultrapassa a marca dos mil casos diários

Brasil supera os EUA em número de novos casos e caminha para assumir a liderança isolada do ranking das variações absolutas diárias

Por José Eustáquio Diniz Alves | ODS 3 • Publicada em 29 de maio de 2020 - 10:53 • Atualizada em 30 de maio de 2020 - 09:07

Com sua máscara de proteção,indígena colombiano Huitoto navega em uma balsa ao longo do rio Takana, em Leticia. Foto Tatiana de Nevó/AFP

A América do Sul é o atual epicentro da pandemia da covid-19 e está deixando o mundo preocupado com a situação de descontrole da doença. Mas no continente mais desigual do mundo em termos socioeconômicos, a heterogeneidade acontece também na capacidade de deter o novo coronavírus. Do lado do sucesso, estão Paraguai e Uruguai que evitaram a propagação exponencial da transmissão comunitária e são as nações que apresentam menores cifras de casos e óbitos. No lado do fracasso, está o Brasil que é o líder absoluto e isolado do continente, vindo em seguida o Peru.

A Colômbia está exatamente no meio termo, pois está atrás de Brasil, Peru, Chile e Equador, mas está à frente dos números da Argentina, Bolívia, Venezuela, Uruguai e Paraguai. O país de Gabriel Garcia Márquez começou o mês de maio com menos de 500 casos diários da covid-19 e está terminando o mês com mais de 1.000 pessoas infectadas diariamente. No dia 02 de maio teve 10 vidas perdidas para o coronavírus e chegou a 27 óbitos no dia 27/05. A situação da Colômbia não é tão crítica quanto a do Brasil, Equador e Peru, mas preocupa pela tendência de crescimento do surto.

O quadro contrastante entre a Colômbia e o Brasil tem cores fortes. O Brasil tem uma população 4,2 vezes maior do que a da Colômbia, mas registrou 17,3 vezes mais pessoas infectadas e 32,5 vezes mais vidas perdidas. O Brasil que ultrapassou os Estados Unidos (EUA) em número diário de mortes por 3 vezes nesta semana, ontem ultrapassou em número de novos casos, indicando que caminha para a liderança isolada do ranking das variações absolutas do dia a dia. Outro recorde quebrado na quinta-feira (28/05) ocorreu no estado do Rio de Janeiro que atingiu a cifra acumulada de 4.856 óbitos, superando os 4.634 óbitos totais da China.

Shopping center em Bogotá adota medidas de contenção do coronavírus no banheiro público. Foto Juan Barreto/AFP
Shopping center em Bogotá adota medidas de contenção do coronavírus no banheiro público. Foto Juan Barreto/AFP

O sucesso relativo da Colômbia em relação ao Brasil não é gratuito. No país andino e voltado para o Pacífico, houve um desentendimento inicial entre as diversas esferas do Poder Público, mas logo em seguida eles obtiveram um certo grau de acordo e um apoio da sociedade civil na luta local contra o coronavírus. No país atlântico, a situação é bem diferente, com muita polarização política, divergências de toda ordem e um presidente da República – que junto com a família e seguidores políticos – prefere atacar as instituições democráticas do que combater a propagação do coronavírus.

Para compreender a situação colombiana, vamos iniciar este diário com uma breve caracterização sociodemográfica e econômica do país, apresentar os dados da covid-19 na América do Sul e trazer ao público brasileiro uma entrevista com a pesquisadora colombiana Magda Ruiz Salguero, doutora em demografia pela Universidade Autônoma de Barcelona, trabalhou no CELADE/CEPAL como Assessora Regional em Demografia e Informação sobre População, em Santiago do Chile, e é participante ativa da Associação Latino Americana de População (ALAP).

Breve panorama demográfico e socioeconômico da Colômbia

A nação das Américas que leva o nome de Cristóvão Colombo é o segundo país mais populoso da América do Sul, tem uma área de 1.138.914 km2 e uma densidade demográfica de 44 habitantes por km2. Segundo a Divisão de População da ONU, a Colômbia tinha uma população de 12 milhões de habitantes em 1950, chegou a 50,9 milhões em 2020 e deve chegar, na projeção média, a 45,2 milhões de pessoas em 2100.  As mulheres colombianas tinham em média 6,5 filhos no quinquênio 1950-55, acima da média da América Latina e Caribe (ALC), mas no quinquênio 2015-20 já se encontra abaixo do nível de reposição e abaixo da média da ALC, com 1,8 filho por mulher. O Índice de Envelhecimento (IE) era de 12 idosos (60 anos e mais) para cada 100 jovens de 0 a 14 anos e está em 59 idosos por 100 jovens atualmente. Em consequência, a Colômbia possui uma estrutura etária rejuvenescida, o que propicia melhores condições para reduzir a letalidade da pandemia do novo coronavírus.

A tabela abaixo apresenta alguns indicadores demográficos para a Colômbia, Brasil, América do Sul, ALC e o mundo. A Colômbia tinha uma mortalidade infantil (MI) um pouco abaixo da média da América Latina e uma esperança de vida ao nascer (Eo) um pouco acima, em meados do século passado e manteve a pequena vantagem no quinquênio 2015-20. Ou seja, a Colômbia tem acompanhado a ALC na transição demográfica e está em pleno momento favorável do bônus demográfico.

A Colômbia tinha, em 1980, uma renda per capita de US$ 2,8 mil, abaixo da renda do Brasil (US$ 4,9 mil), da ALC (US$ 4,7 mil) e do mundo (US$ 3 mil), conforme mostra o gráfico abaixo, com base nos dados do FMI, a preços correntes, em poder de paridade de compra (ppp na sigla em inglês). Mas, nas duas últimas décadas do século XX, foi ficando para trás e no ano 2000 tinha apenas 72% da renda média da ALC. Contudo, nos últimos anos a Colômbia vem crescendo mais rápido do que a média da região e chegou a US$ 15,8 mil em 2019, contra algo em torno de US$ 16,6 do Brasil e da ALC e de US$ 18,4 mil da média mundial.

O melhor desempenho econômico da Colômbia em relação aos seus vizinhos da América do Sul, foi interrompido pela pandemia da covid-19. O estudo da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), “Dimensionar los efectos del COVID-19 para pensar en la reactivación” (21/04/2020), mostra que a pandemia da covid-19 pegou a ALC em um momento de debilidade macroeconômica, pois, no decênio posterior à crise financeira de 2008/09, o continente apresentou em média o menor crescimento desde a década de 1950.

A Cepal estima um aumento do desemprego e da pobreza e uma redução da renda per capita em todos os países da região. Estima também uma queda do PIB, em 2020, de -5,3% na ALC, de 5,2% no Brasil, de 5,2% na América do Sul e de 2,6% na Colômbia, que deve ser um dos países menos impactados pela recessão internacional. Evidentemente, quanto maior for o estrago da pandemia maior será o pandemônio econômico e maior será o sofrimento das nações que não conseguirem conter a multiplicação do novo coronavírus.

 Dados sobre a Covid-19 no mundo, na América do Sul, no Brasil e na Colômbia

A América do Sul tem se tornado um enorme foco de propagação da pandemia do novo coronavírus. O Brasil é o principal epicentro internacional, pois, possui 2,7% da população, mas tem 7,4% dos casos e dos óbitos. A América do Sul tem 5,5% da população mundial, mas tem 12,8% dos casos e 10,2% dos óbitos. A Colômbia que tem 0,7% da população mundial, tem 0,4% dos casos e 0,2% dos óbitos globais.

A tabela abaixo mostra que a Colômbia tem o sexto coeficiente de incidência do continente, com 499 casos por milhão de habitantes e, também, o sexto coeficiente de mortalidade com 16 óbitos por milhão de habitantes.  O número de testes da Colômbia é baixo 4.972 por milhão, embora seja maior do que os da Bolívia, Argentina, Paraguai e Brasil.

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O gráfico abaixo, do site “Our World in Data”, mostra o número acumulado de casos nos 10 maiores país da América do Sul e a velocidade de crescimento. Nota-se que, com exceção de Paraguai, Uruguai e Venezuela, o ritmo dos demais países tende a dobrar em torno de 10 dias.

O gráfico abaixo, também do site “Our World in Data”, mostra (também em escala logarítmica) a evolução do número acumulado de óbitos nos 10 maiores países da América do Sul. Quanto mais vertical mais veloz é o aumento do número de óbitos. O destaque, evidentemente, é o Brasil.

Entrevista com Magda Ruiz sobre a pandemia da covid-19 na Colômbia

Para entender melhor o que acontece no nosso vizinho do noroeste, fizemos uma entrevista com a demógrafa colombiana Magda Ruiz que conhece bem a realidade do país e da América Latina e está super capacitada para nos dizer sobre as ações realizadas pela Colômbia para controlar o perigo da covid-19.

Magda Ruiz, demógrafa colombiana. Foto Arquivo Pessoal
Magda Ruiz, demógrafa colombiana. Foto Arquivo Pessoal

 

Quando a Colômbia percebeu a gravidade da pandemia?

Magda Ruiz – Em meados de janeiro quando foi criado Comitê de Emergência e se explicou a gravidade do que estava acontecendo na China, ao mesmo tempo se confirmava que não havia casos no país. Recomendações foram feitas para lavagem frequente e completa das mãos, uso de máscaras faciais, isolamento em caso de apresentar sintomas de doenças respiratórias e limpeza de superfícies. Foi ressaltado que no período de janeiro a abril, em várias regiões do país, geralmente ocorre um surto de doença respiratória, motivo pelo qual recomendavam medidas de muito cuidado e atenção. Embora essas medidas estivessem corretas, mensagens de diferentes autoridades apontavam que o risco da doença chegar ao país era baixo, reduzindo a força das mensagens.

Em fevereiro foram fornecidas informações sobre as ações em andamento na área de preparação, vigilância e prevenção diante da possibilidade que a covid-19 chegasse ao país; no final desse mês foram finalizados os procedimentos para um voo humanitário, a fim de retornar para a Colômbia 13 estudantes que estavam em Wuhan, que ao chegar foram colocados em quarentena rigorosa junto à tripulação do avião. No início de março o nível de risco foi alterado de moderado para alto, porque nove países com os quais a Colômbia faz intercâmbios já apresentavam casos locais. No entanto, naquele momento ainda não tinha sido mencionado que a quarentena poderia ser um mecanismo para conter a doença no caso dela chegar ao país. Tampouco foi mencionado que poderia haver transmissão por pessoas assintomáticas. O primeiro caso relatado na Colômbia corresponde a uma jovem de 19 anos que chegou a Bogotá vinda da Itália em 2 de março, com sintomas desde 27 de fevereiro, com diagnóstico de confirmação em 6 de março e que recebeu alta em 13 de março.

Que medidas sanitárias foram tomadas pelo governo e pela sociedade civil?

Magda Ruiz – Em 10 de março, um dia antes da declaração de pandemia pela OMS, 9 casos tinham sido identificados no país (6 importados e 3 comunitários) e medidas de isolamento foram tomadas para quem chegasse da China, Itália, Espanha e França, além de fazer acompanhamento de quem tinha chegado nos 14 dias anteriores a esta data.

Em 12 de março, a Emergência em Saúde foi declarada diante da covid-19 e, a partir desse momento, foi ordenado que os prefeitos e governadores avaliassem os riscos de transmissão da covid-19 e passar a cumprir com o plano de contingência emitido pelo Ministério da Saúde; aos estabelecimentos e mercados comerciais, administrações de centros residenciais, condomínios e espaços similares, aos centros de trabalho públicos e privados, aos responsáveis ​​por meios de transporte públicos e privados que implementassem medidas higiênicas em espaços ou superfícies de contagio e maximizar a prestação de serviços por meio de trabalho remoto. Os eventos com mais de 500 pessoas foram cancelados, e foi anunciado que a partir daquele momento os jogos de futebol se realizariam sem público, foi suspenso o embarque e desembarque, carregamento e descarregamento de passageiros e mercadorias de navios de tráfego marítimo internacional, entre outras medidas.

Na terceira semana de março, o prefeito de Bogotá, outros prefeitos das grandes cidades e alguns governadores de estados anunciaram que iriam decretar isolamento preventivo de sexta-feira, 20 de março, a segunda-feira, 23 de março. Em Bogotá, era chamado de Simulação da Vida, e era um exercício coletivo de aprendizado que serviria para saber como agir quando a quarentena nacional fosse declarada. Este anúncio foi polêmico porque a Presidência, que na época não tinha anunciado ainda a quarentena, considerou que medidas isoladas não podiam ser tomadas, mas sim que deveriam ser centralizadas. Além desse objetivo de aprendizado, com essa medida as autoridades locais procuravam controlar a propagação da epidemia já que na segunda-feira, 23 de março, era feriado e assim preveniriam a saída massiva de moradores das grandes cidades para os municípios turísticos próximos. No final, as diferentes autoridades convergiram e o Presidente decretou a quarenta nacional a partir da terça-feira, 24 de março, dando continuidade ao que foi estabelecido pelos governantes locais e enviando uma mensagem de unidade de critério.

Assim, o decreto 457, de 22 de março, de “isolamento preventivo obrigatório”, emitido pela Presidência, limitou totalmente a livre circulação de pessoas e veículos no território nacional, com diversas exceções para garantir o direito à vida e à saúde, como assistência e provisão de serviços de saúde, aquisição de bens de primeira necessidade, assistência e cuidados a pessoas que os necessitem e missões de organizações internacionais.

Para apoiar essas garantias de serviços essenciais foram autorizadas as cadeias de produção, suprimento, armazenamento, transporte, comercialização e distribuição relacionadas a: materiais de limpeza, desinfecção e higiene pessoal para residências e hospitais, bens de primeira necessidade, produção e distribuição de alimentos, serviços públicos, serviços bancários e de telecomunicações, atividades relacionadas a serviços de emergência, serviços funerários, enterros e cremações.

Uma das preocupações das autoridades locais era a infraestrutura insuficiente para atender os pacientes com covid-19, motivo pelo qual trabalharam intensivamente para aumentar os leitos hospitalares em unidades de terapia intensiva e intermediária e os especializados em covid-19. Em Bogotá, o pavilhão de feiras e exposições foi capacitado para atender pacientes com patologias diferentes da doença, instalando inicialmente 500 leitos hospitalares, mas com projeção para 2000, se necessário. Em outras cidades a infraestrutura hospitalar fora de uso foi restaurada e adaptada para a mesma finalidade.

Em Bogotá, os Secretários de Saúde e Integração Social enviaram inúmeras diretrizes aos lares gerontológicos para controlar a disseminação da covid-19 nessas instituições e exerceram vigilância constante. Por exemplo, a cada dois dias, por videochamada, os administradores dessas instituições devem fazer um tour pela instituição e mostrar todas as pessoas admitidas, bem como a equipe administrativa. Eles também devem preparar planilhas com indicadores de saúde tanto para os usuários como para os funcionários.

Reconhecendo a importância de todas essas medidas, deve-se notar que houve uma lacuna dado que não foram realizados mais testes de diagnóstico para poder detectar prontamente os surtos e antecipar medidas de isolamento e monitoramento dos contatos. Além disso, os resultados dos testes não têm saído no tempo desejado. Isso causa falta de informações para os tomadores de decisão e que se possa adotar medidas padronizadas para o país com poucas chances de adequá-las às circunstâncias locais.

Como tem funcionado a quarentena (isolamento social) na Colômbia?

Magda Ruiz – É difícil sustentar uma opinião porque, devido ao nosso próprio isolamento, nos baseamos principalmente no que mostram os meios de comunicação ou o que se percebe no seu entorno. É preciso dizer que as notícias vindas da Itália e da Espanha geraram na população a consciência da necessidade de se cuidar e, portanto, diante da controvérsia entre o Presidente e as autoridades locais, a população apoiou seus governantes locais. Nesse contexto, considero que a população em geral respeitou o isolamento. No entanto, em um país com altos níveis de desemprego e emprego informal, agravado por um volume significativo de imigrantes venezuelanos que viviam com renda diária de atividades informais, é muito difícil que as pessoas fiquem em casa. Muitas pessoas, nos setores pobres das grandes cidades, deixaram suas casas quando ouviram o boato que estavam distribuindo mercadorias ou dando auxílios monetários.

O suprimento de alimentos tem sido uma das principais razões pelas quais as pessoas deixaram suas casas. Embora seja autorizado que apenas uma pessoa por família saia para fazer as compras, há setores em que há aglomeração, portanto as autoridades locais estabeleceram turnos diários de saída, seja pelo último dígito do número da carteira de identidade ou por sexo, o que ajudou a distribuir ao longo da semana as pessoas que chegavam aos locais de abastecimento de alimentos.

Desde 11 de maio as atividades econômicas estão sendo retomadas gradualmente, o que tem permitido maior circulação de pessoas e tem dificultado o controle de aglomerações, especialmente no transporte público. Em Bogotá foram habilitados mais quilômetros de ciclovias para reduzir a pressão no transporte público, que pode circular com 35% de sua capacidade máxima.

A situação dos venezuelanos é bastante complexa dentro da quarentena. Muitos ficaram sem lugar para passar a noite, pois moravam em pensões ou em casas de família onde pagavam diariamente pelo quarto. Quando pararam de receber essas rendas mínimas em comércio ou serviços informais, não tiveram mais onde morar. Grupos numerosos preferiram retornar à Venezuela, o que pode ser visto por pessoas caminhando ao longo das rodovias, o que obviamente está violando a norma de isolamento e que estes levarão muito tempo até chegar ao seu destino final, em condições muito difíceis. Foram autorizados ônibus, partindo das grandes cidades e chegando até a fronteira, o que nem sempre é suficiente. Este é um drama humanitário insolúvel em tempos de crise como este.

A Colômbia possui um dos mais baixos coeficientes de mortalidade na América do Sul para covid-19 (12 mortes por milhão de habitantes). Como explicar este sucesso colombiano?

Magda Ruiz – Não sei se isto pode ser classificado como bem-sucedido, mas reconheço que o número e o que percebo dos sistemas de saúde e cemitérios, no sentido de que não estão em colapso, indicam que a epidemia, até agora, foi controlada. Ou visto de outra forma, o pico da epidemia foi adiado e ainda não estamos no auge da epidemia, que segundo os modelos é esperado para o final de junho e o início de julho. Possivelmente esses dois meses de quarentena retardaram o aumento de infecções e deram tempo para melhor adaptar o sistema de saúde; portanto, até agora, tem tido mais recursos para o atendimento de pacientes críticos e doentes graves, resultando em menor mortalidade. Atualmente, 90% dos casos ativos estão sendo atendidos em casa, 8% estão internados, mas não na UTI, e 1,3% na UTI. Deve-se ter em mente que o índice de testes realizados é bastante baixo (cerca de 5000 por milhão de habitantes), uma vez que isso é feito apenas em pessoas com sintomas e em alguns de seus contatos. Isso dificulta antecipar onde a epidemia pode estar se espalhando e medir seu ritmo para tomar decisões focalizadas.

Existem medidas econômicas tomadas pelo governo para garantir que as pessoas mantenham sua sobrevivência?

Magda Ruiz – O governo nacional anunciou inúmeras ajudas destinadas a diferentes grupos populacionais. Recursos do orçamento nacional foram alocados para compras de mercadorias e posterior distribuição em setores de baixa renda. Também se definiu que a alimentação escolar (lanches dados aos meninos e meninas em escolas públicas) se entregaria aos pais nos supermercados. No caso dos pensionistas foi feito um esforço para colocar a pensão em agencias bancárias próximas às suas residências, algo para o qual a população é um tanto relutante porque prefere ir à instituição reivindicar a pensão. Outra ajuda humanitária foi uma transferência bancária feita pelo governo nacional para famílias dos estratos 1 e 2 que estavam nas listas do Sistema de Identificação de Beneficiários, SISBEN. Foram realizados pagamentos adicionais aos beneficiários dos programas Famílias em Ação, Idosos e Jovens em Ação. Todas essas medidas tendiam a atender às necessidades básicas, as quais, no entanto, inicialmente tiveram vários inconvenientes, como a dificuldade de focalizar completamente essas populações, o baixo uso da Internet e do sistema bancário, dificuldades logísticas na distribuição das mercadorias de casa em casa, atrasos nas transferências de orçamento.

Outra medida é o subsídio, denominado Programa de Apoio ao Emprego Formal (Paef), equivalente a 40% do salário mínimo, para todos os trabalhadores das PYMES que tiveram uma redução de 20% no seu faturamento e que estarão em vigor pelos meses de maio, junho e julho de 2020.

Quando e como o governo planeja encerrar a quarentena?

Magda Ruiz – O governo não apresentou um plano para encerrar a quarentena, mas autorizou a reativação por setores, de acordo com as informações disponíveis a cada momento. A partir de 11 de maio começaram a serem reativadas áreas da construção civil, obras públicas e privadas e manufatura, com protocolos de biossegurança. Todas essas atividades requerem insumos provenientes de outros setores econômicos e, em particular, do setor manufatureiro, que por si só é muito amplo, e tem tido como consequência a incorporação de todos os demais setores na retomada às atividades.

Atualmente, não estão autorizados a abrir ao público os restaurantes, eventos culturais e esportivos, escolas e universidades, serviços médicos e odontológicos não urgentes, transporte intermunicipal e aéreo, entre outros. Todos estão exortando o governo para flexibilizar mais a retomada, ou pelo menos para que se estabeleça um cronograma, a fim de tomar medidas.

Um problema que complica a abertura é o número de pessoas que estão no mercado de trabalho informal e que saíram às ruas para restabelecer suas posições de venda de vários produtos. Eles argumentam que não têm como cobrir suas necessidades mais básicas, mas isso aumenta os riscos de contágio, especialmente nos setores mais pobres.

Por outro lado, os prefeitos alertaram que, se a ocupação da UTI atingir 70%, o isolamento obrigatório será decretado novamente. E no momento, cidades como Bogotá e Cartagena estão se aproximando desse limite. Assim, o isolamento intermitente, focalizado nas cidades ou setores das cidades afetadas, terá que ser feito para impedir o colapso dos serviços e as mortes resultantes da falta de atenção sanitária.

Existem lições que você acha que a Colômbia pode ensinar ao Brasil neste momento diante da pandemia?

Magda Ruiz – Penso que, além das recomendações para lavagem das mãos, uso de máscaras faciais e protocolos para entrar em casa ao retornar das compras ou do trabalho, o isolamento estrito e obrigatório é a única maneira de controlar a mortalidade, pois diminui o ritmo de contagio e abranda o número de casos graves, favorecendo que se tenham os instrumentos necessários, como respiradores e, em geral, cuidados adequados podem ser fornecidos.

Como você e sua família estão enfrentando esses 2 meses de quarentena?

Magda Ruiz – Felizmente, somos pessoas que têm uma aposentadoria e podemos ficar em casa e cuidar de nós mesmos. Praticamente tudo o que precisamos pedimos para entrega em domicílio. Não temos ajuda nas tarefas domésticas, exatamente quando as medidas de higiene devem ser extremas. Agora estamos autorizados a tomar banho de sol e caminhar um pouco fora de casa, o que ajuda muito a manter nosso ânimo.

O difícil é não saber quando poderemos visitar os filhos e netos que moram longe e enfrentam a pandemia em locais onde a situação é muito grave. Meu marido e eu estamos sozinhos em casa.

Frase do dia 28 de maio de 2020

“A vida não é mais que uma sucessão de oportunidades para sobreviver”

Gabriel García Márquez (1927-2014)

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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